Após uma longa espera, a Petrobras (PETR4) reajustou os preços dos combustíveis. Durante 57 dias – sendo 15 deles durante a invasão russa à Ucrânia, que pressionou ainda mais o petróleo – a estatal brasileira conseguiu suportar a cotação da commodity.
O mercado já esperava um reajuste por parte da Petrobras, que veio à tona nesta quinta-feira (10). A partir de amanhã, o valor do litro da gasolina subirá 18,8%, para R$ 3,86, enquanto o do diesel passará a R$ 4,51 – elevação de 24,9%.
O preço do barril de petróleo do tipo Brent, referência internacional no mercado de energia, por mais que tenha desacelerado nos últimos dois dias, chegou a bater a marca de US$ 138 na noite do último domingo (6).
Este patamar representava uma alta de 47,87% em comparação ao período imediatamente anterior ao início do conflito no Leste Europeu, de US$ 94 por barril.
Na teleconferência de resultado do quarto trimestre de 2021, Cláudio Mastella, gerente de comercialização da Petrobras, disse que a manutenção dos preços desde janeiro foi possibilitada pelo movimento contrário do câmbio.
Enquanto o petróleo disparava com a iminente queda da oferta no mercado internacional, o dólar tinha tendência de queda. No ano, a divisa americana recua 9% ante o real.
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O cenário, porém, parece ter ficado insustentável, forçando o reajuste pela Petrobras. A decisão elevará a inflação em até 1,3 ponto percentual até abril e ocorre sete meses antes das eleições presidenciais.
O mercado parece ter aprovado o caminho pela paridade dos preços internacionais – embora ainda não seja o suficiente. Por volta das 13h20, enquanto o Ibovespa caía 1,06%, as ações preferenciais da Petrobras subiam 2,89%, para R$ 33,50, encabeçando as altas do dia.
O pior ainda está por vir?
Em levantamento realizado na manhã desta quinta, o Goldman Sachs disse enxergar os preços do diesel e gasolina ainda 6% e 12% abaixo dos preços de paridade de importação, respectivamente.
A defasagem atual é menor do que a praticada, em média, ao longo de 2021, quando os spreads foram de 9% e 15%, para diesel e gasolina.
Isso abre a possibilidade de a Petrobras procurar manter os preços no novo patamar, segurando novos reajustes, que poderiam ter alto custo político e inflacionário.
Não é a primeira vez que a política de preço de paridade de importação (PPI), instaurada pela Petrobras em 2016 pelo então presidente da estatal, Pedro Parente, traz insatisfação entre os agentes políticos do país.
A escalada de preços dos combustíveis, em linha com o mercado internacional de energia, levou à greve dos caminhoneiros em 2018, mas permanece até hoje como símbolo da sustentação da Petrobras — que havia acumulado prejuízos bilionários e viu sua dívida bruta ultrapassar a marca de US$ 100 bilhões até meados da última década.
Histórico do lucro líquido da Petrobras

Na prática, o PPI tem por objetivo otimizar a rentabilidade das companhias que atuam na venda de combustíveis no Brasil, ao passo que permite um mercado competitivo, atendendo as demandas dos compradores.
O PPI, inclusive, é um compromisso da Petrobras com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), para a abertura do mercado de refino.
De acordo com as contas da Abicom (Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis), até ontem (portanto, antes do reajuste anunciado), a defasagem média era de 24% no diesel e de 20% para gasolina – patamares jamais vistos desde a implementação do PPI.
A associação reitera que este patamar de arbitragens negativas inviabiliza operações de importação. E por que?
Em linhas gerais, a defasagem cria dois problemas. O primeiro diz respeito às refinarias.
O processo de descentralização do mercado gira em torno da venda de refinarias pela Petrobras.
Em um ambiente em que as refinarias – que não são verticalizadas como a área de exploração e produção da estatal – não podem vender seus derivados de petróleo com base no mercado internacional, passarão a operar no vermelho, já que compram o óleo a preços internacionais da produtora.
O outro problema refere-se ao risco de desabastecimento do mercado interno, ainda mais grave no curto prazo. Os combustíveis são bens comercializáveis, tanto que o Brasil precisa importar cerca de 30% do consumo total.
Se os preços praticados no mercado interno ficarem muito abaixo do observado fora do país, não há incentivos à importação. Pelo contrário, as refinarias tenderão a exportar sua produção, uma vez que lá fora os preços são considerados adequados à demanda.
Com isso, se a Petrobras vender seus produtos abaixo do PPI, os importadores sairão do Brasil e a petroleira deverá abastecer totalmente o Brasil, tendo severos prejuízos, como entre 2011 e 2014.
Por outro lado, se a Petrobras praticar preços acima do PPI, os distribuidores serão estimulados a importar a matéria-prima — o que também não é do interesse da empresa.
A paridade da Petrobras é calculada com base em ajustes de preços internacionais que têm como referência o mercado na Costa do Golfo (ou mercado de Houston, no Texas), nos Estados Unidos.
São calculados itens como qualidade da gasolina, custos logísticos de importação e cotas de utilização de biocombustíveis.
Disparada do preço do Brent desde abril de 2020

Senado demora e combustíveis sobem antes de votação de pacote
Com a disparada do preço do petróleo e o iminente reajuste do preço dos combustíveis pela Petrobras, o Senado tem analisado projetos para a redução dos preços desde o fim de fevereiro.
A princípio, textos sobre o tema deveriam ser lidos em 23 fevereiro, mas não houve consenso e a Casa adiou para após o carnaval. Ontem, pela segunda vez, os senadores adiaram a votação do pacote de combustíveis.
As conversas foram remarcadas para a manhã desta quinta. O PLP 11/2020 estipula uma alíquota unificada e em valor fixo para o ICMS sobre combustíveis em todo o Brasil, enquanto o PL 1.472/2021 cria uma conta para financiar a estabilização dos preços.
No ano passado também estava em pauta a criação de um fundo de estabilização para o preço dos combustíveis.
Porém, a ideia foi rejeitada em janeiro com a avaliação de que não haveria recursos no caixa suficientes para amenizar a alta do preço do petróleo.
Vale ressaltar que, com o lucro recorde em 2021, a Petrobras pagará ao todo R$ 37,3 bilhões em dividendos à União, seu maior acionista.
Mesmo assim, o Senado questiona a distribuição de proventos pela estatal. O presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, deverá dar explicações sobre o pagamento de dividendos, enquanto os combustíveis ficam mais custosos à população.
Petrobras vale a pena?
Há um ano, poucos diriam que a Petrobras caminharia para um de seus melhores momentos na história.
A companhia conseguiu encurtar seu endividamento antes do previsto, enxugou suas operações e se tornou mais eficiente, focando no core business de exploração.
O cenário para as ações é desafiador daqui para frente. Em tese, a alta do petróleo deveria ser benéfica para toda e qualquer petroleira, mas não é o visto com a Petrobras.
Desde o início da guerra na Ucrânia, enquanto o Brent disparou, as ações da empresa recuaram cerca de 0,50%. A desconfiança dos investidores diz respeito ao risco de congelamento de preços — como chegou a sugerir o presidente Jair Bolsonaro — e maior defasagem dos combustíveis.
E não é muito longe do que poderia ser esperado. Em anos eleitorais, quando a inflação em alta é ainda mais impopular, o temor é de que o governo interfira, mais uma vez, na gestão da estatal. Ou pior, nos preços praticados.
Na visão de especialistas, contudo, muitas destas incertezas já estão no preço.
Dos 11 analistas que acompanham a empresa, consultados pela Refinitiv, nove recomendam a compra das ações da Petrobras. Os dados compilados na plataforma do TradeMap mostram que o preço-alvo mediano é de R$ 36.
A decisão da Petrobras poderá ter seu preço, político e econômico, para o país. Contudo, fiel aos seus princípios prometidos anos atrás, a empresa dá mais um passo acertado.