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A fonte secou? XP (XPBR31) sofre com menor demanda por ações, mas o pior pode já ter passado

No segundo trimestre, a captação líquida de aportes da XP caiu 43% em um ano

Foto: Shutterstock

Das plataformas brasileiras de investimento com capital aberto, a XP é a única que detalha o quanto os seus clientes aportam ou resgatam em cada trimestre.

Como a companhia tem a maior fatia do mercado entre investidores pessoa física, seus números costumam ser encarados por analistas como uma sinalização importante de tendências para o segmento, tanto para o bem quanto para o mal.

No momento, a situação é pouco animadora. No balanço mais recente, referente ao segundo trimestre, a XP registrou R$ 43 milhões em captação líquida (um saldo do que entra e sai em recursos dos clientes), uma queda de 43% em relação a igual período do ano passado.

No mercado, porém, sabe-se que a piora não é um problema só da XP.

Trata-se, antes de tudo, de uma postura mais cautelosa do investidor pessoa física em geral, que viu a Selic voltar a render dois dígitos e não se sente mais tão estimulado para investir no mercado de ações, que foi o que proporcionou o boom das plataformas de investimentos nos últimos quatro anos, com a explosão do número de CPFs cadastrados na Bolsa.

Um outro jeito de identificar essa tendência é olhar para o comportamento da indústria de fundos, que usam as plataformas de investimentos para atrair novos clientes.

De janeiro a agosto, segundo dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), os fundos de ações acumulam um resgate (ou captação líquida negativa) de R$ 53,9 bilhões e os fundos multimercado (que também aplicam uma parte em ações), de R$ 77,4 bilhões. Já os fundos de renda fixa, que se beneficiam do aumento da Selic, estão com um saldo positivo de R$ 151,9 bilhões.

Tanto é que o volume diário de negociações de ações na Bolsa caiu de um patamar de algo entre R$ 35 bilhões e R$ 40 bilhões ano passado para a metade em 2022.

“Muito disso é o pessoal saindo da Bolsa, com os resgastes dos fundos”, disse à Agência TradeMap a estrategista-chefe de ações da corretora do Santander, Aline Cardoso.

No caso da XP, em especial, o aumento da concorrência também pesa.

A companhia foi a primeira a olhar com mais atenção para o investidor pessoa física, apostando no modelo de agentes autônomos, que formam escritórios independentes de assessoria financeira e atraem novos clientes usando a plataforma da XP.

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No entanto, com o boom da Bolsa, outras empresas do setor financeiro viram que o mercado tinha espaço para novos players e decidiram fazer frente à pioneira.

São os casos dos grandes bancos de varejo, como o Itaú Unibanco (ITUB4), que lançou a plataforma Íon, e o Bradesco (BBDC4), que tem a Ágora Investimentos.

Mas quem chegou mais perto, na verdade, foi o principal banco de investimentos do país, o BTG Pactual (BPAC11), que antes se limitava a atender clientes institucionais.

O BTG não revela dados de captação para os investidores pessoa física, mas fontes do mercado afirmam que a companhia já conta com 10 mil agentes autônomos, dos quais vários foram “roubados” da XP, como o escritório EQI Investimentos.

“Todo mundo quer um pedaço desse bolo que estava ficando muito grande”, disse Cardoso.

A entrada de novos participantes foi reduzindo o potencial de expansão da XP, que antes crescia de forma acelerada.

Em 2019, 2020 e 2021, a receita da companhia com o segmento de varejo cresceu 56%, 71% e 57%, respectivamente. No acumulado de 2022, por sua vez, há uma queda de 13%.

“A XP estava nadando de braçada, mas tem uma hora que a piscina acaba”, afirma William Castro, estrategista-chefe da corretora Avenue, que foi sócio da XP até 2014.

O mercado de plataformas não tem uma fonte oficial que divulga periodicamente a participação de cada player, mas é possível ter uma noção do tamanho de cada uma por meio de um levantamento que o Bank of America faz mensalmente com os downloads de aplicativos.

Desde 2012 até julho deste ano, as três marcas da XP (XP, Rico e Clear) somam 22 milhões de downloads de apps, enquanto o BTG vem na sequência com 12,3 milhões.

Em seguida aparecem a NuInvest, do Nubank, com 7,3 milhões, a Modal, com 6,9 milhões, a BB Investimentos, com 1,3 milhão, a Guide, com 1,2 milhão, e a Genial, com 1,1 milhão.

Se, por um lado, a concorrência está mais acirrada, por outro, há em curso um movimento de consolidação do setor, com os grandes nomes comprando empresas menores, para ganhar espaço no varejo.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com a própria XP, que no início do ano comprou a Modal, em transação avaliada em R$ 3 bilhões. O BTG, por sua vez, adquiriu as corretoras Planner e Elite, enquanto o Itaú abocanhou a corretora Ideal e entrou também na Avenue, com uma participação de 35%, podendo assumir o controle em até dois anos.

O pior passou?

Embora o investidor tenha ficado mais cauteloso com ações, a fuga da Bolsa não foi completa.

Segundo levantamento feito pelo Santander, os fundos de ações tiveram seu auge em junho de 2021, quando passaram a representar 10,5% do total da indústria de fundos, mais que o dobro que o menor número da série, de 4,5%, em fevereiro de 2016, quando a Selic estava em 14,25%.

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Hoje, com a Selic em 13,75%, os fundos de ações representam 6,3%. Ou seja, com a taxa básica de juros em níveis bem próximos, houve um ganho de 1,8 p.p (ponto percentual) entre 2016 e 2022.

Para Cardoso, o aumento reflete o processo de educação financeira pelo qual os brasileiros passaram nos últimos anos. “Há um maior interesse por ações dos investidores, que estão tomando maior risco”.

O mercado acredita que a demanda deve voltar a crescer à medida que os juros caiam novamente. A expectativa de analistas é que o Banco Central (BC) esteja bem próximo finalizar o ciclo de aperto monetário, se é que não já terminou e que, partir do ano que vem, a taxa comece a ser reduzida, com a inflação passando a ter números mais amenos.

Pela mediana das projeções do mercado, colhida pelo próprio BC, a Selic não subirá mais, ficando em 13,75%. Espera-se também que, ao final do ano que vem, a taxa já tenha caído para 11%.

No entanto, ainda que os juros voltem a cair, o patamar seguirá elevado, o que deve retardar a recuperação da demanda por ações. Para a estrategista do Santander, a história mostra que o fluxo do investidor do varejo para a Bolsa só acelera para valer quando a Selic está em um dígito apenas, o que só deve acontecer a partir de 2024.

De qualquer forma, os números da XP para o terceiro trimestre, ainda não divulgados, devem mostrar que a sangria foi estancada.

Em conversa com analistas do UBS-BB, a empresa indicou que o terceiro trimestre deve manter uma média mensal de R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões em captação líquida.

O fato é que, em um período recente, o mercado tem mostrado pouca disposição para apostar na recuperação da XP.

Em 12 meses, a ação da companhia negociada em Nova York acumula queda de 56,72%. Só no último mês, o recuo é de 15%.

De acordo com Castro, ainda que a XP se mostre uma empresa com capacidade de gerar caixa – com um lucro de R$ 1 bilhão no segundo trimestre – o mercado tem vivido um ciclo que favorece um outro tipo de ação.

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O estrategista lembrou que os Estados Unidos, onde a ação da XP é negociada, estão à beira de uma recessão, com juros em alta, um cenário que gera menos apetite para empresas de tecnologia, ainda mais para uma companhia que oferece serviços financeiros em um país com economia emergente, como o Brasil.

Além disso, a própria economia brasileira também tem patinado. Embora a taxa de desemprego esteja em queda, a inflação segue elevada e os juros estão no maior nível desde 2017, a 13,75%.

“No atual ciclo da economia em que estamos, em que há um mau humor com o crescimento, os setores que mais atraem investimentos não são fintechs ou empresas de tecnologia em geral, mas negócios que oferecem serviços públicos, como conta de luz e água e serviços de saúde”, diz o estrategista da Avenue.

No caso da XP, também pesa o fato de que a ação é negociada em Nova York, o que pode afugentar o investidor brasileiro, que pode estar mais interessado em comprar títulos públicos que pagam a Selic.

“Aqui mesmo na Avenue [corretora que permite investimentos nos EUA], alguns clientes nos questionam: por que eu vou mandar dinheiro para os EUA [para investir na XP, por exemplo] se aqui no Brasil eu posso ganhar 13, 14% ao ano [com a Selic]?”, conta.

O BTG, é verdade, também não anda bem. Embora a ação negociada na B3 esteja subindo 23,89% no acumulado de 2022, em 12 meses há uma queda de 10,62%.

O banco de investimentos, apesar de estar ganhando espaço como uma plataforma para o varejo, tem sofrido com o marasmo do mercado de capitais.

Uma das principais fontes de receita do BTG está na assessoria a empresas que pretendem abril capital. Em 2022, com o aumento do risco no cenário global, com juros em alta e guerra na Europa, nenhuma companhia fez IPO no Brasil. Pelo contrário, várias anunciaram desistência ou adiamento.

No primeiro semestre, a receita do BTG na área de investment banking (que inclui negócios com fusões e aquisições, IPOs e emissões de dívida corporativa) caiu 26%, para R$ 836 milhões.

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