A surpresa positiva com a criação de empregos formais em agosto entrega cenários distintos. Apesar de reforçar que a desaceleração da economia prevista para o segundo semestre será mais lenta do que o estimado, a queda da geração de postos em relação ao mesmo período do ano passado indica que as atividades já estão perdendo fôlego.
O Brasil criou 278,6 mil postos com carteira assinada em agosto, de acordo com os dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) divulgados nesta quinta-feira (29). O resultado, mais uma vez puxado pelo setor de serviços, veio acima do esperado pelo mercado, de 268 mil empregos.
A alta do mês foi liderada pelos serviços – o setor com mais peso no PIB (Produto Interno Bruto) -, que abriu 141,1 mil vagas. O setor industrial aparece na sequência, com 52,7 mil postos, seguido pelo comércio (41,8 mil), construção (35,1 mil) e agricultura (7,7 mil).
Os números também mostraram aumento de 25% em comparação com julho (221,3 mil, segundo números revisados). Na base anual, porém, o mercado de trabalho registrou queda de 28% (388,2 mil).
A despeito de classificar o resultado de agosto como excelente, Hélio Zylberstajn, professor sênior da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA-USP), pontua que a diferença de quase 110 mil postos em 12 meses é forte sinal de desaceleração das atividades.
A perda de fôlego é reflexo do aumento dos juros imposto pelo Banco Central (BC) para domar a disparada da inflação. Entre março de 2021 e agosto deste ano, a autoridade monetária aplicou 11,75 pontos na Selic, elevando a taxa básica para 13,75% ao ano.
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Caged: Brasil cria 278 mil vagas com carteira em agosto, acima do esperado pelo mercado
Na semana passada, o BC indicou o fim do ciclo de alta, mas reforçou que os juros devem ficar elevados por mais tempo que o previsto.
“O crescimento que tivemos na taxa de juros começa a fazer efeito e afetar alguns setores. O crédito começa a sentir o preço do dinheiro, e comprar a prazo fica mais caro. Isso reduz o ritmo de crescimento da economia e reflete no mercado de trabalho”, explica Zylberstajn.
Desaceleração mais lenta
O salto de 25% na comparação com julho, porém, indica resiliência da economia no terceiro trimestre, após a alta de 1,2% do PIB nos três meses anteriores. Apesar de ainda esperarem pela perda de ritmo da atividade nos próximos meses, analistas do mercado reconsideram as previsões e veem uma desaceleração mais lenta que o previsto.
A melhora das expectativas, porém, não é sustentada em avanços estruturais, mas sim na queda brusca da inflação observada desde julho após o governo federal intervir na tributação de combustíveis, energia elétrica, entre outros itens.
Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos, destaca que o cenário é pontual e que outros dados do Caged inspiram cautela. A especialista chama a atenção para a diferença do salário de admissão contra o de demissão. Em agosto, os novos trabalhadores entraram recebendo 1.949,84, enquanto os demitidos saíram com R$ 1.991,34.
“Vemos que renda real do novo trabalhador está menor que o trabalhador demitido, ou seja, é algo com o que se preocupar já que o brasileiro vai ganhar menos”, diz.