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Mercado brasileiro está barato e poderá ter rali se incerteza fiscal de 2022 diminuir, diz Figueiredo, ex-BC

CEO da gestora Mauá Capital vê oportunidades em títulos públicos com prazos de vencimento mais longos, mas ainda está pouco comprado em Bolsa

Foto: Divulgação

Em meio a uma queda no ano da ordem de 14% do Ibovespa, o principal referencial da Bolsa brasileira, os ativos já refletem um nível de desconto muito grande por conta da incerteza no cenário político e fiscal. A aprovação da PEC dos Precatórios e do Orçamento para 2022, contudo, pode despertar um alívio para os mercados neste ano, assim que isso for definido.

“Se o déficit primário para 2022 ficar próximo a 1% do PIB, podemos ver um rali dos ativos brasileiros”, avalia Luiz Fernando Figueiredo, sócio-fundador e CEO da gestora Mauá Capital e ex-diretor de Política Monetária do Banco Central.

Para Figueiredo, os ativos brasileiros, de renda fixa e variável, estão em geral estão muito baratos. Quem tem estômago e pode esperar pelo menos 12 meses, diz, vai poder comprar hoje a preços muito menores que em um ano. O ex-diretor do BC vê oportunidades em títulos públicos com prazos de vencimento mais longos, com a  taxa de juros de dez anos no Brasil ao redor de 12%.

O mercado reflete hoje, em sua visão, a incerteza de um cenário eleitoral polarizado em 2022. “Se a terceira via ganhar musculatura, ela muda completamente o cenário no Brasil”, diz.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista concedida à Agência TradeMap.

Os ativos brasileiros estão sendo afetados pelo aumento da incerteza fiscal. Qual seria o pior cenário para os mercados em relação à aprovação da PEC do Precatórios?

O pior cenário não tem a ver só com a PEC dos Precatórios, mas com um gasto fiscal no ano que vem muito superior ao que está se estimando hoje, que é da ordem de 1% do PIB. Qualquer coisa muito diferente disso será um problema enorme.

Nesse sentido, dependendo da maneira pela qual passar a PEC dos Precatórios e se o Orçamento para 2022 for aprovado com a manutenção do déficit primário em torno de 1% do PIB, vamos ter um rali dos ativos brasileiros.

Mas tudo vai depender de como será esse arranjo fiscal para bancar o aumento do Auxílio Brasil. Se for permanente, saber de onde virá essa receita permanente. No fim das contas, vai depender de como será definido o Orçamento no ano que vem, porque a questão fiscal no longo prazo vai estar vinculada a como será o novo governo. O Lula já disse que é contra o teto de gastos. Então, a regra do teto tem risco de não existir após 2022.

O cenário eleitoral para 2022 já está em discussão. Como isso deve afetar os mercados e como vocês estão se posicionando para esse cenário?

Se a terceira via ganhar musculatura, ela muda completamente o cenário no Brasil e será muito diferente desse ambiente negativo que todo mundo está projetando da polarização. Tudo está sendo construído ainda, mas o fato positivo é que todos os candidatos disseram que vai apoiar aquele que estiver com mais chance entre maio e julho.

O centro unido tem bastante força. Se tiver um candidato viável, conhecido, muda muito o jogo. Sergio Moro largou muito bem, com 11% de intenções de voto. Hoje, o que está nos preços é a incerteza de um cenário radicalizado. Mas a eleição está muito longe ainda, vamos ver como isso evolui.

Como a Mauá tem se posicionado nesse contexto?

Os ativos brasileiros estão muito depreciados, a bolsa brasileira cai 20% em dólar, enquanto as americanas sobem 25%, na média, e as europeias, 15%. A curva de juros está um desastre.

Já temos muito risco nos preços. Se reduzir a incerteza sobre o resultado fiscal no ano que vem,  temos uma mudança muito grande. Os ativos brasileiros em geral estão muito baratos e refletem um grau de incerteza, em alguma medida, até de disruptura. Quem tem estômago e pode esperar pelo menos 12 meses vai estar comprando os ativos hoje muito mais baratos que daqui a 12 meses. Agora, temos um ambiente volátil. Não estamos muito comprados em Bolsa.

Onde estão as oportunidades na renda fixa considerando esse contexto?

A parte média e longa da curva da NTN-B  [que engloba papéis do Tesouro indexados à inflação com vencimentos no médio e longo prazos] está pagando uma taxa [real de juros] acima de 5% e os títulos públicos prefixados acima de cinco anos também estão com prêmio interessante.

Minha visão é que ninguém vai explodir o Orçamento, nem o Lula, e os ativos hoje refletem esse risco. Na parte de crédito privado, estamos vendo prêmios mais altos, inclusive em  relação às NTN-Bs. Apesar de grande demanda por debêntures de infraestrutura, muitas empresas não estão conseguindo emitir porque a incerteza é muito grande.

O mercado tem elevado as expectativas de inflação, que ultrapassam dois dígitos neste ano e estão acima do centro da meta em 2022, ao mesmo tempo que a previsão para o PIB tem sido revista para baixo. Como o BC deve olhar esse balanço de risco?

A situação é desafiadora, o Banco Central está em uma situação difícil. O fenômeno da inflação é mundial. A inflação dos últimos 12 meses está acima de 6% nos Estados Unidos. Aqui está maior por causa do custo de energia, que subiu muito por conta do problema hídrico, da taxa de câmbio que depreciou bastante, e da percepção de risco fiscal.

O Banco Central do Brasil foi o que mais subiu a taxa básica de juros,  elevando a taxa Selic em 5,75 pontos percentuais [desde o início do ciclo de aperto monetário]. O segundo país que mais subiu a taxa de juros foi a Rússia, que elevou a taxa em 3,25 pontos percentuais.

O BC está respondendo ao que está acontecendo, o que vai provocar menor crescimento no ano que vem. O país deve crescer menos de 1% em 2022. Como a inflação neste ano será muito alta, provavelmente superior a 10%, nossa previsão é de 10,20% neste ano e entre 5% e 5,5% em 2022; a inflação ir para o centro meta no ano que vem [que é de 3,5%] é quase impossível. Isso deve ficar para 2023.

Nosso cenário, é que o BC deve elevar a taxa básica de juros para 11% a 11,5% ao ano, não muito mais do que isso. Essa já é uma taxa muito contracionista.

O senhor diz que o aumento da inflação está sendo puxado por alimentos, energia e câmbio. Esses fatores devem continuar a pressionar a inflação ano que vem?

A inflação foi muito pressionada pelos preços administrados, que vão subir algo como 16% neste ano. Para o ano que vem, mesmo se tiver um aumento dos preços de energia, a alta dos administrados deve ficar entre 5% e 5,5%.

Quanto ao preço de commodities, como o mundo não está acelerando o crescimento, que está se acomodando, é pouco provável que os preços de commodities continuem a subir. Mais provável é que até caiam um pouco, com exceção do preço do petróleo, em que foi feito pouco investimento, e deve se manter em um nível alto.

Já em relação à taxa de câmbio, é mais provável ter, na margem, uma apreciação. As contas brasileiras são superavitárias, isso dá uma força de apreciação grande, que pode ser que não aconteça por conta do ano eleitoral em 2022.

Mesmo se o Fed [banco central americano] elevar a taxa de juros ano que vem, nosso cenário é de uma ou duas altas até o fim de 2022. Ainda assim, vai continuar a ser um ambiente com bastante liquidez e com custo de capital ainda baixo, e o real já está muito depreciado.

Vocês fizeram algumas mudanças na Mauá Capital neste ano, reduziram a área de fundos multimercados. Em quais segmentos estão focando mais?

O carro-chefe tem sido a área imobiliária, é uma área com muito potencial. O BC vai parar de subir a taxa básica de juros e o caminho de crescimento é grande. Também estamos olhando a área de saneamento e soluções do lado do agronegócio para empresas que queiram melhorar sua sustentabilidade e já estamos estruturando produtos com esse foco.

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