No quarto trimestre do ano passado, a Gol (GOLL4) mostrou que ainda luta para retomar seus dias de glória. Entre outubro e dezembro de 2021, a companhia registrou uma receita operacional líquida de R$ 2,92 bilhões, ante R$ 3,8 bilhões no mesmo período de 2019.
A geração de receita pela empresa ainda está 23% abaixo do apresentado no trimestre imediatamente anterior à chegada da pandemia. A Gol, contudo, não esperava que os custos da retomada fossem justamente a barreira no caminho da recuperação.
No trimestre encerrado no dia 31 de dezembro de 2021, a Gol teve um prejuízo líquido de R$ 2,8 bilhões, pressionado pelo aumento dos custos e despesas operacionais, sobretudo relacionadas ao combustível de aviação.
Essa linha no balanço cresceu 77,7% em 12 meses, para R$ 1,01 bilhões, frente a R$ 572,5 milhões reportados no mesmo período de 2020.
O ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre combustível foi de R$ 293 milhões, ao passo que o custo com QAV (Querosene de Aviação) saltou de R$ 513,5 milhões para R$ 724 milhões na mesma base comparativa.
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Somente o custo de abastecimento das aeronaves abocanhou 34,8% da receita operacional líquida da empresa no quarto trimestre do ano passado. Dois anos antes, essa despesa (na ordem de R$ 1 bilhão) foi equivalente a 26%.
Todas as outras linhas dos custos e despesas operacionais da empresa tiveram crescimento, como comerciais e publicidade, que aumentaram 70,1%.
Porém, o destaque ficou para Material de Manutenção e Reparo, com o investimento necessário para retornar aeronaves e motores ociosos para operação. O custo ficou na ordem de R$ 1,71 bilhão.
A expectativa é que esse custo, deste tamanho, não seja recorrente, dado que as atividades caminham para a normalidade em termos de volume, o que demanda o alto funcionamento das aeronaves.
Comparação entre ações GOLL4 e o índice Ibovespa nos últimos 12 anos

Petróleo, o inimigo das aéreas
Se o cenário para a Gol no quarto trimestre do ano passado já era desafiador, o ano de 2022 deve começar complicado para a empresa.
No balanço divulgado na manhã desta segunda-feira (14), a empresa disse considerar o barril de petróleo WTI, óleo utilizado como referência para a negociação de derivativos nos Estados Unidos, na média de US$ 77,19 durante o quarto trimestre.
Desde o final do ano passado, porém, o WTI já subiu mais de 30%, tendo batido a marca de US$ 123,70 na última semana, com a intensificação da guerra entre Rússia e Ucrânia, que impacta o mercado da commodity.
Disparada do petróleo WTI nos últimos 12 meses

O mercado parece ter precificado esse aumento do custo de combustível nos últimos dias. Na última segunda-feira (7), as ações da Gol caíram 17%, na maior baixa diária desde março de 2020, em meio ao caos da chegada da Covid-19.
A despeito dos desafios que o balanço do primeiro trimestre de 2022 deve materializar, as ações da empresa operam estáveis no pregão desta segunda. Por volta das 11h, os papéis ordinários da aérea tinham queda de 0,08% na B3, a R$ 13,37.
Repasse de preços
Ainda há um longo caminho para que a demanda e a oferta de voos voltem ao patamar de 2019, o que abre possibilidade para a diluição desses custos e despesas.
No quarto trimestre do ano passado, o RPK (Passageiros‐Quilômetros Pagos Transportados, um indicador de demanda) atingiu 7,28 bilhões, 3,6 bilhões a menos do que no quarto trimestre de 2019.
Já do lado da oferta, a ASK (Assentos‐Quilômetros Oferecidos) ficou em 8,81 bilhões, cerca de 4,4 bilhões a menos na mesma comparação.
Esses números trouxeram uma taxa de ocupação positiva à Gol, de 82,6% no consolidado. Vale ressaltar que a oferta de voos internacionais ainda é consideravelmente menor do que a praticada em 2019.
A expectativa é que o crescimento da demanda seja acompanhado por maiores preços – a fim de compensar o aumento dos custos da indústria.
A Latam, concorrente da Gol, já confirmou que aumentará o preço das passagens aéreas. Por meio de um comunicado, a companhia afirmou que está atenta à evolução da guerra no Leste Europeu, e que pode realizar ajustes em seus voos.
A Azul, por sua vez, justificou o potencial aumento das passagens aéreas pela desvalorização do real ante o dólar. Quando em 2008, o petróleo bateu sua máxima histórica, o câmbio estava abaixo de R$ 2 por dólar, muito aquém dos R$ 5 atuais.
A Gol, por mais que não tenha se posicionado, pois estava em período de silêncio, deve acompanhar a tendência de mercado – inclusive para não perder market share.
Gol reduz expectativas para 2022
Em comentário do resultado, a administração da Gol disse que as atenções estão justamente no crescimento da demanda, mas também com foco nas margens. A atualização das projeções de 2022, contudo, vai para outro caminho.
As estimativas para este ano mudaram, tanto para as margens como relacionadas ao endividamento e lucratividade, segundo o fato relevante divulgado pela empresa.
Projeção 2022 anterior | Atualização | |
Taxa de ocupação média | 82% | 82% |
Oferta (ASK), variação & a/a | 70-80% | 65-75% |
Receita líquida total (R$ bilhões) | 14 | 13,7 |
Preço do combustível (R$/litro) | 3,8 | 4,3 |
Margem Ebitda | 25% | 24% |
Margem Ebit | 11% | 10% |
Alavancagem financeira | 7x | 8x |
Lucro por ação diluído (R$) | 0,26 | 0 |
A relação entre dívida líquida e Ebitda da empresa é um claro ponto de atenção. A alavancagem da companhia encerrou o quarto trimestre do ano passado na ordem de 9,7 vezes, mesmo reportando R$ 3,7 bilhões em caixa e equivalentes de caixa.
O modelo de negócio de companhias aéreas, com geração de receita em reais e endividamento e custos em dólar, levanta dúvidas em momentos de alta volatilidade do câmbio, sobretudo com o cenário econômico pouco claro e eleições presidenciais no radar.
O pé atrás do mercado se reflete nas expectativas de analistas. De acordo com dados compilados pela Refinitiv, apresentados na plataforma do TradeMap, 11 especialistas acompanham as ações da Gol.
Por mais que o preço-alvo mediano, de R$ 22, ainda esteja distante, o que perfaz um upside de 64%, as recomendações para a Gol se dividem entre compra (4), manutenção (4) e venda (3).