Após maior tombo das Bolsas desde o início da pandemia, onde vale a pena investir agora?

Especialistas reduzem recomendação para alocação em bolsas internacionais e veem a renda fixa ainda atrativa

Foto: Shutterstock

Após a forte correção das bolsas em abril, quando tiveram a pior performance desde o início da pandemia em meio ao aumento da aversão a risco, especialistas recomendam ao investidor ter cautela em aumentar as posições em bolsa, sobretudo no mercado internacional, e veem a renda fixa como atrativa, mesmo com a aproximação do fim do ciclo de alta de juros – a taxa Selic deve alcançar 12,75% nesta semana.

Diante de preocupações com o crescimento da China em meio à adoção de medidas de lockdown com o avanço de casos de Covid-19 e com o impacto do aperto monetário nos Estados Unidos, especialistas reduziram a recomendação para investimento em ativos no exterior, principalmente em bolsas, e aumentaram a alocação em renda fixa local.

Apesar da queda de 8,80% do S&P 500 em abril, acumulando desvalorização de 13,3% no ano – o pior desempenho desde 1939 -, a alocação em bolsas americanas ainda desperta riscos, principalmente no que diz respeito às ações de empresas de crescimento, como de tecnologia, mais vulneráveis ao aumento da taxa de juros americana.

O UBS, por exemplo, reduziu a recomendação para alocação em ativos internacionais nas alocações táticas (de curto prazo) e ampliou a fatia em títulos públicos pós-fixados (atrelados à Selic) em março.

Considerando a média das recomendações para os perfis moderados, a parcela em ativos internacionais foi reduzida de 10% para em torno de 6%, enquanto a alocação em títulos públicos pós-fixados (atrelados à Selic) aumentou de 22% para 27% da carteira, diz Ronaldo Patah, estrategista-chefe do UBS Consenso.

A Vitreo também diminuiu em 20% a parcela em ativos internacionais nas carteiras recomendadas, cuja fatia varia de acordo com o perfil de risco do investidor, e aumentou a alocação em títulos de renda fixa local e fundos imobiliários.

“Estamos com posição overweight [acima da média do mercado] para títulos prefixados e atrelados à inflação”, diz Francisco Levy, estrategista-chefe da Vitreo.

Levy destaca que ter um pedaço em ativos internacionais ainda faz sentido do ponto de vista de diversificação patrimonial, mas que essa parcela precisa ser menor dado o patamar atrativo de juros no Brasil.

Bolsa americana ainda cara

Apesar da previsão do UBS de crescimento de lucros das empresas do S&P 500 de 7% para 2023, Levy afirma que o cenário ainda é de cautela com o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) subindo os juros e com os múltiplos das ações americanas em um patamar que não é tido como tão barato, após recordes de alta em 2021.

“Estamos com recomendação underweight [abaixo da média do mercado] para bolsas americanas. As bolsas de países desenvolvidos ainda vão enfrentar maior volatilidade com alta do custo de capital”, assinala o estrategista-chefe da Vitreo.

Para Levy, abaixo do patamar de 4 mil pontos, o S&P 500 começa a ficar interessante e, a 3.500 pontos, seria um bom ponto para aumentar a exposição para overweight. Já um nível acima de 4,500 pontos requer maior cautela.

Para o sócio da TAG Investimentos, Marco Bismarchi, o S&P 500 ainda está caro e pode ter um ajuste maior. “Não estamos aumentando a posição em bolsa americana porque o balanço de risco não é bom suficiente”, diz. A TAG está com recomendação para ativos internacionais abaixo do ponto neutro.

O UBS espera que o S&P 500 volte para 4.700 pontos até fim do ano no cenário-base. No caso da China, o banco espera que o governo chinês intensifique o apoio fiscal e monetário para sustentar a economia. “Mantemos nossa recomendação de preferência para a China em nossos portfólios da Ásia e continuamos a ver valor”, destacou o banco, em relatório de 27 de abril.

O UBS prevê um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de 4,2% da China neste ano, abaixo dos 5,5% inicialmente projetados pelo governo chinês. Essa desaceleração, contudo, já estaria contemplada nos múltiplos das bolsas chinesas.

“O atual valuation, próximo de dez vezes o preço/lucro do MSCI China [principal benchmark para as bolsas chinesas], já refletiu a redução de crescimento dos lucros para os próximos 12 meses”, assinalou o banco.

Nesse cenário de recente sell-off (venda generalizada de ativos), o UBS continua recomendando exposição a commodities e ações de energia, e ainda não vê uma recessão na Europa como cenário-base.

Ibovespa como oportunidade de compra ou hora de ter cautela?

A queda de 10,1 % do Ibovespa em abril, a pior desde o início da pandemia, pode trazer uma oportunidade de compra de papéis que estejam com preços descontados, afirma a estrategista-chefe da Órama, Sandra Blanco.

Para Blanco, o movimento recente de baixa é uma correção pontual e os ativos brasileiros ainda continuam atrativos para os investidores estrangeiros. A instituição manteve a previsão para o Ibovespa em 130 mil pontos no fim de 2022.

A preocupação com a desaceleração da China impactou ações de commodities que tinham avançado no primeiro trimestre como a Vale (VALE3), que encerrou abril com queda de 13,12%.

“Tínhamos tirado a Vale da carteira recomendada, mas, depois da queda da ação, voltamos a incluir porque achamos que agora é uma boa oportunidade para comprar o papel e, para quem já tem a ação, não é hora de sair”, afirma Blanco.

A Órama ainda vê oportunidade em outros papéis com preços descontados, como Natura (NTCO3), BRF (BRFS3) e Light (LIGT3), além de bancos como Bradesco (BBDC3) e BTG Pactual (BPAC11).

A TAG Investimentos também vê as empresas de valor (que são mais maduras e geram caixa) com performance melhor que as de crescimento. A gestora de patrimônio não mudou a recomendação para as alocações em Bolsa brasileira, que continua sendo de 20% a 25% para as carteiras com nível de perfil de risco moderado e de 30% para perfil com risco agressivo.

A Vitreo mantém posição ligeiramente overweight para a Bolsa, cuja recomendação varia de 15% a 60% da carteira, dependendo do perfil do investidor.

Apesar do risco de maior volatilidade com as eleições no segundo semestre, a Vitreo vê perspectiva positiva para a Bolsa com a inflação devendo começar a cair e o mercado passando a ter aposta na queda da taxa de juros no ano que vem, a partir de agosto ou setembro. “Hoje, isso ainda não está no preço”, diz Levy.

Nesse sentido, Levy acredita que os setores que ficaram para trás devem ser os mais beneficiados. “O upside [potencial de alta] para as commodities é menor dada a forte valorização que tiveram no primeiro trimestre.”

O UBS também não mudou a visão para a alocação na Bolsa brasileira e continua vendo oportunidade nos setores financeiro, de energia, em distribuidoras de combustíveis, agronegócio, saúde e serviços públicos (utilities).

“A nova visão é que as ações ligadas aos setores domésticos vão demorar mais para performar porque a inflação alta corrói a renda e afeta o consumo e só devem começar a se recuperar quando houver um horizonte de quando o Banco Central vai começar a cortar a taxa básica de juros no ano que vem”, diz Patah.

O UBS mantém recomendação neutra para a Bolsa brasileira e recomenda exposição de 7,5% da carteira, considerando a média para os perfis moderados.

Para Patah, mesmo tendo caído em abril, os preços das commodities continuam em patamar elevado e devem continuar ajudando a balança comercial brasileira.

Juro alto limita apostas em dólar

Apesar da alta de 3,83% do dólar frente ao real em abril, especialistas não esperam uma apreciação muito maior da moeda americana.

Com a balança comercial positiva e o alto patamar da taxa de juros no Brasil, Patah prevê uma taxa de câmbio abaixo de R$ 5, com o real devendo negociar entre R$ 4,50 e R$ 5,00 neste ano.

Levy, da Vitreo, também acredita que ter uma posição em dólar neste momento não é interessante dado o grande diferencial de juros entre o Brasil e os mercado desenvolvidos, com o país pagando a segunda maior taxa de juros real do mundo.

“Para apostar no dólar, o investidor tem que acreditar que o dólar suba mais de 12% a 13% [expectativa para a Selic], o que é muita coisa”, diz.

Fim do ciclo de alta da Selic traz oportunidade para prefixados

Com a aproximação do fim do ciclo de alta da taxa Selic, os títulos prefixados do Tesouro Direto começam a ganhar atratividade, com o mercado já começando a discussão sobre quando o Banco Central deve inverter a mão e começar a cortar a taxa Selic em 2023.

Na ata da última reunião, o Copom (Comitê de Política Monetária) sinalizou mais uma elevação de um ponto percentual da Selic na reunião de 4 de maio, levantando a possibilidade de que poderia encerrar o ciclo de aperto monetário no próximo encontro, se a inflação para 2023 continuar abaixo da meta, de 3,25% em sua projeção.

“É um bom momento para investir em títulos prefixados. O mercado já vê o ciclo de alta de juros chegando ao fim, mas ele ainda não chegou, o que traz a oportunidade de aproveitar um prêmio de risco ainda existente nesses papéis”, diz Blanco. A Órama espera taxa Selic de 12,75% ao ano no fim do ciclo de aperto monetário.

Nesse cenário, a casa vê oportunidade de investimento nos papéis prefixados com prazos entre dois e três anos e em papéis do Tesouro IPCA+ com prazos mais curtos, que são menos vulneráveis a movimentos de volatilidade por conta do cenário externo e protegem o portfólio do aumento da inflação.

A Vitreo também recomenda a alocação em papéis prefixados com prazos de vencimento de três a quatro anos e em títulos indexados à inflação de curto e longo prazos.

A TAG, por sua vez, vê oportunidade pontual em papéis prefixados com vencimento em 2025, mas essas aplicações ainda respondem por uma parcela pequena da carteira recomendada de renda fixa — na média, de 10% a 15%.

A gestora recomenda um mix entre papéis de curto e longos prazos, com uma exposição total na carteira de renda fixa entre 30% e 40%, dependendo do perfil do investidor.

Já o UBS ampliou a parcela em títulos pós-fixados nas alocações táticas (de curto prazo) em março e mantém recomendação neutra para os investimentos em papéis atrelados à inflação e prefixados.

Considerando a média das recomendações para os perfis moderados, a parcela em títulos pós-fixados passou de 22% para 27% em março, seguida por papéis atrelados à inflação (20%) e prefixados (15%).

“Decidimos manter a recomendação neutra para NTN-B [títulos públicos atrelados à inflação] e prefixados dados os riscos no cenário externo, com o Fed elevando os juros, fora os riscos fiscais que vão começar a aparecer no Brasil com o debate eleitoral”, diz Patah.

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