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BC “errou para baixo” em 2020 e agora vai ter que “errar para cima”, diz Frasson

Economista do BTG Pactual Digital mantém aposta em Selic a 12,25% ao fim do ciclo e espera volatilidade "relevante" com eleições

O Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) foi mais neutro do que hawkish (mais propenso a elevar juros) no comunicado da decisão em que elevou a taxa básica, a Selic, em 1,5 ponto percentual, para 10,75% ao ano, no maior patamar desde 2017.

A avaliação é do economista Álvaro Frasson, responsável pela análise de economia e política do BTG Pactual digital, que aponta ainda que a indicação do colegiado de que reduzirá o ritmo de alta no próximo encontro, em março, pode ser reflexo da queda registrada nos indicadores de confiança de comércio, serviços e consumidores.

“Essa sinalização de redução no ritmo de altas tem alguns pontos importantes. O primeiro é que o Banco Central adota uma postura mais neutra do que hawkish. Talvez pela preocupação com os índices de confiança, que se deprimiram muito nos últimos meses”, pondera. “Ou seja, mostra um BC um pouco mais preocupado com a atividade.”

Para ele, o Banco Central “errou para baixo” no passado e, por isso, agora terá que “errar para cima”. A política fiscal, com o rompimento do teto de gastos, também não ajudou. “Estamos em um ano eleitoral. Se tivéssemos feito uma política fiscal mais assertiva, não há dúvida de que o juro real poderia ser muito menor”.

Frasson aponta ainda que as expectativas para a próxima reunião — atualmente o mercado espera mais uma alta de um ponto percentual na taxa– podem ser elevadas para 1,25 ponto caso a inflação se mantenha pressionada nas próximas semanas.

“A inflação de 2022 segue pressionada, já que os preços dos bens industriais ainda permanecem elevados”, afirma. “Continuamos com a Selic a 12,25% no final do ciclo e entendo que o Copom quis diminuir a volatilidade das apostas do mercado nas próximas reuniões, algo que é de fato positivo.”

Ele lembra ainda que 2022 será um ano de muitos altos e baixos. “Quando fazemos análise de volatilidade, o fato é que em todo ano eleitoral os ativos de maior risco, como ações e câmbio, ficam mais voláteis que em anos anteriores”.

Veja a seguir a entrevista completa com o economista.

O que achou do comunicado do BC indicando que o ritmo de altas será reduzido daqui para a frente? E o que espera para as próximas reuniões?

Essa sinalização de redução no ritmo tem alguns pontos importantes. O primeiro é que o Banco Central adota uma postura mais neutra do que hawkish. Talvez pela preocupação com os índices de confiança, que se deprimiram muito nos últimos meses. Ou seja, mostra um BC um pouco mais preocupado com a atividade.

O segundo é que, caso as expectativas de inflação para 2022 não cedam nas próximas semanas, o mercado poderá precificar 125 pontos-base de alta e não 100 pontos, como hoje precifica para março. Talvez possa até estender a alta do ciclo, ainda que este não seja o nosso cenário base.

Continuamos com a Selic a 12,25% no final do ciclo e entendo que o Copom quis diminuir a volatilidade das apostas do mercado nas próximas reuniões, algo que é de fato positivo.

Vale lembrar também que o juro real ex-ante [Selic menos a inflação esperada para os próximos 12 meses] agora se encontra acima de 5% ao ano, acima da média histórica do Brasil, que sempre teve juros mais elevados. Logo, eu acho que o BC acerta no movimento.

O IGP-M e o IPCA-15 de janeiro mostraram uma aceleração da inflação. Os preços podem demorar mais do que o esperado para arrefecer?

Hoje o cenário do banco é de um IPCA de 5,4% no final do ano. O IGP-M veio com um IPA [Índice de Preços ao Produtor Amplo] pesando bastante, avançando de 0,82%, em dezembro, para 2,50%, em janeiro. Isso foi muito por causa do minério de ferro, cujo preço em dólar está subindo 16%, 17%.

Isso impacta diretamente os preços de bens industriais, que sofrem também com os estoques ainda baixos em função dos problemas nas cadeias de produção gerados pela Covid-19 e agravados pelo avanço global da variante Ômicron. Não coincidentemente, os PMIs [índices de gerente de compras] globais de janeiro vieram abaixo do esperado.

Portanto, a inflação de 2022 segue pressionada, já que os preços dos bens industriais ainda permanecem elevados, sobretudo com o atual cenário de petróleo, em função da crise entre Rússia e Ucrânia, e do minério de ferro, com a política monetária expansionista da China.

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Além disso, quando vemos o Brasil em termos de Covid-19, estamos crescendo nas médias móveis. As últimas estatísticas mostram o maior número de mortes desde novembro. Isso impacta os preços industriais, não só em janeiro como também em fevereiro.

Essa alta no IGP-M pode se refletir após alguns meses no IPCA?

Tem esse aspecto, mas não necessariamente toda a alta que vem do atacado consegue chegar ao consumidor. Tem uma defasagem que fica no caminho, sobretudo quando o empresário não consegue fazer o repasse por uma demanda mais fraca por causa de juros mais elevados, desemprego mais alto, e acaba sofrendo uma redução de margem em seus negócios. Vale lembrar que o IGP-M é muito mais volátil do que o IPCA.

Os índices de confiança estão todos em queda, a confiança do comércio, do consumidor, da indústria, do empresariado, tudo está muito fraco. Está até piorando por conta do efeito do ciclo de alta de juros, que já impacta negativamente nas expectativas de PIB para este ano.

Agora, o componente de inflação não é só de demanda, é mais de oferta. Aqui no Brasil temos um histórico de inflação, e o brasileiro reajusta os preços mais rápido, com medo do que acontece lá atrás.

A demanda está muito fraca. O empresário pode querer repassar, mas, se não tiver demanda, não adianta.

No IPCA-15 de janeiro, vimos as médias dos núcleos de inflação subindo, o índice de difusão também está mais alto. A inflação está muito mais disseminada em vários segmentos. O IPCA-15 estressou a curva de juros, já que o índice surpreendeu não só no quantitativo, como também no qualitativo.

O mercado já tinha precificado 320 pontos de alta nas reuniões de fevereiro do Copom até junho. Hoje já precifica 360 pontos, por causa da inflação e também por causa do Fed.

A Selic está subindo desde março do ano passado e, mesmo assim, a inflação está elevada. Qual a efetividade da política monetária em um cenário como esse?

Alguns críticos afirmam que essa alta de juros mais trava a economia do que controla a inflação. Mas vale lembrar que nos últimos dois anos os bancos centrais erraram “para baixo”, ou seja, colocaram os juros em níveis muito baixos para estimular a demanda que a Covid-19 estava deprimindo.

No entanto, nada foi pensado para ajudar a oferta e a consequência é uma inflação muito acima do esperado por conta desses movimentos. Além de errarem na dose em 2020, o Fed e a maioria dos BCs ao redor do mundo erraram no diagnóstico de 2021. Se você voltar 12 meses atrás, os comunicados do Fed falavam em inflação transitória, que esse papo de alta de juros era para o final de 2022 ou para o início de 2023. Mas ao longo do ano passado eles começaram a admitir que não era bem assim.

O Fed errou no diagnóstico, e quando o maior banco central do mundo erra na dose da expansão monetária, acaba gerando mais inflação global.

O Brasil também errou, quis copiar o Fed e usava forward guidance [instrumento de política monetária implementado em agosto de 2020, em que o BC sinalizou que manteria os juros baixos, desde que as expectativas de inflação não subissem demais], um instrumento que banco central de país emergente não consegue fazer com a mesma credibilidade por n razões.

Em resumo, como o BC errou para baixo em 2020, agora vai precisar errar para cima na Selic de 2022 para controlar as expectativas de inflação.

Estamos em um ano eleitoral. Se tivéssemos feito uma política fiscal mais assertiva, não há dúvida de que o juro real poderia ser muito menor.

Como você avalia esse ano de eleições presidenciais? Como isso deve se refletir na economia e no mercado?

Quando fazemos análise de volatilidade, o fato é que em todo ano eleitoral os ativos de maior risco, como ações e câmbio, ficam mais voláteis que em anos anteriores. Sobre as eleições em si, há um cenário em aberto, sobretudo na terceira via.

Acredito que o cenário base do mercado para o segundo turno ainda seja Lula versus Bolsonaro, mas, se você olhar o tempo de rádio e TV que os partidos de centro e centro-direita têm, caso se unifiquem em uma única candidatura, como União Brasil, PSDB, MDB, PSD, Podemos e Cidadania, podem ter mais de 40% do tempo neste primeiro semestre. Acho uma informação bem relevante e que o mercado tem observado pouco e, portanto, não consta no preço dos ativos.

Existe muita coisa em aberto, por isso a volatilidade esperada é relevante.

O que eu tenho dito muito para clientes é para não tentar acertar tendências de mercado no primeiro semestre. Com Selic em 12% ao ano e sem risco, dá para esperar um timing mais confortável para assumir mais risco-Brasil.

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