A alta dos juros no Brasil aumentou o apelo dos investimentos de renda fixa, com oportunidades para quem deseja aplicar nesses ativos e montar uma carteira que gere rendimentos previsíveis e passíveis de superar a inflação nos próximos anos.
Embora haja várias opções disponíveis para o investidor, especialistas consultados pelo TradeMap apontam que é possível montar uma carteira com esse perfil apenas com investimentos em títulos da dívida pública brasileira por meio do Tesouro Direto.
Quem investe nestes papéis atualmente consegue travar um retorno da ordem de 12% ao ano, comprando títulos prefixados, ou garantir proteção contra a inflação – que neste ano poderá chegar a 8% – mais um rendimento extra de pelo menos 5,5% ao ano.
Para fins de comparação, essas taxas superam o dividend yield registrado em 2021 por três das ações de maior peso no Ibovespa – B3 (9,9%), Bradesco (5,8%) e Itaú Unibanco (3,2%), segundo informações disponíveis no TradeMap.
O dividend yield mede a proporção de dividendos e juros sobre capital próprio distribuídos por uma determinada empresa em relação ao preço das ações. Quanto maior este índice, melhor o investidor foi remunerado pelo investimento.
Segundo Sidney Brito, sócio-fundador da consultoria Andaluz, o momento é propício para investir na renda fixa e, embora seja recomendável diversificar os investimentos em mais de uma classe de ativos – por exemplo, aplicando em ações, além de Tesouro Direto -, pode fazer sentido para investidores mais conservadores montar uma carteira específica em títulos públicos.
Isso porque quem investe no Tesouro Direto sabe de antemão quando e quanto vai receber – algo que, na renda variável, é mais incerto. “É bom para um perfil que prefira compor renda para aposentadoria ou para pessoas que já vivem de dividendos”, diz Brito.
Em que meses o Tesouro Direto paga juros?
O calendário prevê o pagamento de juros pelo governo federal em oito dos 12 meses do ano, mas em dois desses meses são remunerados apenas investidores que possuem títulos atrelados ao IGP-M, que hoje estão indisponíveis para compra no sistema do Tesouro Direto.
Considerando apenas os papéis aos quais qualquer investidor pode ter acesso para compra hoje, há pagamentos previstos para fevereiro, maio, agosto e novembro (no caso dos títulos corrigidos pelo IPCA) e em janeiro e julho (para papéis com rendimentos prefixados).

Esse fator precisa ser levado em conta na hora de montar uma carteira voltada à geração de um fluxo contínuo de renda. O investidor precisa calcular o quanto vai receber nestes meses e se preparar para os períodos em que não haverá pagamento.
Outro elemento que deve ser considerado é o cenário econômico – a depender da expectativa de inflação e de juros, o investidor pode tentar adaptar a proporção dos investimentos em diferentes tipos de título para melhorar o rendimento da carteira.
Brito afirma que, com a expectativa de que a taxa básica de juros (Selic) pare de subir nos próximos meses e a inflação passe a desacelerar, pode fazer sentido ao investidor ficar mais exposto a títulos prefixados, ainda que com uma parcela mais restrita do portfólio. “No curto prazo, pode parecer que não se ganha tanto, mas, nos anos subsequentes, a gente consegue uma margem de ganho real superior à média do mercado.”
Marcelo Cypriano, economista da Mont Capital Gestão de Recursos, considera que o ideal é distribuir igualmente os investimentos entre títulos pós-fixados (indexados à Selic), prefixados e corrigidos pela inflação, porque desta forma é possível obter retornos em diferentes cenários.
Enquanto os títulos indexados ao IPCA protegem o patrimônio do efeito da inflação, os pós-fixados podem ser beneficiados em caso de alta residual da Selic, e os prefixados ajudam a mitigar riscos relacionados à queda das taxas dos títulos no mercado ao travar uma taxa de juros específica para o investidor, explica.
Carlos Castro, planejador financeiro com certificação CFP e cofundador da consultoria SuperRico, ressalta que, no cenário atual, os títulos prefixados são mais recomendados para investimentos no médio prazo – para períodos de dois a cinco anos -, mas que, para períodos mais longos, o mais indicado é investir em títulos indexados à inflação.
Os prefixados, segundo Castro, serão vantajosos quando os juros começarem a cair – algo que é esperado a partir de 2023. Isso porque a taxa contratada agora – perto de 12% ao ano – continuará a mesma, o que garantirá ao investidor uma remuneração maior que a do mercado.
Os títulos vinculados ao IPCA, contudo, também deixam o investidor numa situação vantajosa, segundo o planejador, porque estão oferecendo juros reais acima da média histórica, que tem sido de 3% a 4% ao ano.
Ele ressalta, porém, a necessidade de o investidor aplicar uma parte dos recursos em títulos pós-fixados para garantir liquidez à carteira. A quantia, neste caso, deve ser equivalente a pelo menos seis meses os gastos mensais.
Exemplo de carteira
A pedido do TradeMap, a Andaluz montou uma carteira hipotética partindo da premissa de que o investidor possui R$ 100 mil para investir apenas em Tesouro Direto e tem como objetivo obter renda, com um fluxo previsível de rendimentos.
A carteira sugerida prevê que 75% dos recursos sejam direcionados a títulos indexados ao IPCA, e que os 25% restantes sejam aplicados em papéis prefixados. Confira os detalhes a seguir:
TÍTULO | VALOR | REMUNERAÇÃO (ao ano)* |
Tesouro IPCA+ com juros semestrais 2032 | R$ 25 mil | IPCA+5,56% |
Tesouro IPCA+ com juros semestrais 2040 | R$ 25 mil | IPCA+5,59% |
Tesouro IPCA+ com juros semestrais 2055 | R$ 25 mil | IPCA+5,72% |
Tesouro Prefixado com juros semestrais 2033 | R$ 25 mil | 12,19% |
*Com base nas taxas de 19/04/2022
O fluxo de pagamentos entre maio (mês em que o investidor receberia a primeira remuneração) e abril de 2023 somaria R$ 5.811, considerando uma inflação de 6,5% ao longo deste período, de acordo com dados da calculadora do Tesouro Direto. Isso significaria uma renda mensal de aproximadamente R$ 484.
Brito ressalta que, como haverá meses sem pagamentos de juros, o investidor precisaria se organizar para ter esta renda extra mensalmente.
Nesse caso, o investidor seria remunerado em maio, julho, agosto, novembro, janeiro e fevereiro, e teria de guardar parte do dinheiro para usar nos meses em que não receberia o pagamento de juros.
Essa poupança poderia ser feita, inclusive, em títulos vinculados à Selic, para garantir que o dinheiro continue rendendo enquanto os resgates são feitos gradualmente, segundo Castro, da SuperRico.
Vale lembrar que esta carteira não equivale a uma recomendação de investimentos, dado que o perfil, as condições financeiras e as expectativas de cada investidor precisam ser avaliados caso a caso.