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De “dovish” a “hiato do produto”: comece a falar a língua do Banco Central

Veja o glossário dos principais termos utilizados pelo BC para definir o rumo da taxa Selic no Brasil

Foto: Shutterstock

Quando o assunto é política monetária, as palavras importam, e muito. Você já deve ter lido sobre economistas quebrando a cabeça para adivinhar o significado de uma simples mudança de termo na ata do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central, na busca de indicativos de preocupações maiores ou menores com a inflação, ou juros mais ou menos altos à frente.

Toda essa interpretação pode se refletir nas expectativas do mercado financeiro para taxas, preços, para a cotação do dólar e para o desempenho da atividade econômica. E essas sinalizações captadas pelos economistas são importantes por um motivo simples: elas dão previsibilidade para cidadãos, empresas e o sistema financeiro conseguirem se programar para o futuro, tomando decisões de consumo ou investimento.

“Quanto será cobrado pelo aluguel em sua renovação? Nos próximos meses, o preço dos alimentos cairá ou não? A mensalidade da escola particular será reajustada? O custo dos financiamentos irá diminuir ou aumentar? Para responder a essas dúvidas, é importante que a sociedade tenha conhecimento do que se espera na economia”, explica o Banco Central, em seu site.

É por isso que grandes agentes de mercado, como bancos, consultorias e corretoras, possuem áreas inteiras dedicadas à pesquisa macroeconômica, elaborando projeções para o futuro.

Essas estimativas do que vai acontecer com o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, o principal referencial de inflação do país), com os juros, o câmbio e o PIB (Produto Interno Bruto) chegam ao Banco Central por meio do Boletim Focus, uma pesquisa semanal com 140 instituições cadastradas.

As expectativas ajudam os diretores e o presidente do Banco Central a definirem, a cada 45 dias, a nova taxa de juros básica da economia, a Selic, que serve como referência para o custo das operações de empréstimo entre os bancos e, consequentemente, para o crédito a pessoas físicas e jurídicas.

Os encontros do Copom são divididos em dois dias, sempre às terças e quartas, e têm como objetivo definir os juros adequados para que o BC consiga entregar a inflação oficial (IPCA) na meta definida pelo CMN. O Conselho Monetário Nacional é um órgão formado por representantes do próprio BC, do Ministério da Fazenda e Secretaria Especial do Tesouro Nacional.

Para 2023, por exemplo, o objetivo é uma alta de preços de 3,25%, com um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo (ou seja, ao mesmo tempo em que o colegiado quer conter a inflação, também não pode exagerar na dose dos juros, o que tem efeito negativo sobre a atividade econômica).

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A decisão sobre juros sempre é divulgada acompanhada de um comunicado após o fechamento do mercado, a partir das 18h30, no segundo dia de reuniões. Na terça-feira da semana seguinte, sai a ata do Copom, detalhando o cenário traçado pelo Banco Central.

 

Membros do Copom reunidos no Banco Central em Brasília no início de maio
Membros do Copom reunidos no Banco Central em Brasília no início de maio (Foto: Divulgação/ Banco Central)

Como o Copom se comunica

O comunicado, a ata do Copom e até discursos dos diretores e do presidente do BC, Roberto Campos Neto, podem parecer complicados de entender para aqueles que não estão familiarizados com os termos que costumam ser usados pelos membros do comitê.

A linguagem usada precisa ser formal, e não pode ser direta a ponto de o colegiado se “amarrar” a algum compromisso que não poderá ser cumprido no encontro seguinte – afinal de contas, as condições da economia brasileira e internacional mudam a todo momento.

Ao mesmo tempo, o comitê costuma sinalizar os próximos passos com base no cenário presente nos últimos parágrafos do comunicado. Na ata, essa sinalização costuma entrar no item D (Decisão de Política Monetária).

Confira a seguir os principais termos utilizados pelo BC nos documentos, e o que eles querem dizer:

  • Horizonte relevante

É o período de tempo que o Banco Central está mirando ao aumentar, elevar ou manter a Selic. Atualmente, o horizonte relevante já é 2023, ano para o qual a meta de inflação é de 3,25%.

Para entender esse conceito, é importante saber que o aumento ou a queda na taxa básica de juros leva meses tempo até chegar totalmente na ponta, a consumidores e empresas. É o que se chama de defasagem da política monetária.

O diretor de Política Econômica do BC, Diogo Guillen, afirmou nesta quinta-feira (24) que essa demora leva até cinco trimestres, ou seja, pouco mais de um ano.

  • Cenário de referência

O Banco Central sempre menciona em seus comunicados e na ata o chamado cenário de referência, que é a estimativa para juros, inflação e câmbio que o Copom mais analisa na hora de tomar suas decisões.

Esse cenário é formado pelas expectativas para a taxa básica de juros, a Selic, que constam da pesquisa Focus para o horizonte relevante, que hoje é 2023. No caso do câmbio, o BC adota projeções para a paridade de poder de compra, que mostra o quanto a moeda brasileira compra de produtos e serviços em outros países.

  • Balanço de riscos

Para tomar a melhor decisão de política monetária, o Banco Central possui modelos matemáticos para quantificar os riscos para a inflação, tanto na economista doméstica como na internacional.

Nessa conta, costumam entrar informações como a cotação projetada para commodities, a política de juros nas principais economias do mundo, o comportamento da atividade econômica no Brasil e no mundo e a taxa de câmbio, entre outros fatores.

O risco fiscal, que é a chance de aprovação de medidas que façam o país gastar além do adequado para financiar a dívida pública, também sempre é considerado pelo BC.

  • Forward guidance 

É um instrumento de política monetária usado pelos bancos centrais do mundo para influenciar as projeções do mercado ao indicar o que pretende fazer no futuro.

Um exemplo desse mecanismo aconteceu em agosto de 2020, quando em meio à pandemia de coronavírus o Banco Central sinalizou que manteria os juros baixos caso as expectativas de inflação não subissem excessivamente.

Nesse caso, o foward guidance não deu certo, já que a pandemia desorganizou as cadeias de fornecimento de produtos globais e as projeções para o aumento de preços dispararam, obrigando o BC a subir os juros.

  • Hiato do produto

O hiato do produto é a diferença da soma de todos os bens e serviços de uma economia, no momento atual, e a estimativa do quanto o país teria potencial de produzir.

Dessa forma, se o PIB (Produto Interno Bruto) está acima do seu potencial, o hiato é positivo. Nesse contexto, a tendência é de aumento de inflação e menos desemprego.

Por outro lado, se o hiato for negativo, significa dizer que o PIB está abaixo do seu potencial, cenário que tende a reduzir pressões inflacionárias e aumentar o desemprego.

  • Taxa neutra, contracionista e expansionista

A taxa de juros neutra é aquela que não acelera nem desacelera a inflação, ao mesmo tempo em que mantém o hiato do produto descrito acima zerado (ou seja, sem estimular nem desestimular o mercado de trabalho).

Essa taxa é calculada para que o BC avalie os melhores passos para a política monetária, e nesta quinta (23) foi elevada de 3,5% para 4%. Atualmente, os juros estão em 13,25% ao ano, ou seja, muito acima da taxa neutra.

Em suas atas, o BC vem indicando que, em meio à disparada da inflação, o momento pede uma taxa significativamente contracionista (ou seja, juros tão altos que reduzam o poder de compra das famílias e empresas a ponto de desacelerar a inflação).

O oposto seria uma taxa de juros tão baixa que seria expansionista, estimulando a atividade e pressionando os preços para cima.

  • Ancoragem de expectativas e convergência

Como explicado no início do texto, o Banco Central depende das expectativas de analistas e economistas para juros, inflação, atividade e câmbio (colhidas no Boletim Focus) para definir quais decisões de política monetária irá tomar.

A ancoragem de expectativas é quando, por meio de decisões de juros ou indicações feitas nos comunicados, o Copom consegue trazer as projeções para a meta definida pelo CMN para o período.

Para 2023, por exemplo, os economistas ouvidos pelo Focus já esperam um IPCA de 4,70%. Como a meta de inflação para o ano que vem é de 3,25%, com um teto de 4,75%, é possível dizer que as expectativas estão cada vez mais desancoradas, ou seja, fora do objetivo do BC.

Da mesma forma, o BC fala em convergência para a meta, que é quando a inflação reage à política monetária e começa a se aproximar do objetivo.

  • Dovish e hawkish

Esses não são termos usados na comunicação do BC, mas são apelidos que o mercado financeiro deu para classificar os comunicados ou discursos das autoridades monetárias do mundo todo.

Eles têm origem em duas aves. Hawkish, ou falcão, é o termo usado para representar posturas mais agressivas contra a inflação, indicando altas maiores de juros. Dovish, ou pomba, é quando os bancos centrais parecem menos preocupados com a alta de preços, indicando juros menores.

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