Após cair novamente em julho e contrariar as expectativas do mercado, o varejo deve rumar para a estabilização nos próximos meses, dado o arrefecimento da inflação esperado para o segundo semestre.
Esta melhora, porém, enfrentará obstáculos relacionados à oferta de crédito e ao nível elevado dos juros, que devem prejudicar particularmente as vendas de produtos com preços mais altos, como eletrodomésticos e automóveis.
As vendas no varejo retraíram 0,8% em julho na comparação com junho, quando já haviam assinalado forte recuo de 1,4%. Este foi o terceiro registro negativo em sequência. Na comparação com o mesmo mês do ano passado, a queda foi de 5,2%.
Mais uma vez, os dados surpreenderam negativamente o mercado. O consenso Refinitiv apontava para ganho de 0,3% na base mensal, enquanto o recuo em comparação a julho do ano passado era previsto em 3,5%.
O mês de abril foi o último com crescimento no setor. Desde então, o comércio registra recuo de 2,7%.
O recente movimento de deflação da economia deve mudar o cenário nos próximos meses. Em julho, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) veio negativo em 0,68%, enquanto em agosto a queda dos preços foi de 0,36%.
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Parte dos analistas já enxerga espaço para nova deflação em setembro, e o mercado está revisando para baixo as previsões para a alta do IPCA ao fim deste ano e em 2023, segundo dados do Boletim Focus divulgados nesta segunda-feira (12).
Além do alívio da inflação, Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho, destaca outros fatores que podem estimular o comércio no segundo semestre. Na lista estão o aumento das parcelas do Auxílio Brasil para R$ 600 e outras medidas do governo para estimular a economia, como a antecipação do 13º salário de pensionistas e aposentados e a liberação do FGTS.
“A inflação já está recuando, isso deve ajudar as vendas, ou ao menos estabilizar o setor. Também vemos o aumento de benefícios do governo e outras medidas que devem trazer ânimo para o comércio nos próximos meses”, afirma.
Na mesma linha, Andres Abadia, economista-chefe para a América Latina da Pantheon Macroeconomics, destaca os efeitos positivos esperados nos próximos dados do comércio após a queda da pressão inflacionária. O benefício, porém, não deve ser homogêneo.
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Setores que dependem do crédito, por exemplo, devem continuar enfrentando desafios por causa dos juros, que devem permanecer altos nos próximos meses.
“As vendas terão desempenho superior em setores sensíveis à renda disponível das famílias, mas esperamos que as vendas de eletrodomésticos, automóveis e eletrônicos, que dependem mais das condições de crédito, tenham dificuldades no curto prazo”, diz.
Cláudia Moreno, economista do C6 Bank, vê margem para alta nas vendas do varejo no segundo semestre, e cita a sequência de melhorias no mercado de trabalho como um fator adicional de estímulo ao setor. ” O pagamento de benefícios sociais mais altos e o aumento da massa salarial podem atenuar um pouco essa desaceleração para o segmento do varejo”, afirma.
Varejo disputa com serviços
O resultado do varejo em julho foi na contramão do desempenho de outros segmentos da economia pesquisados pelo IBGE. O setor de serviços surpreendeu positivamente ao crescer 1,1% em julho, enquanto a indústria registrou alta de 0,6%.
Para Rostagno, a diferença entre o consumo de bens e serviços é explicada pela normalização dos hábitos dos brasileiros no pós-pandemia. Se durante a crise sanitária as vendas dispararam com as pessoas tendo a necessidade de melhorar o ambiente doméstico, o fim das restrições mostrou a demanda reprimida por atividades ligadas ao ambiente externo, como restaurantes, bares e viagens em geral.
“Vemos isso em móveis e eletrodomésticos, que se beneficiaram bastante durante a pandemia, e agora têm uma sequência de quedas”, contextualiza.