A alta da volatilidade no mercado de ações esperada para este ano em função das eleições e da expectativa de aumento da taxa de juros nos Estados Unidos deve aumentar as operações com aluguel de ações na B3. Para o investidor de longo prazo, esta pode ser uma oportunidade de ganhos adicionais que chegam a pagar um retorno acima da taxa Selic.
O aluguel de ações costuma ter mais demanda em momentos de maior incerteza, como agora. Em 31 de dezembro, o estoque de posições em aberto de empréstimos de ações somava R$ 107,3 bilhões, contra R$ 90 bilhões registrados em janeiro de 2021, segundo dados da Genial Investimentos.
Nesse tipo de operação um investidor aluga as ações em carteira para outro investidor que não tem os papéis por um prazo determinado. O tomador acredita que o preço dos ativos vai cair neste período e vende os papéis alugados para recomprá-los posteriormente no mercado à vista por um valor mais baixo e devolvê-los ao dono original, lucrando com a diferença.
Quem empresta os papéis cobra uma taxa ao ano pelo serviço. Por exemplo, se o tomador alugou 100 ações cujo preço determinado no contrato era de R$ 40 cada e a taxa do aluguel era de 10%, o doador vai receber o valor de R$ 400 por um ano, já que a taxa é anual. Se o contrato for de seis meses, o valor a receber será proporcional.
Alguns fatores influenciam nessa taxa como a liquidez, disponibilidade do ativo no mercado, e a demanda pelo papel. Quanto maior a demanda, maior a taxa cobrada pelo investidor para emprestar a ação. “Essa taxa é definida pelo próprio doador”, afirma Henrique Castro, professor da Escola de Economia de São Paulo da FGV EESP.
Ativos com maior oferta de papéis no mercado, como as blue chips do índice Ibovespa como Vale (VALE3) e Petrobras (PETR4) costumam pagar taxas bem menores, que estavam em 0,01% e 0,03% em 24 de janeiro segundo a corretora Necton, pois são ativos com maior liquidez, afirma Castro.
Veja abaixo o levantamento do TradeMap de 41 papéis que estão pagando taxa de aluguel acima da Selic, que está em 9,25%.

Ações de construção e varejo estão entre os papéis mais alugados
As ações mais demandadas para aluguel vão depender da expectativa do mercado em cada momento. “Hoje as ações do setor de consumo, shopping center, construção civil e varejo de modo geral estão no topo das ações mais alugadas”, diz Stefany Oliveira, analista de investimentos da Toro.
Veja abaixo os papéis mais alugados em relação ao free float, considerando a média dos últimos 12 meses.

A posição em papéis alugados é um bom indicativo de como o mercado está posicionado em determinada ação. Quanto maior a posição alugada em determinado papel, mais investidores estão apostando na queda da ação.
Com a alta da taxa de juros, os segmentos de varejo e educação foram os que mais sofreram na bolsa pois dependem do crescimento da economia doméstica.
Os papéis da Via (ex-Via Varejo) (VIIA3), por exemplo, acumulam queda de 67,87% em 12 meses até 31 de janeiro. Já o papel da Cogna Educação (COGN3) cai 42,92% no período.
Diante da perspectiva de crescimento mais fraco neste ano, com muitos prevendo uma queda do PIB, aumentou o número de investidores, principalmente fundos, apostando na queda destas ações.
“A própria visão de mercado é mais vendedora em relação a esses ativos. O setor de varejo é extremamente afetado pelo cenário macroeconômico como inflação, aumento de juros e queda da renda do consumidor final, muito sensível ao movimento de alta da Selic porque o crédito fica mais caro”, diz Stefany. “O setor de construção civil também é muito afetado por isso”, complementa.
Empresas de tecnologia e fintechs, que são mais dependentes de investimentos para crescer, também sofrem mais em períodos de taxa de juros em alta, ressalta Stefany.
Outro fato que pode aumentar a demanda por um papel em um período são eventos societários. Apesar do investidor que aluga o papel continuar recebendo os dividendos e juros sobre capital próprio durante o período em que a ação estiver alugada, ele perde o direito de voto em assembleia de acionistas da empresa investida. “Alguns investidores alugam as ações para poder pegar o direito de voto nas assembleias”, diz Stefany.
É o que aconteceu no caso da BRF. A empresa aprovou em assembleia dos acionistas, realizada em 18 de janeiro, a realização de uma oferta subsequente de ações (follow-on). A companhia pretende realizar uma oferta de 325 milhões de ações, o que pode movimentar cerca de R$ 7 bilhões. “Desde que foi aprovada a oferta de ações cresceu a demanda pelo papel”, diz Salomão.
No caso específico da BRF (BRFS3), um dos fatores que contribuiu para a alta das taxas de aluguel foi o fato da gestora Kapitalo Investimentos, que detém 5,02% do capital da companhia, chamar de volta os papéis alugados para poder votar na assembleia, diz uma fonte com conhecimento do assunto.
No caso da Braskem, o aumento da demanda teve a ver com o anúncio de oferta de ações pelos acionistas controladores Petrobras e grupo Novonor (ex-Odebrecht), em 15 de janeiro, que acabou adiada. “Contribuiu para o aumento das taxas do aluguel o fato de o papel ter menor liquidez”, afirma Salomão.
Os investidores alugaram a ação com o objetivo de comprar o papel mais barato no follow-on, mas como a oferta não saiu, os tomadores do papel tiveram que comprar a ação no mercado à vista para cobrir a posição, afirma uma fonte com conhecimento do assunto. Desde o dia 27 até 31 de janeiro, quando foi anunciada o adiamento da oferta, a ação da Braskem (BRKM5) sobe 2,87%.
O papel do TC (TRAD3), antigo TradersClub, é outro caso de ativo de menor liquidez que pagava uma taxa de aluguel alta. A ação intensificou o movimento de queda após a divulgação de um relatório da casa de análise Empiricus, em outubro de 2021, recomendando a venda do papel, que acumula queda de 65,95% em 12 meses até 31 de janeiro.
Já a demanda pelo papéis da Americanas (AMER3) tem a ver com a incorporação da Lojas Americanas (LAME3 e LAME4), cujas ações deixaram de ser negociadas. Os novos papéis tiveram um aumento no desconto de holding após a fusão, criando uma arbitragem de preços entre LAME3 e AMER3.
No caso da Hapvida (HAPV3), a demanda foi direcionada pela aprovação da aquisição da NotreDame Intermédica (GNDI), que será concluída em 11 de fevereiro. As ações da Intermédica deixarão de ser negociadas na B3 e as ações das duas empresas combinadas começam a ser negociadas sob o código HAPV3.
Além das ações, Salomão afirma que as cotas do fundo listado em bolsa (ETF – Exchange-Traded Fund) BOVA11, que busca replicar a carteira do Ibovespa, também costumam ser bastante demandadas pelos investidores. “Em geral, os investidores que alugam essas cotas vendem o ETF na bolsa e compram ações que acham que devem ir melhor que o índice”, afirma Salomão.
Riscos para o tomador e doador nas operações de aluguel de ações
Para o tomador, o risco, segundo Castro, é do preço do papel não cair e ele ter que pagar mais caro para recomprar a ação no mercado à vista para devolver para o doador.
Para o doador, o risco é ele precisar vender o papel que está doado se for um contrato não reversível, diz Castro.
“Quem empresta a ação tem uma visão de longo prazo e visa aproveitar a remuneração adicional com o aluguel de ações. Já quem toma o papel emprestado visa o desempenho no curto prazo”, diz Castro.
Existem quatro tipos de contratos de aluguel de ações:
- Reversível ao doador: quem empresta as ações tem o direito de encerrar o contrato a qualquer momento, independentemente do período acordado. Nesse caso, o tomador paga uma taxa de aluguel proporcional à vigência do contrato;
- Reversível ao tomador: nesse caso quem toma o papel emprestado tem o direito de encerrar o contrato a qualquer momento, antes do vencimento do contrato. Nesse caso, ele tem até quatro dias para devolver as ações alugadas;
- Reversível ao tomador e ao doador: esse é o mais comum no mercado. Nesse caso ambas as partes, quem empresta e quem aluga as ações, podem a qualquer momento encerrar o contrato antes do vencimento;
- Vencimento fixo: o doador e o tomador devem cumprir o período de vigência do contrato acordado previamente por ambas as partes.
Segundo informações da B3, existe apenas prazo mínimo para o contrato, que é de um dia para os empréstimos, e o prazo máximo depende da vontade do doador. “Normalmente, o prazo do contrato de aluguel é de 28 dias, sendo renovável ou não”, diz Salomão.
Em alguns casos, que há poucos doadores, os tomadores do papel acabam renovando a posição com taxa acima da média para não ter que desfazer a posição vendida na ação, diz Salomão.
Quais os custos para quem quer alugar ações?
Para o investidor interessado em alugar ações, além da taxa de aluguel, há outros custos como a taxa de emolumento e de registro pagas para a bolsa e a taxa de corretagem. O tomador ainda deve dar garantias de acordo com o tamanho da posição alugada para a bolsa, que atua como intermediária da transação. Essas garantias podem ser títulos públicos ou outras ações para que não haja inadimplência, diz Castro da FGV.
Para quem aluga as ações, o ganho com o aluguel é tributado segundo a tabela de renda fixa que varia de 22,5% a 15% para prazos acima de dois anos.
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