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Crise da Americanas (AMER3) acende alerta para bancos e crédito pode ficar mais caro a empresas

Santander já provisionou cerca de 30% do dinheiro que tem a receber da Americanas, mas ainda não vê risco sistêmico

Foto: Shutterstock/casa.da.photo

Embora a crise da Americanas (AMER3) tenha mostrado que a varejista deve mais do que se imaginava aos bancos, já é sabido que as instituições financeiras não estão em apuros.

Para o Bradesco (BBDC4), por exemplo, banco que mais tem dinheiro a receber da Americanas (R$ 4,8 bilhões), a dívida da varejista não passa de 0,55% da carteira de crédito total da instituição. Ou seja, certamente não é algo que vai gerar uma quebradeira no setor bancário.

Por outro lado, a crise da Americanas pode deixar os bancos mais cautelosos na hora de conceder novos empréstimos, sendo mais seletivos em relação aos clientes e cobrando juros maiores, para compensar o risco.

Por enquanto, pelo menos no discurso, a varejista é tratada pelos bancos como um caso isolado, mais como um episódio de fraude contábil, de má governança, e menos como um indício de crise do sistema.

Mas isso não significa que não tenha ficado mais difícil para as companhias captar recursos no mercado.

O analista Carlos Eduardo Daltozo, chefe do time de análise da Eleven Financial Research, ressalta que já há empresas com dificuldades para atrair investidores para emissões de dívida com condições acertadas antes do estouro da crise da Americanas, como a Klabin.

A companhia, ele lembra, emitiu uma dívida oferecendo como retorno a taxa CDI com um prêmio de 0,5 ponto percentual, uma operação que a Eleven recomendou aos clientes que não entrassem, porque havia empresa do mesmo setor pagando mais, em uma oferta de CDI + 0,8 p.p.

“O caso da Americanas já contaminou o mercado”, disse o analista, à Agência TradeMap. “A janela para emissões se fechou um pouco.”

Provisões

Entre os bancos, embora o caso ainda não represente uma crise sistêmica, já é perceptível o impacto nos resultados do setor.

Na semana passada, o Santander (SANB11) foi o primeiro grande banco listado na B3 a publicar resultados para o quarto trimestre e, por causa da crise da Americanas, aumentou as despesas para se proteger de eventuais calotes, com as chamadas provisões para devedores duvidosos (PDDs).

No quarto trimestre, as PDDs do Santander somaram R$ 7,3 bilhões, alta de 18,6% em relação ao terceiro trimestre, ou R$ 1,1 bilhão a mais, o equivalente a 30% da dívida da Americanas com o banco.

No caso do Santander, a dívida da Americanas (R$ 3,6 bilhões) representa 0,75% da carteira de crédito, mas um aumento de provisão como esse afeta a lucratividade de forma significativa.

No quarto trimestre, o lucro líquido do banco despencou 45,9% em relação ao terceiro trimestre, para R$ 1,69 bilhão, frustrando todos os analistas do mercado, que tinham previsões que superavam a casa dos R$ 2 bilhões.

O mercado só não sabia se o Santander iria incluir provisões envolvendo a Americanas já no quarto trimestre ou deixaria para os balanços seguintes.

De qualquer forma, ainda não se sabe se o que havia para provisionar já foi feito ou se ainda há espaço para mais.

Na coletiva de imprensa para comentar os resultados do quarto trimestre, o CEO do Santander, Mário Leão, evitou falar o nome da Americanas, mas disse que é muito difícil prever se o que já foi provisionado será suficiente ou não.

“Fazemos provisões com alguma materialidade refletida aqui, e temos outros casos provisionados no atacado [crédito para empresas]. É muito difícil prever, e nesse caso não é diferente, porque não sabemos como cada um vai evoluir”, disse o executivo.

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Apesar do caso da Americanas e também do exemplo da Oi, o CEO do Santander Brasil afirmou que não vê uma piora do cenário da concessão de crédito para empresas como um todo. “Ainda não temos visto um efeito cumulativo de alavacangem do custo de crédito.”

Segundo Leão, o “grande elemento” para definir como o cenário vai evoluir é a taxa básica de juros, que está em 13,75% ao ano, no maior nível desde 2017. “Quanto mais tempo o juro fica alto, pior para as empresas”, destacou. “Vai ter risco de deterioração se a Selic continuar alta.”

Crise da Americanas (AMER3): caso isolado?

O analista Rafael Reis, do Banco do Brasil, vê a crise da Americanas mais como um caso isolado, mas ressalta que acende uma luz amarela para os bancos.

Para ele, os demais bancos que ainda vão publicar os resultados do quarto trimestre devem seguir o exemplo do Santander e elevar as provisões para incluir a crise da Americanas na conta.

Na visão de Reis, se de fato o Santander provisionou 30% da dívida da Americanas, esse é um bom percentual, porque o caso ainda é muito fresco.

“Ainda está muito nebuloso o que vai acontecer com a empresa, como se dará a briga com os credores e qual será o fim disso”, disse.

O cenário pode até melhorar, ressaltou o analista do BB, se a Americanas conseguir, por exemplo, vender ativos e mostrar que consegue continuar operando.

Para o investidor ficar de olho, o Itaú Unibanco divulgou seu balanço do quarto trimestre na noite desta terça-feira (07) e o Bradesco apresenta seus números ao mercado na noite de quinta (9).

Varejo na berlinda

Seja como for, é provável que empresas do setor do varejo, contaminadas pelo caso da Americanas, encontrem mais dificuldades para captar recursos, não apenas em razão da crise da varejista, mas também porque o ambiente macroeconômico é desfavorável ao setor e os juros já estão altos, com a taxa Selic a 13,75% ao ano, no maior nível desde 2017.

Para Fernanda Rezende, diretora da agência de classificação de risco Fitch, a captação de recursos pode ficar mais cara para as empresas do varejo no curto prazo, mas tende a ser um movimento que não se sustentaria no longo prazo, em especial para as grandes companhias.

Na avaliação de Rezende, as companhias do setor vão ter fluxo de caixa livre negativo, ou seja, vai sair mais dinheiro do caixa do que entrar, mas devem conseguir fazer o repasse do aumento de custos e reduzir os estoques.

Das empresas do setor que estão com riscos mais elevados, Rezende cita a situação de Guararapes (GUAR3) e C&A (CEAB3).

“Muitos participantes do setor estão com alavancagem elevada, acima do trigger (gatilho) de rebaixamento de nota, e o ambiente de negócios adiciona riscos a empresas com esses indicadores já fracos”, ela disse, durante participação no Credit Outlook 2023.

Americanas é uma das empresas avaliada pela agência de classificação de risco. Após a fraude contábil e o pedido de recuperação judicial, a nota da empresa como emissor local foi rebaixada de “C” para “D”, o que significa dizer que passou de risco de inadimplência para algum evento de inadimplência.

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