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Novo surto de Covid-19 na China põe em cheque fim da escassez de semicondutores

Empresas que dependem dos semicondutores acreditam que situação deve se normalizar no segundo semestre, mas gestores levantam dúvidas

Foto: Shutterstock

As empresas que estão ligadas à cadeia do setor automotivo e aguardam ansiosamente pelo fim da escassez de semicondutores — como locadoras de veículos e fabricantes de autopeças — tomaram um banho de água fria quando a China voltou a viver um novo surto de Covid-19, no mês passado. 

Até então, esperava-se que a oferta de semicondutores – que está restrita desde 2020, quando teve início a pandemia – se normalizasse ainda neste ano, mas o novo surto de Covid-19 na China gerou um congestionamento no Porto de Xangai, um dos maiores do mundo e por onde passam parte dos semicondutores exportados pelo país asiático, um dos principais produtores. 

“O setor vinha dizendo que a produção voltaria aos níveis de antes da crise no segundo semestre, mas acredito que esta retomada está em cheque”, afirmou Gustavo Wolf, sócio da Meraki Capital e analista responsável por acompanhar empresas do setor de transportes, à Agência TradeMap. 

Os semicondutores são chips que conduzem correntes elétricas em produtos eletrônicos, como computadores e celulares. Na indústria automotiva, é um tipo de material que tem ganhado cada vez mais importância, uma vez que os veículos estão cada vez mais equipados com componentes eletrônicos. Hoje, os chips representam, em média, 40% da produção de um carro. Em 2000, eram 18%. 

Os semicondutores começaram a faltar porque, com o isolamento social imposto pela pandemia, explodiu a demanda por equipamentos eletrônicos como notebooks e celulares. Já a venda de carros despencou, uma vez que as concessionárias fecharam as portas por tempo indeterminado e as pessoas não estavam saindo de casa. 

As fabricantes de semicondutores, com isso, passaram a priorizar o fornecimento para a indústria de eletrônicos. O problema é que, quando as restrições da pandemia foram sendo flexibilizadas e a demanda por carros foi se recuperando, já não havia mais chips suficientes para dar conta da produção das montadoras, gerando um desequilíbrio no setor. 

Sem conseguir produzir os carros que os consumidores demandavam, as montadoras se viram obrigadas a realizar paradas nas fábricas. O preço, consequentemente, disparou, e abriu espaço para a venda de seminovos e usados, uma vez que faltava carro novo na praça, e, quando havia, custava os olhos da cara. 

Em 2021, as vendas de veículos novos subiram apenas 2,98%, depois de um tombo de 26,6% em 2020, enquanto o mercado de usados cresceu 18,8% em 2021, após recuo de 13,7% em 2020, de acordo com dados da Fenabrave, federação que representa as concessionárias.

Quem não tem cão caça com gato

Em uma reação em cadeia, empresas como as locadoras de veículos, que compram veículos das montadoras para alugar, e as fabricantes de autopeças, que produzem de acordo com o ritmo de produção das montadoras, foram afetadas e tiveram de se adaptar.

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A Localiza, por exemplo, teve de trabalhar com o aluguel de carros mais velhos que o normal. Em geral, as locadoras revendem os veículos depois de um ano de uso, para sempre oferecer automóveis novos aos clientes de locação. 

No primeiro trimestre deste ano, a idade média da frota da Localiza foi de 16,7 meses, mais que o dobro da média de 2019, de sete meses — envelhecimento que eleva o custo de manutenção por parte das locadoras. 

Por outro lado, como a escassez de carros novos aumentou a demanda por seminovos, as locadoras também souberam surfar esse momento, por terem lojas de vendas de seminovos. 

A Movida, por exemplo, aumentou o número de pontos de vendas, que saltou de 70 para 81 nos últimos 12 meses até março, com a empresa chegando a comprar terrenos de antigas concessionárias que fecharam as portas em definitivo durante a pandemia. 

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São estratégias, porém, que levam em conta que a oferta de carros novos voltará ao normal. A Localiza quer voltar a intensificar a compra de carros novos para rejuvenescer a sua frota, enquanto a Movida, que já tem acelerado a aquisição de veículos, espera não ter que lidar com novos desequilíbrios entre oferta e demanda. 

Wolf, da Meraki, anda pouco esperançoso. Ele lembrou que, no acumulado de 2022, a média mensal de vendas de veículos está 30% abaixo de igual período de 2019 e, no início deste mês, a Volkswagen anunciou férias coletivas de 20 dias para os funcionários da fábrica de São Bernardo do Campo, por falta de semicondutores. 

“Se a expectativa era de retomada no segundo semestre, a situação era para estar muito melhor, mas, faltando um ou dois meses para o segundo semestre, estamos tendo paradas como a da Volkswagen”, lamentou o analista. 

Gustavo Harada, sócio e chefe de mesa de renda variável da Blackbird Investimentos, vai na mesma linha. “A questão dos semicondutores ainda continua bastante impactada e vai postergar a retomada do setor automotivo”, ele disse à Agência TradeMap. 

E daqui para frente?

A situação, pelo menos por enquanto, não dá sinais de que tende a melhorar.

A Agência TradeMap procurou a Anfavea, associação das fabricantes de veículos, para saber se o congestionamento na China já piorou a produção de veículos no Brasil. A associação disse que os efeitos não foram sentidos, mas que, se o problema se prolongar na Ásia, certamente haverá um impacto negativo nas fábricas brasileiras. Sozinhas, China e Taiwan respondem por 70% da produção de chips no mundo. 

Apesar do congestionamento em Xangai, o preço do frete marítimo tem caído, de algo em torno de US$ 10 mil por container para algo entre US$ 4 mil e US$ 5 mil, segundo o consultor Leandro Carelli Barreto, sócio da Solve Shipping Intelligence. 

De acordo com ele, a diminuição ocorre em um momento de queda da demanda brasileira por importados. Com a economia do país estagnada e o dólar mais caro, os importadores têm “tirado o pé” e estão se valendo dos estoques que construíram. 

“Só umas duas ou três semanas depois do porto voltar ao normal é que vamos saber o peso de cada fator: a desaceleração da economia, o excesso de estoque ou a quebra da oferta na China”, afirma o consultor, em entrevista à Agência TradeMap. 

Na avaliação de Wolf, da Meraki, as empresas mais ligadas ao segmento de veículos leves são as mais expostas a uma piora do cenário, como as locadoras de automóveis, uma vez que os carros costumam depender mais de semicondutores, em comparação a caminhões e ônibus. 

Entre as companhias que devem atravessar melhor esse momento, ele cita a Vamos, de aluguel de caminhões, e a Fras-le, fabricante de autopeças, que atua com mais força no mercado de reposição e, portanto, é menos sensível à produção de veículos novos. “Na pandemia, por exemplo, com a alta do mercado de seminovos, foi até bom para a empresa”, ele diz. 

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