Logo-Agência-TradeMap
Logo-Agência-TradeMap

Categorias:

Schroders, que administra quase US$ 1 trilhão, está comprando ações do Brasil – veja por quê

Gestora mantém posição overweight em Brasil e avalia que volatilidade com eleições já está refletida nos preços das ações

Apesar da recente saída de investidores estrangeiros da Bolsa brasileira, a gestora global Schroders, que tinha US$ 991 bilhões sob gestão em dezembro, continua com posição overweight (acima da média do mercado) para o mercado de ações no Brasil. A gestora vê o país como uma das regiões mais interessantes para se investir em um cenário mais desafiador no mercado global.

“O Brasil é um dos poucos países que têm valuations atrativos, com aumento de juros chegando ao fim e recuperação em termos de crescimento quando o resto do mundo está com juros começando a subir e crescimento começando a desacelerar”, diz Pablo Riveroll, diretor de renda variável da Schroders para Brasil e América Latina.

Diante da preocupação com a desaceleração do crescimento global, a gestora reduziu a posição em commodities e tem aumentado a alocações em empresas voltadas para o mercado doméstico, vendo um cenário mais positivo para a economia brasileira.

A Schroders estava com posição overweight na Bolsa brasileira em abril. Continua com essa alocação?

Continuamos overweight [acima da média do mercado] em Brasil e continuamos positivos com a renda variável brasileira. Nosso fundo [Sicredi Schroders Ibovespa Ativo] teve performance forte no primeiro trimestre, e ainda está com performance bastante forte no ano em comparação ao mercado [sobe 8,67% até abril contra alta de 2,91% do índice].

O Brasil é um dos poucos países que têm valuations atrativos, aumento de juros chegando ao fim e recuperação em termos de crescimento quando o resto do mundo está com juros começando a subir e crescimento começando a desacelerar.

Por muitos motivos, o Brasil está ficando atrativo em termos relativos. O país é uma das regiões mais interessantes para investir porque a Europa está com problemas geopolíticos, Ásia tem problemas em termos de regulação, especialmente na China. Por isso, acho que mesmo com cenário menos favorável a nível global, o Brasil hoje tem oportunidade de ter um descolamento em relação a outros mercados.

Onde vocês veem mais oportunidades nesse cenário na Bolsa brasileira?

Fizemos algumas mudanças no nosso portfólio e estamos saindo de empresas exportadoras, como de commodities, e de empresas que se beneficiam da subida de juros, como bancos, e começamos a comprar mais empresas que se beneficiam de uma estabilização dos juros e da inflação. Estamos olhando para empresas mais defensivas, que não dependem muito da força da economia e têm benefício em termos de redução do custo de capital e de funding. Isso inclui empresas de utilities [serviços públicos], telecom e shoppings centers.

Domesticamente, estamos vendo uma melhora de crescimento do país. Começamos o ano com expectativa de crescimento do PIB perto de 0% para o ano. Hoje o consenso está perto de 1%. Já têm economistas, como por exemplo do Bradesco, esperando crescimento de 1,5% do PIB. É uma melhora muito importante.

Outro fator importante que estamos olhando é que temos juros mais altos e alguma estabilização no choque visto nas moedas e commodities depois do começo da guerra na Ucrânia, com o preços de algumas commodities começando a cair.

Estamos de fato mais otimistas com a recuperação do crescimento doméstico, que tem dois principais fatores. O primeiro é a exportação, com preços de commodities altos ajudando o balanço de pagamentos. E em segundo lugar uma melhora no emprego importante em quase todos os setores. O que teve uma melhora bem forte agora foi o setor de serviços, com o fim do lockdown e as pessoas voltando a consumir.

Pablo Riveroll gestor Schroders
Pablo Riveroll, gestor da Schroders. Foto: Divulgação / Schroders

Temos visto saída de investimentos estrangeiros da Bolsa desde abril. Na sua avaliação é mais uma correção pontual ou mudança de visão em relação ao Brasil?

Parte da saída foi por causa da força do dólar e aumento da taxa de juros nos Estados Unidos, o que gerou fluxo negativo em quase todos os mercado de ações a nível global. Isso continua até ter uma estabilização do dólar. Não há fatores muito específicos do Brasil para gerar essa saída. O mercado performou muito bem, o preço de algumas commodities caiu e isso gerou queda nos papéis, mas é uma reação mais generalizada de sell-off [venda generalizada de ativos].

Em termos de cenário global, estamos mais cautelosos. Tivemos algumas mudanças importantes. A primeira é a política de Covid zero na China, que é muito restritiva para a economia e está impactando no curto prazo o consumo no país e a demanda global pelas commodities. Achamos que isso vai ser transitório.

Segundo ponto fundamental é a duração da guerra entre Rússia e Ucrânia. De fato parece que não vamos ter uma resolução no curto prazo, parece que o conflito e as sanções vão durar por muito tempo. Então, vai continuar com a cadeia de suprimentos com problemas, oferta de commodities e fertilizantes bem reduzida e isso vai manter a oferta e os custos de petróleo altos até o resto do ano.

O terceiro ponto que mudou foi uma surpresa muito negativa sobre inflação em todo mundo. Isso levou ao aumento de juros, com o banco central americano mandando uma mensagem bem hawkish [inclinada ao aperto monetário] e o juro de longo prazo subindo muito. Então, o dólar tem se apreciado de maneira muito forte não somente contra o real, mas contra o euro, libra esterlina e renminbi [moeda da China], o que tem gerado pressão de curto prazo nas moedas emergentes.

Achamos que isso vai ser temporário. Eventualmente os Estados Unidos vão ter uma desaceleração bem importante no crescimento e isso vai gerar menos apetite por dólar, menos expectativas de uma subida mais forte de juros daqui para frente e isso vai permitir ao real se estabilizar.

Como vê o risco de estagflação (economia fraca, porém com inflação forte)? Ele aumentou?

O risco aumentou, mas o cenário mais provável é que a política monetária americana funcione, que consiga frear a economia e baixar a inflação. Acho que a mensagem dos bancos centrais, especialmente do Fed [Federal Reserve, banco central dos EUA] é de gerar uma redução da inflação.

Hoje tem vários fatores que estão gerando pressão na inflação que sabemos que são transitórios, como a falta de oferta de commodities e a disrupção na cadeia de fornecimento por conta de problemas de transporte nos portos da China. Achamos que isso vai ser transitório e vai permitir que os preços comecem a baixar.

E como isso impacta o preço de ações de empresas de commodities, que ajudaram a sustentar a alta do Ibovespa no primeiro trimestre?

Quando olhamos os valuations dos mercados emergentes, o Brasil fica barato. Quando olhamos os valuations por setor, os que estão mais baratos e mais atrativos são energia e materiais básicos como minério de ferro. As ações de empresas de petróleo e minério de ferro no Brasil têm os valuations mais atrativos entre os mercados emergentes, tanto em termos de dividendos como em relação ao preço/lucro. São empresas que estão gerando uma rentabilidade muito alta, e o mercado realmente não está precificando isso corretamente.

Tanto o minério de ferro quanto o petróleo têm problema de oferta bem relevante. Então, olhando as duas commodities, acho que de fato tem possibilidade de se manter preços atrativos e, depois do ajuste que vimos, estamos vendo oportunidades. Para outras commodities, como o cobre o lítio, estamos menos positivos.

Quais os principais riscos para investimentos no Brasil?

O ano eleitoral sempre traz volatilidade. O interessante hoje é que as empresas estatais estão muito baratas, especialmente a Petrobras, então isso já está refletido no mercado. Acho que o investidor está sendo compensado por esses riscos. As oportunidades no mercado brasileiro vão além das eleições. Achamos que vai ter volatilidade, mas esperamos ver recuperação econômica e investimento em contexto global mais estável.

Em termos de riscos, um risco importante é o das commodities. Mesmo no nosso cenário base, de que vai haver preços de commodities sustentados, se tivermos queda expressiva da demanda global, isso teria impacto na moeda e no lucro das empresas de commodities, que são muito relevantes para o mercado brasileiro.

Outro risco que estamos olhando é inflação. Estamos esperando que a inflação comece a cair. Tem alguns riscos principalmente nos preços de soft commodities, como alimentos e grãos, porque há problemas de seca a nível global, escassez de fertilizantes – em parte por causa da oferta da Bielorrússia e Ucrânia com a guerra – e tem muito mais protecionismo a nível global, com alguns países como Índia e Indonésia restringindo exportações, o que gera mais pressões. Acho que a inflação é uma batalha ainda não ganha pelo Banco Central e é um risco a monitorar.

E finalmente tem o risco fiscal do Brasil. Houve mudanças muito favoráveis para o lado fiscal. O governo terminou com superávit primário [setor público] em 2021 e este ano parece que terá déficit muito pequeno. Mas, daqui para frente, há necessidade de investimentos que vão precisar de financiamento com dívida e impostos, e isso será outro desafio que estamos monitorando de perto.

Os fundos da Schroders têm Petrobras na carteira?

Temos posicionamento [na empresa] nos fundos. O último dado público é que estamos overweight. Temos uma posição overweight também em outras estatais que achamos que são bem geridas e estão muito baratas e o mercado não está percebendo o valor que têm, o que inclui empresas do setor de petróleo e bancos. Historicamente as estatais tinham um risco muito alto porque tinham um nível de alavancagem elevado. Agora isso tem se transformado. A capitalização dos bancos estatais é muito mais forte e eles têm um balanço melhor e as empresas de commodities estatais têm alavancagem menor.

As ações de varejo sofreram nos últimos anos com a alta de juros. No atual nível de preços, esses papéis estão interessantes?

No geral, achamos que as empresas de consumo doméstico tiveram performance ruim pela alta de juros, pela desaceleração econômica importante e inflação alta, e para alguns deles, especialmente comércio eletrônico, pela maior concorrência.

Temos um time de cientistas de dados que analisa o crescimento e engajamento que algumas empresas de comércio eletrônico têm com seus consumidores e temos visto durante os últimos dois anos a entrada de duas empresas asiáticas, Shopee e Shein. São players que estão ganhando muita relevância e estão tendo muito sucesso em termos de atração de clientes e engajamento, virando relevantes nos mercados. Com isso, há mais concorrência e discrepância em termos de performance entre as duas empresas que não estão listadas na Bolsa brasileira [as asiáticas] contra as empresas que estão. Então, continuamos negativos mesmo com a economia começando a melhorar.

Agora dentro do varejo estamos olhando empresas líderes em seus diferentes setores, que achamos que vão sair com mais força da pandemia. No setor de vestuário, há algumas blue chips que estão performando bem e estamos começando a investir com alguma cautela, assim como na locação de veículos, que é um setor interessante, com concentração de mercado que permite um retorno maior e uma proteção para o lucro do negócio. E, finalmente, telecom, que é um setor que gostamos, que está em consolidação e há um ambiente melhor para a rentabilidade das empresas.

Compartilhe:

Leia também:

Mais lidas da semana

Uma newsletter quinzenal e gratuita que te atualiza em 5 minutos sobre as principais notícias do mercado financeiro.