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Fotos dos Colunistas Professor Giacomo

Por Giácomo Diniz

Colunista de ações da Agência TradeMap

Graduado em Economia pela FEA-USP e com MBA pela FIA, trabalha e investe no mercado há mais de 20 anos. Atua como professor de finanças e investimentos em instituições como B3 Educação, FIA, Apimec, Saint Paul e Ibmec e como consultor para gestão de grandes fortunas e fundos de pensão. Publica conteúdo financeiro no YouTube  do TradeMap.

Alta de juros nos EUA: uma tragédia financeira?

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Os mercados financeiros foram surpreendidos, de certa forma, na semana passada, com o resultado do índice de preço ao consumidor americano (CPI) referente a janeiro deste ano. A inflação do varejo nos Estados Unidos subiu alarmante 0,6% no mês, depois de ter tido elevação também de 0,6% em dezembro. Em 12 meses, o índice acumulou alta de 7,5%, o maior avanço anual desde 1982 − ou seja, em 40 anos.

Por que devo dar atenção a isso?

A inflação tem sido um tema recorrente na mídia nos últimos meses, pois é uma realidade comum a vários países nesse período pandêmico. Entre os fatores apontados para o fenômeno, estão a alta das comodities, o estresse da rede global de suprimentos e um efeito colateral dos auxílios emergenciais que injetaram alguns trilhões de dólares nas economias mundo afora.

Esse processo inflacionário tem pressionado os bancos centrais a aumentarem os juros. O Federal Reserve, dos Estados Unidos, é um deles. E é aí que a coisa complica.

Já faz mais de uma década que os EUA estão com a sua taxa básica de juros muito baixa, próxima de zero. Um ambiente de dinheiro farto que favoreceu a valorização tanto as ações quanto os imóveis no país.

A lógica desse movimento pode ser colocada da seguinte forma: como o juro estava muito baixo, o investidor assumiu mais risco comprando ativos e tudo se valorizou.

Agora que a inflação voltou fortemente ao radar, investidores começaram a fazer conta. Uma elevação mais forte da taxa básica americana poderá, nos próximos meses, forçar uma mudança nos fluxos de capital e, com isso, as bolsas poderão sofrer mais.

Como isso vai afetar os investimentos no Brasil?

Na verdade, já afetou! Como o Brasil também está com a inflação elevada, o Banco Central teve que elevar a Selic de volta ao patamar de dois dígitos. É esse movimento visto aqui que começa a acontecer nas economias maduras.

Com a alta da taxa de juros americana, os investimentos internacionais mais conservadores ficarão mais atrativos. No novo cenário, o investidor global passa a ser mais seletivo na escolha de economias para investir.

Por que esse fenômeno ocorre?

Hoje, o prêmio de risco Brasil, por exemplo, é de aproximadamente 3,00% (300 pontos-base), ou seja, a dívida brasileira, negociada em dólares americanos, paga esse percentual a mais para o investidor que deseja assumir o risco de crédito brasileiro. Na prática, se um título americano está pagando 2,00%, o do Brasil tem que pagar 5,00% devido ao seu risco de inadimplência.

O aumento da taxa básica de juros nos EUA reflete imediatamente no custo do dinheiro para os países emergentes. Seguindo o raciocínio anterior, se agora o título americano paga 5,00%, mantido o risco país, o Brasil terá que pagar um custo financeiro de 8,00% pelo capital.

Países como o Brasil e Turquia podem não ser capazes de pagar esse custo financeiro, ficando inadimplentes. Esse fenômeno foi visto no início dos anos 1980 quando o Fed teve que puxar a taxa abruptamente.

Conhecendo essa dinâmica, os investidores mais experientes ficam mais cautelosos em investir em países com rating (nota de crédito) inferior em momentos de juros altos nos EUA.

Cabe salientar que sempre existiram investidores especialistas em Brasil dispostos a correr os riscos necessários para o atingimento de suas metas. Fica menos provável, porém, a ocorrência de uma avalanche de recursos para o mercado brasileiro como visto na história recente do país.

Quando o Fed vai iniciar o processo de elevação da taxa?

Os últimos dados do CPI mudaram completamente o tom dos membros do comitê de política monetária do Federal Reserve. No momento do fechamento desse artigo, em fevereiro, já se falava em uma alta de 0,5 ponto porcentual da taxa de juros na próxima reunião do colegiado, em março. O aumento seria espantoso, dado o conservadorismo da instituição.

Nessa discussão, é importante lembrar que os Estados Unidos detêm o maior mercado de dívida do mundo. A maioria das reservas internacionais dos países é investida em títulos da dívida americana.

Os ativos negociados são preponderantemente prefixados, tornando esse mercado muito sensível à variação da taxa de juros. Dentre os títulos transacionados, o Treasury de dez anos é o mais líquido.

Nos últimos dias, a taxa desse título do Tesouro americano bateu o maior nível em mais de dois anos.

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Estamos falando de um movimento no mercado mais líquido do mundo, em que a variação de 0,01% no valor de mercado dos títulos públicos pode desintegrar bilhões de dólares.

E esse é o caso. Sempre que a taxa aumenta, papéis prefixados ficam menos interessantes e seu valor de mercado cai até que a taxa interna de retorno volte a ficar atrativa. Isso mesmo! A alta da taxa de juros é igual à queda do valor do título e a prejuízo para os investidores de renda fixa americanos.

E quanto maior o prejuízo, menor é a quantidade de dinheiro disponível para investimentos!

Podemos considerar esse movimento uma tragédia financeira?

Não, claro que não! O que dissemos aqui é que, neste momento, está acontecendo uma mudança estrutural nos mercados internacionais e, por conta disso, nem todas as fórmulas de investimento que funcionaram até agora vão dar certo no futuro próximo.

Essa acomodação se faz necessária devido à própria natureza cíclica da economia. O que está acontecendo agora foi visto em 1982. Naquele tempo, o banco central americano teve que aumentar os juros, e os mercados foram obrigados a lidar com isso.

Os EUA lutavam contra uma inflação resiliente, consequência de uma política monetária mais frouxa adotada nos anos 1970. À medida que o Fed foi aumentando os juros, vários setores tradicionais da economia quebraram devido à concorrência com artigos importados. E as bolsas caíram para os menores patamares históricos dos últimos anos.

Curiosamente, contudo, o ano de 1982 é lembrado como o início de um bull market (quando o mercado está aquecido, em trajetória de alta) que se estendeu até 1987. Saliento isso porque esse processo acabou se tornando uma oportunidade para os investidores.

Então não vou perder dinheiro?

Depende. Na renda fixa brasileira, o retorno já melhorou e tem muito CDB (Certificado de Depósito Bancário) pagando taxa acima de 15% ao ano. Já as aplicações em Bolsa poderão passar um tempo de lado, mais voltadas para a estabilidade, devido à redução do interesse por esse tipo de ativo – isso não quer dizer, claro, que o investimento está livre de risco.

Mas mesmo na Bolsa há muita ação que se beneficia desse cenário internacional, com os altos preços de commodities e alimentos. Então, vale aquela máxima: cada investidor tem que ter consciência do que está fazendo e recalibrar suas posições conforme o cenário.

*As opiniões, informações e eventuais recomendações que constem dos artigos publicados pela Agência TradeMap são de inteira responsabilidade de cada um dos articulistas. Os textos não refletem necessariamente as posições do TradeMap ou de seus controladores.

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