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Inflação deve cair muito gradualmente e fechar 2022 acima de 6%, diz Chermont, da Quantitas

Para economista e sócio da gestora Quantitas, juros altos e avanço da Ômicron vão derrubar PIB em 2022

O processo de redução da inflação é muito mais gradual do que o mercado financeiro pensa. Dessa forma, o mais provável é que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) encerre este ano com alta superior a 6%, cenário que requer uma taxa básica de juros (Selic) de 11,75%. Como consequência, o PIB (Produto Interno Bruto) deve cair 0,4%.

O cenário acima é de Ivo Chermont, sócio e economista-chefe da gestora Quantitas, que tem no currículo também passagens pela Itaú Asset, Kyros Investimentos e Itaim Asset Management. O especialista não vê muitas razões para ser otimista em 2022.

“Processos de desinflação, mesmo com a Selic mais alta, são morosos. Além do mais, estamos entrando em um ano em que o Fed [Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos] está subindo juro”, apontou ele em entrevista à Agência TradeMap. “Além disso, vai ter eleições presidenciais, e muito dificilmente o câmbio vai nos ajudar muito. Mesmo em um cenário de retomada da economia, agora tem a variante Ômicron [do coronavírus], que deve postergar um pouco a retomada”.

Na avaliação do especialista, juros a quase 12% ao ano serão insuficientes para garantir um fluxo de recursos estrangeiros forte o bastante para valorizar o real.

“O investidor vai olhar os 12% de juros mas vai avaliar também o risco que tem por trás. É o risco de uma eleição entre Lula versus Bolsonaro. Será que vamos conseguir atrair recursos com o Fed subindo juros? Esse país vai crescer? Isso tudo joga contra”, aponta.

Para Chermont, a única possibilidade de o mercado brasileiro decolar nos próximos meses é um eventual avanço do ex-juiz Sergio Moro nas pesquisas de intenção de voto para presidente. “Se as pesquisas começarem a mostrar o Moro se aproximando do Bolsonaro, o mercado voa. A única informação que pode fazer o mercado andar é na briga do lado da direita, de preferência com o Moro na frente”.

Leia abaixo a entrevista completa.

O que você vê acontecendo com a inflação neste ano? Vocês preveem um IPCA de 6,10%, maior do que a média do mercado [que projeta 5,09%, segundo o Boletim Focus]. 

Do ponto de vista macro, o que a gente tem mais convicção é que a desinflação é um processo muito mais gradual do que o mercado estima. A última vez que tivemos uma inflação alta como esta foi em 2015, com a presidente Dilma Rousseff. No ano seguinte, entrou o governo Michel Temer, um Banco Central em que o mercado acreditava, e mesmo assim terminamos com uma inflação de 6,29%.

Processos de desinflação, mesmo com a Selic mais alta, são morosos. Além do mais, estamos entrando em um ano em que o Fed está subindo juros.

Além disso, vai ter eleições presidenciais, e muito dificilmente o câmbio vai nos ajudar muito. Será uma eleição difícil, sem grandes alívios por parte do dólar, e mesmo em um cenário de retomada da economia, agora tem a variante Ômicron, que deve postergar um pouco a retomada.

Mas de qualquer forma vamos ter um ambiente em que pessoas com quantidade de poupança muito maior, a classe média e classe média alta, vão gastar mais. Durante a pandemia, a massa de dinheiro na mão das pessoas aumentou, e não diminuiu. Isso está muito mais na mão dos mais ricos, e em algum momento esse dinheiro vai virar consumo, quando a economia for retomada com mais vigor.

Em resumo, não há grandes variáveis que nos mostrem que a economia será deflacionada.

E o que podemos esperar para o câmbio? Tem gente que diz que a elevação dos juros no Brasil para acima de 10% vai atrair recursos e desvalorizar o dólar. Você concorda?

Esperamos um câmbio de R$ 5,60. Isoladamente, sem dúvida, muitos investidores vão ficar atraídos pela remuneração dos nossos títulos. Juros a 12% beneficiam o real, tem efeito no câmbio. Só que tem outras variáveis em jogo. Tem Fed subindo juros e retirando estímulos, tem eleições presidenciais.

O investidor vai olhar os 12% de juros mas vai avaliar também o risco que tem por trás. É o risco de uma eleição entre Lula versus Bolsonaro. Será que vamos conseguir atrair recursos com o Fed subindo juros? Esse país vai crescer? Isso tudo joga contra.

Olhando para todo esse cenário, acho que meio que empatam, e que jogam até um pouco contra a nossa moeda. Por mais que o real se beneficie de juros mais altos, o Brasil não é o único país que está subindo sua taxa básica. Mas temos bem mais risco que os outros.

O 12% só virou 12% porque tem muito risco. É impossível não citar o Pedro Malan [ex-ministro da Fazenda]: no Brasil, até o passado é incerto.

E como vê a atividade econômica, com juros altos e variante Ômicron?

Nossa projeção é de queda de 0,4% para o PIB, mas confesso que estou com viés de baixa para essa estimativa, por causa do primeiro trimestre.

A gente pode ser surpreendido para baixo. Estamos com projeção de zero no primeiro trimestre, mas acho que em janeiro, fevereiro, a percepção é que uma parte importante das pessoas, sobretudo de maior poder aquisitivo, que tem importância no consumo, estão mais resguardadas.

A quantidade de pessoas que está ficando doente é absurda, e estamos vendo que algumas lojas já estão sugerindo que os shoppings restrinjam os horários porque falta mão de obra. Se está faltando 20% dos funcionários por doença, dá para extrapolar que pelo menos 20% dos consumidores também não estão aparecendo.

Vemos muitas notícias também de cancelamento de voos. Minha impressão é que podemos ter um primeiro trimestre mais fraco do que zero.

E quanto às eleições? Como vê o cenário atual de polarização entre dois candidatos, o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula?

Temos dois polos na eleição, mas a polarização é um termo melhor empregado quando há dois polos brigando como iguais. Mas há claramente um favorito, no campo da esquerda. E dois outros que, se quisermos simplificar, estão no campo da direita.

Acho que a grande briga na verdade se vai dar no campo da direita, quem vai para o segundo turno. A não quer que ocorra algo muito extraordinário, parece bastante improvável que o Lula não vá para o segundo turno.

Nesse cenário, o Moro [o ex-juiz Sergio Moro) é suficiente para inviabilizar uma terceira via, ele interdita qualquer outro candidato, mas ao mesmo tempo pode ser pequeno demais para ameaçar a vaga de Bolsonaro no segundo turno.

O Bolsonaro teria uma chance maior se mostrasse a economia melhorando, a inflação baixa, estabilidade econômica.

Mas não é o caso. Teria chance também se tivesse mostrado forte no enfrentamento à pandemia. Também não é o caso.

Por isso, acho que existe uma chance razoável, de no mínimo 50%, de o segundo turno ser entre Lula e Bolsonaro.

E como essas disputas devem impactar o mercado?

Acho que se as pesquisas começarem a mostrar o Moro se aproximando do Bolsonaro, o mercado voa. A única informação que pode fazer o mercado andar é na briga do lado da direita, de preferência com o Moro na frente.

Até porque o raciocínio é o seguinte: se a a última coisa que o mercado quer é Lula, o Moro é mais forte que o Bolsonaro para ganhar dele.

E como fica o cenário para investimentos, na sua avaliação?

Muitas vezes o mercado coloca um monte de coisas no preço que ainda não ocorreram. Posso estar pessimista mas comprado, desde que os preços já tenham incluído todos esses fatores de pessimismo.

É o caso da Bolsa. Vejo valor na Bolsa, acho que os juros vão continuar mais altos por certo tempo, mas trocar renda variável por renda fixa agora é pé trocado.

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