Com a queda dos preços dos ativos nas bolsas internacionais e a alta do dólar frente ao real, os fundos listados em Bolsa (ETFs, ou Exchange-Traded Funds) voltaram a ser uma opção interessante para os investidores brasileiros buscarem exposição a ativos internacionais.
Esse cenário é válido principalmente quando considera-se a perspectiva de aumento de volatilidade no mercado local com as eleições à frente.
Diferentemente do primeiro trimestre, em que a valorização do real frente ao dólar intensificou as perdas em ativos com exposição cambial, a alta de mais de 10% do dólar em junho ajudou a amortecer e em alguns casos até turbinou o retorno dos investimentos em ETFs.
A avaliação de especialistas é que essas aplicações passam por um momento interessante. Isso porque o cenário é de menor potencial para a queda da moeda americana diante das incertezas no mercado externo (alta de juros nos EUA e risco de recessão global) e preocupações com o risco fiscal e eleições no Brasil.
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Mas o cenário ainda é de volatilidade, e novas correções nas bolsas globais não podem ser descartadas. Apesar disso, analistas apontam que a diversificação da carteira, com a alocação em ativos no exterior, traz maior proteção para enfrentar a volatilidade no mercado.
Só neste ano, o número de investidores em ETFs ligados a ações no exterior cresceu 9,40% no primeiro semestre, para 419 mil, representando 68% do total de 635 mil investidores em fundos de índices na B3.
As empresas brasileiras representam apenas 1% do mercado acionário global. Além da diversificação geográfica, esses fundos oferecem a possibilidade de investir em setores específicos que não existem no Brasil.
Queda torna ativos mais atrativos
A queda dos principais índices acionários internacionais – como a do S&P 500, dos Estados Unidos, que amargou a maior perda em 52 anos no primeiro semestre, tornou os ativos internacionais mais atrativos.
“Já houve uma correção importante dos múltiplos das bolsas americanas [após baterem recorde em 2021], mas não significa que não teremos mais quedas, porque o cenário global ainda é de muita incerteza com o ciclo de alta de juros nos EUA”, diz Paloma Brum, analista da Toro Investimentos.
Por isso, a analista da Toro afirma que o ideal é o investidor ir comprando aos poucos ETFs atrelados às bolsas americanas. A ideia é que isso seja feito de forma gradual, já que é difícil identificar qual é o momento exato da virada de mercado.
Para o estrategista-chefe da Avenue Securities, William Castro Alves, o mercado de ações já antecipou boa parte do ciclo de alta de juros nos EUA e risco de recessão, com os setores de tecnologia, consumo cíclico e imobiliário acumulando quedas de 25%, 30% e 20%, respectivamente.
“Estudos mostram que os períodos de baixa do S&P duram em torno de 11 meses, e já temos sete meses de correção. Para o investidor com horizonte de longo prazo, de dois a três anos, há oportunidade”, diz Castro.
Segundo Brum, a bolsa americana tem chance de se recuperar primeiro que outros mercados acionários, como Europa e China, já que historicamente tem uma economia mais pujante, próxima do pleno emprego. Mas o ritmo da recuperação vai depender da política monetária do Federal Reserve (o banco central americano).
A analista da Toro lembra que o risco de recessão hoje é maior na Europa, que enfrenta o problema de inflação elevada e risco de redução de fornecimento de gás da Rússia. Esses fatores devem ter impacto negativo sobre o crescimento.
Já na China, a adoção de uma política de Covid-19 zero tem provocado volatilidade no mercado acionário chinês diante do frequente risco de novos lockdowns e consequente impacto na produção chinesa. “O governo chinês lançou um pacote de medidas de estímulo ao setor de infraestrutura, mas é um mercado mais volátil”, diz Brum.
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Para quem quer ter exposição ao mercado acionário americano, a analista da Toro recomenda a compra dos fundos de índice IVVB11 ou o SPXI11, que buscam refletir a performance do índice S&P 500.
O ETF IVVB11 é o maior fundo de índice negociado na Bolsa brasileira, com 170.594 investidores em junho, e tem maior concentração nos setores de tecnologia – como Apple (AAPL34), Microsoft (MSFT34) e Alphabet (Google, GOGL34) – saúde e financeiro.
Para quem está começando a investir em ETFs internacionais agora, o analista de portfólios e advisory do Inter, Pedro Albuquerque, indica dois ETFs para se ter na carteira: um que siga o S&P 500 e um de fundos imobiliários americanos REITs (sigla em inglês para Real Estate Investment Trust).
Os REITs correspondem a empresas listadas em bolsa no exterior que possuem ativos imobiliários sob gestão. “Normalmente os REITs têm uma volatilidade menor que a das ações em Bolsa, porque distribuem rendimentos mais frequentemente”, diz Albuquerque.
Há na B3 dois ETFs de REITs: o ALUG11, que segue o ETF VQN Vanguard Real Estate, e o ETF URET11, que replica o índice FTSE Nareit Equity REITS Index.
China e ouro
Já a Genial Investimentos recomenda a alocação em dois ETFs internacionais, o XINA11, com exposição à bolsa chinesa, e o GOLD11, atrelado ao ouro.
Apesar da queda de 5,33% do metal precioso no ano, esse é um ativo que pode oferecer proteção em momentos de crise, afirma Filipe Villegas, estrategista da Genial Investimentos.
Já o ETF XINA11 liderou os ganhos em junho, com alta de 19,5%. A aplicação tem grande concentração em empresas de tecnologia chinesas como Tencent e Alibaba (BABA34), setor que passou por aperto da regulação do governo chinês recentemente.
Apesar do investimento ter tido um bom desempenho no mês passado, Villegas afirma que a situação do mercado chinês ainda é muito incerta e que, por isso, o ETF XINA11 é mais indicado para um investidor com perfil mais agressivo, que busca ganhar com eventual repique da bolsa chinesa.
Veja abaixo os ETFs de ativos internacionais mais recomendados pelos analistas:
Fonte: Genial Investimentos, Toro Investimentos, Itaú Corretora, Avenue e Inter | ||
ETFs | Segmento | Variação no ano |
IVVB11 e SPX11 | Ações (S&P500) | -23,82% e -23,09% |
ALUG11 e URET11 | REITs | -23,99% e -5,80 |
XINA11 | Ações (MSCI China) | -19,21% |
GOLD11 | Ouro | -8,30% |
HTEK11 | Ações (Healthcare) | -13,61% |
EMEG11 | Ações (MSCI Mercados Emergentes) | -22,22% |
Investimentos em novas tecnologias
Além da diversificação geográfica, o investidor brasileiro pode ter exposição a tecnologias do futuro que não estão presentes na Bolsa doméstica através do investimento em fundos de índice e BDRs (Brazilian Depositary Receipts, que são recibos de ativos listados no exterior negociados na B3) de ETFs internacionais.
Após a forte quedas das ações de tecnologia, mais sensíveis ao aumento de juros, os analistas já começam a ver oportunidades em alguns segmentos que têm alto potencial de crescimento, como cibersegurança, biotecnologia, transição energética e carros elétricos.
Da mesma forma, o segmento de biotecnologia também é um setor interessante para os investidores brasileiros que buscam oportunidades de investimento lá fora, afirma Castro.
Na B3, há o ETF HTEK11, que acompanha ações de empresas com maior exposição aos temas de biotecnologia, neurociência e medicina e que subiu 11,4% em junho.
“Os ETFs de empresas de biotecnologia tiveram alta forte com a busca por vacinas e depois sofreram uma correção, após atingirem as máximas em 2021. Alguns já voltaram ao patamar da pandemia e essas empresas vão continuar liderando a inovação”, diz Castro.
Veja abaixo a lista de BDRs de ETFs recomendados pelos analistas.
BDRs de ETFs | Segmento | Variação no ano |
BOTZ39 | Ações (Robótica) | 10,54% |
BURA39 | Ações (Urânio) | -15,28% |
BICL39 | Ações (Energia limpa) | -12,38% |
BDRI39 | Ações (Carros elétricos) | -4,59% |
BIAU39 | Ouro | -7,87% |
BIYT39 | Renda fixa (segue índice composto por papéis do Tesouro americano, Treasuries, com prazos de 7 a 10 anos | -4,79% |
Fonte: Corretoras |
Quanto investir em ETFs
Como a maior parte dos ETFs de ativos internacionais são de renda variável, a analista da Toro destaca recomenda uma alocação de até 5% da carteira em ETFs internacionais para os investidores que têm um perfil de risco balanceado ou moderado e de até 6% para aqueles com perfil agressivo.
Já o estrategista da Genial recomenda, dentro da alocação em ETFs de renda variável, uma exposição de 60% a fundos de índices de ativos locais (como o DIVO11, de dividendos, e o BOVA11, que segue o Ibovespa) e 40% em ETFs internacionais, vendo mais oportunidade atualmente na Bolsa brasileira que no exterior.
O analista do Inter acredita que a pressão de alta do dólar deve continuar, dado o cenário de eleição polarizada e maior volatilidade esperada. Na avaliação dele, para quem já tem ETFs de ativos internacionais em carteira, não é hora de vender. Para quem não tem, é importante diversificar a alocação e ter um pedaço do portfólio nesses ativos.