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Empresas como Mobly (MBLY3) e Enjoei (ENJU3) sofrem duplamente com juros e lucro fica para depois; entenda

Selic mais alta tira apetite para consumo e ainda diminui o interesse do investidor por empresas ligadas a tecnologia

Foto: Shutterstock

Há dois segmentos da economia que são especialmente sensíveis ao aumento dos juros: as empresas do varejo e as de tecnologia. Enquanto as primeiras são afetadas pela menor demanda por crédito, que diminui o poder de compra das pessoas, as segundas, que costumam levantar recursos entre investidores para tocar seus negócios, enfrentam mais dificuldades para atrair capital, uma vez que juro mais alto significa risco maior.

Se a situação fica complicada para quem faz parte de um dos dois segmentos, imagine para quem tem um pé em cada um. É o que acontece com as companhias que atuam no chamado e-commerce, seja as que têm uma operação 100% virtual, como o brechó online Enjoei (ENJU3), ou que as começaram no comércio eletrônico e depois passaram a ter também lojas físicas, como a Mobly (MBLY3) e a Westwing (WEST3).

Não por acaso, desde o início do ano, com o consumidor mais cauteloso e a escalada dos juros, estas três empresas têm visto as suas ações derreterem na Bolsa. O papel da Enjoei acumula queda de 55%, enquanto a Mobly recua 47% e a Westwing tem baixa de 28%.

O principal motivo para que o investidor olhe para essas companhias com pé atrás é a ausência de lucro. Todas as três fizeram o IPO há menos de dois anos e, desde então, nenhuma conseguiu sair do prejuízo.

No primeiro trimestre deste ano, por exemplo, o período mais recente com balanços divulgados, a Enjoei teve prejuízo de R$ 31 milhões; a Mobly anotou perdas de R$ 25,9 milhões; e a Westwing registrou resultado negativo de R$ 16,7 milhões.

Com o balanço no vermelho, estas empresas precisam se provar lucrativas para gerar interesse dos investidores. Em um cenário de juros mais baixos, a vida fica um pouco mais fácil, porque as companhias conseguem captar recursos no mercado de capitais para financiar expansões e investir em aquisição de clientes, para aumentar a demanda e, em algum momento, gerar lucro.

No entanto, com o crédito mais caro e o consumo sem empolgar, esse momento de virada, rumo ao azul, vai ficando mais distante, acredita a analista Angelica Marufuji, sócia da gestora Meraki Capital. “Se imaginávamos que essas empresas começariam a gerar um caixa em 2024, por exemplo, com esse cenário atual esse prazo pode ter ido para 2026”, ela afirma.

Para as companhias que estão mais ligadas aos segmentos de móveis e eletrodomésticos, como Westwing e Mobly, por exemplo, Marufuji adiciona um outro ponto de atenção.

Ela lembrou que esses produtos tiveram uma demanda mais aquecida em 2020 e em 2021, impulsionada pelo fato de que as pessoas passaram mais tempo em casa, por causa da pandemia, e passaram se preocupar mais com esse tipo de compra. No entanto, esta demanda foi perdendo força e não foi “carregada” para 2022.

A Mobly, por exemplo, que havia apresentado crescimento de 19,6% na receita operacional líquida em 2021 ante 2020, começou os primeiros três meses de 2022 com queda de 9,5% em comparação a igual período do ano passado.

Com o consumo “patinando” e sem gerar caixa, as empresas devem ser mais cautelosas na hora de tomar dívidas. A perspectiva para a frente é vermos as empresas mais racionais no crescimento. Em um cenário de juros baixo, dava para crescer a qualquer custo, pois captar dinheiro por dívida era muito mais barato”, comenta Marufuji. 

Diante desse cenário, ela avalia que essas companhias podem, em algum momento, serem observadas para serem adquiridas por concorrentes. Mas como o ambiente é de cautela e até as grandes companhias do varejo também estão passando por maiores desafios, é improvável que isso aconteça no curto prazo.

Não está fácil para ninguém

No varejo brasileiro, os grandes nomes são Magazine Luiza (MGLU3), Americanas (AMER3) e Via (VIIA3). Embora todas as três tenham uma presença forte no e-commerce, a origem delas é nas ruas, no tradicional varejo físico. E, como são empresas mais consolidadas e já testadas, também têm uma menor necessidade de captar recursos no mercado para manter ou expandir a operação.

Mas não quer dizer que o trio esteja imune ao mau humor do mercado. Do início de 2021 para cá, enquanto a Selic subia a cada reunião do Banco Central (BC), saindo de 2% ao ano para 13,25%, as três grandes empresas, que também sofrem com a menor demanda para o consumo e com o aumento das dívidas, despencaram na Bolsa.

Desde o primeiro movimento de elevação dos juros feito pelo BC em 2021, no dia 18 de março, as ações do Magalu acumulam desvalorização de 88%. No mesmo comparativo, o papel da Americanas tem queda de 73% e o da Via registra perda de 79%.

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No primeiro trimestre deste ano, por exemplo, o Magalu teve um prejuízo de R$ 161,3 milhões, revertendo o lucro de R$ 258,6 milhões que havia registrado no primeiro trimestre de 2021.

De acordo com a companhia, o prejuízo foi consequência principalmente das despesas financeiras, que aumentaram 254,6% na mesma base de comparação, para R$ 558,5 milhões. O aumento foi causado justamente pela alta da Selic.

Já a Via apresentou um lucro de R$ 18 milhões de janeiro a março deste ano. Contudo, o montante é 90% menor na comparação com o mesmo período de 2021. A Via atribuiu a queda brusca ao fato de, no primeiro trimestre de 2021, os resultados terem sido beneficiados por R$ 117 milhões em benefícios fiscais de anos anteriores.

Para o analista Gustavo Pazos, da corretora Warren, essas empresas se prejudicam mais entre as varejistas por atuarem com itens discricionários, ou seja, bens que não são 100% essenciais, como são os alimentos, por exemplo.

E a taxa básica de juros deve demorar a trazer algum alívio. Para o analista João Abdouni, da casa de análise INV, a Selic deva ficar na faixa dos 13% por pelo menos mais 12 meses, começando a arrefecer entre o final de 2023 e o início de 2024. “Caso esse cenário se confirme no Brasil, somado a uma alta de juros lá fora nos Estados Unidos e na Europa, o cenário deve seguir negativo para essas empresas”, avalia Abdouni.

Com os juros altos, o analista vê o Magazine Luiza mais bem posicionado que a Via nessa equação. “Isso se deve a uma questão histórica de endividamento. A Via tem mais dívidas enquanto a outra é mais ‘ajeitada’ e tem um histórico melhor. O Magazine Luiza não está num momento brilhante, mas é mais fácil fazer pequenos ajustes lá do que na concorrente”, comenta.

Segundo dados retirados da plataforma do TradeMap, enquanto o Magalu tem R$ 4,92 bilhões em dívida, a Via possui R$ 8,15 bilhões.

Não bastasse tudo isso…

Além do desafio de uma performance positiva em tempos de juros altos, para Gustavo Pazos, analista da Warren, o e-commerce enfrenta um problema mais grave — a entrada de concorrência internacional no Brasil.

Ele lembra que, atualmente, Via, Magalu e Americanas já enfrentam uma concorrência dura com o Mercado Livre (MELI34), e que esse cenário pode piorar para os pares nacionais se Shopee, Shein e Amazon (AMZO34) aumentarem suas operações aqui.

“A Shopee já anunciou que tem intenção de entrar no mercado da América do Sul pelo Brasil. Amazon também é uma empresa forte no mundo: exceto leste asiático e por aqui, ela domina o mercado”, ressalta Pazos.

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Varejistas sentem concorrência estrangeira e têm dificuldade em igualar investimentos

Entre 2020 e 2021, a AWS (Amazon Web Services) investiu R$ 1 bilhão na ampliação de sua infraestrutura de computação em nuvem em São Paulo, alcançando a clientela dos setores público e privado. Em abril deste ano, o Mercado Livre anunciou um investimento de R$ 17 bilhões no Brasil ao longo de 2022. A iniciativa da gigante com origem na Argentina vem na esteira de outros R$ 10 bilhões aplicados no território brasileiro no ano passado.

Nessa briga de preferência do consumidor, Gustavo Pazos vê o Magazine Luiza se prejudicando mais que seus pares, avaliando que a empresa tem perdido mais participação no mercado que as outras nos últimos anos.

Para Angelica Marufuji, a entrada forte da Shein, gigante chinesa de fast-fashion, no mercado brasileiro acabou forçando a Enjoei, que atua majoritariamente com o segmento de vestuário, a investir mais para mitigar o impacto da concorrente chinesa.

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