Apesar de ter sido desidratada em votação na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara ontem, a PEC da Transição aponta para o caminho do aumento da dívida pública e mais estímulos inflacionários, o que vai na direção oposta aos esforços do Banco Central para conter a alta de preços, avaliam economistas.
Nesta quarta-feira (7), o Copom (Comitê de Política Monetária do BC) deve manter a taxa básica, a Selic, em 13,75% ao ano, mas a expectativa é de um recado firme ao novo governo de que um eventual descontrole das contas públicas será sinônimo de juros altos por mais tempo.
O mercado espera que o Banco Central comece a cortar a taxa em 2023, mas avalia cada vez mais que esse afrouxamento monetário ocorrerá somente no segundo semestre.
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Ontem, a comissão do Senado aprovou a ampliação do limite do teto de gastos em R$ 145 bilhões para manter o pagamento do Bolsa Família de R$ 600 e outros benefícios sociais por dois anos – o substitutivo apresentado à comissão previa um valor maior, de R$ 175 bilhões.
A proposta de emenda à Constituição deve ser votada hoje no plenário da casa.
“Estamos descendo rápido a ladeira institucional quando o assunto é reforma fiscal, exatamente na direção oposta”, afirmou o ex-diretor do Banco Central, Alexandre Schwartsman, em relatório. “No melhor cenário, isso forçaria o Banco Central a adiar o afrouxamento da política monetária.”
O texto prevê que o teto de gastos, que limita as despesas à inflação do ano anterior, seja substituído por outro mecanismo de controle fiscal, mas essa solução foi considerada no mínimo insuficiente por economistas.
De acordo com a PEC, isso deve ser feito por meio de uma lei complementar, que terá que ser enviada pelo Executivo até dezembro de 2023. É um caminho considerado mais fraco do que a aprovação de uma PEC.
Foi uma proposta de emenda à Constituição que instituiu o teto de gastos, e nem isso impediu que o mecanismo fosse alterado nos últimos anos para permitir mais despesas.
“Normalmente, aplaudiria a ideia de usar leis complementares em vez de emendas constitucionais nesses assuntos”, ponderou Schwartsman. “Mas tenho que reconhecer que (iisso) reduz ainda mais a credibilidade de qualquer regime fiscal nascido desta estimativa. Se nem inscrever limites fiscais na Constituição é suficiente para evitar que o Executivo eleve gastos ao sabor de conveniências políticas, uma lei complementar seria um obstáculo ainda menor.”
Déficit de 1,4% do PIB
Para o economista Alberto Ramos, do Goldman Sachs, se a proposta for aprovada no Senado, a expectativa é que o setor público reverta o superávit primário (receitas menos despesas antes do pagamento de juros) que será registrado em 2022 pela primeira vez. A dívida pública, afirmou o especialista em relatório, voltará à tendência de alta.
“Projetamos que o resultado primário do setor público cairá dos 1,3% de superávit em 2022 para 1,4% de déficit em 2023, com a dívida crescendo entre três a quatro pontos do PIB”, disse Ramos.
“Além disso, uma regra fiscal mais solta em um cenário de mercado de trabalho aquecido mina a efetividade da política monetária e a busca do Banco Central para reduzir a inflação e ancorar novamente as expectativas para os preços.”