A ata da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central), que na semana passada elevou os juros a 11,75% ao ano, reforçou a percepção de que o Banco Central não pretende colocar a inflação do ano que vem na meta de 3,25% a qualquer custo.
A avaliação é do ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman, que apontou que um trecho da ata da reunião de fevereiro, em que o comitê se comprometia a perseguir esse objetivo até que as expectativas do mercado estivessem dentro da meta, foi retirado do novo documento.
“A nova versão abandonou esse compromisso, simplesmente o apagando do parágrafo correspondente”, afirmou Schwartsman. “Isso em si mesmo significaria pouco, mas no contexto, significa muito”.
O economista ainda criticou o cenário alternativo adotado para a cotação do petróleo em 2022 e 2023.
O comitê adotou como perspectiva mais provável para a commodity, que vem disparando com a guerra na Ucrânia e que tem grande peso sobre a inflação, a precificação do mercado futuro. Isso coloca o barril cotado a pouco mais de US$ 100 até o final do ano que vem, um pano de fundo muito mais benéfico para a inflação do que os US$ 121 que o BC vinha considerando.
A mudança significa que, mesmo se o Copom parar o ciclo de alta dos juros após elevar a Selic a 12,75% ao ano na próxima reunião, a inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) chegaria ao final de 2023 abaixo de 3,25%, que é o centro da meta para o ano que vem.
“Esse argumento ecoa as infames projeções do modelo Samba usadas em setembro de 2011 para justificar uma repentina mudança no ciclo de aperto monetário, em face de uma suposta crise internacional que faria o trabalho de desinflação, liberando o Banco Central da tarefa”, ironizou.

Em 2011, o BC, presidido por Alexandre Tombini, utilizou um modelo de projeções alternativas para a economia, o Samba (Stochastic Analytical Model with a Bayesian Approach, na sigla em inglês), para justificar uma redução na taxa básica a despeito das pressões inflacionárias.
“É claro que o Banco Central não está em vias de reverter o ciclo de aperto monetário, mas mesmo assim terceirizou parte dos esforços desinflacionários para os preços do petróleo, o que pode ou não se materializar”, ponderou, fazendo a ressalva de que o Copom sinalizou que está está preparado para ir além na alta de juros se necessário.
Os analistas do Boletim Focus projetam uma Selic de 13% no final de 2022 e de 9% em dezembro de 2023. Para o IPCA, as expectativas são de uma alta de 6,59% neste ano (para uma meta de 3,5%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto para cima ou para baixo) e 3,75% para o final de 2023 (meta de 3,25%, com o mesmo intervalo de tolerância).
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Mais 1 ponto de alta em maio
Na ata divulgada nesta terça (22), o Copom reforçou o recado que já havia dado no comunicado da decisão da semana passada: deve subir a taxa básica em mais 1 ponto na próxima reunião, em maio. Afirmou ainda que está preparado para elevar mais a Selic se o cenário de guerra e incertezas fiscais assim o exigirem.
“O Comitê reconhece o cenário desafiador para a convergência da inflação para suas metas e reforça que estará pronto para ajustar o tamanho do ciclo de aperto monetário, caso o cenário evolua desfavoravelmente”, afirmou o documento.
O colegiado argumentou também que as premissas que vinha adotando até agora, de que o barril de petróleo alcançaria US$ 121 no final de 2023, aplicava ao cenário do ano que vem uma cotação “resultante de uma conjuntura internacional particularmente anômala”.
“O Comitê observou que o atual ambiente de incerteza e volatilidade elevadas demanda serenidade para a avaliação dos impactos de longo prazo do atual choque e, portanto, optou por comparar essa hipótese com os preços de contratos futuros de petróleo, negociados em bolsas internacionais, e com projeções de agências do setor”.