A BRK Ambiental anunciou, na noite da última terça-feira (20), que protocolou junto à CVM seu pedido de desistência e cancelamento do IPO (oferta pública inicial de ações), que tramitava para o Novo Mercado da B3.
A BRK Ambiental, que era a única que tinha um processo de abertura de capital neste ano em aberto, justificou dizendo que a desistência tem relação com as condições de mercado desfavoráveis.
A Bolsa brasileira irá encerrar este ano sem nenhum IPO pela primeira vez desde 1998 – apesar de terem sido realizadas 17 ofertas subsequentes de ações (follow-ons). Entre 2020 e 2021, 73 empresas abriram capital no país.
O cancelamento do IPO da BRK Ambiental diz respeito às condições macroeconômicas globais incertas, o que atinge diretamente os ativos de risco, mas também à ameaça ao Marco do Saneamento.
Aprovado em 2020, o marco estabeleceu novas alternativas de financiamento e mecanismos para ampliar o saneamento básico no Brasil até 2033. O objetivo é que 99% da população tenha acesso a abastecimento de água e 90% a coleta e tratamento de esgoto no ano em questão.
Empresas como a Sabesp (SBSP3) tem acelerado seus investimentos para atingir as metas traçadas, mas a possibilidade de afastamento da iniciativa privada do setor com o novo governo deixa os agentes do mercado com dois pés atrás.
O que achamos do fim do IPO da BRK Ambiental
O cancelamento do IPO da BRK Ambiental diz respeito ao receio com o retrocesso que seria a revogação do Marco do Saneamento no Brasil.
Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o saneamento em situação precária foi responsável pela morte de 135 mil pessoas entre 2008 e 2019 no país. São cerca de 11,2 mil pessoas que morrem por ano pela falta de condições adequadas de saneamento.
Com a dificuldade estatal de investimento e resolução do problema, o marco legal trouxe a possibilidade de adesão ao modelo de regionalização da prestação dos serviços de saneamento básico, viabilizando esta opção em cidades que não têm capacidade individual para suprir a demanda.
Atualmente, a Sabesp negocia a cerca de 70% de sua base de ativos regulatórios (RAB, na sigla em inglês), enquanto players privados – inclusive de outros setores análogos às utilities – negociam a cerca de 100%. Isto é, as empresas estatais do setor estão depreciadas.
Condições de mercado e um ambiente favorável às concessões e privatizações tenderiam a beneficiar a população e aquecer o mercado de capitais no setor, mas a eventual insegurança jurídica a partir de 2023 enterrou essa ideia.
Em julho, a Corsan, estatal do Rio Grande do Sul, também desistiu do IPO e acabou indo a leilão. A Aegea, investida da Itaúsa (ITSA4), arrematou os ativos com uma proposta de R$ 4,15 bilhões, materializando a solução privada para um problema estatal.
Hoje, a BRK Ambiental atua em estados de todas as regiões do país, operando serviços de água e esgoto para mais de 16 milhões de clientes.
As ações do setor devem reagir negativamente à desistência do IPO da BRK Ambiental, enquanto os investidores precificam a transição do governo, que neste momento deixa as condições de mercado ainda mais sensíveis.