O novo governo quer reindustrializar o país, apoiar pequenas e médias empresas, reduzir o endividamento das pessoas e retomar o Minha Casa, Minha Vida. São todas políticas que em algum grau contam com a participação dos bancos públicos. Em meio a esse cenário, o que dá para esperar dessas instituições?
A primeira memória que ocorre é quando Banco do Brasil (BBAS3) e Caixa Econômica Federal, no segundo semestre de 2012, foram utilizados para induzir uma redução de juros ao consumidor. Já o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) escolhia os “campeões nacionais”.
Dez anos depois, no entanto, as condições macroeconômicas e políticas são diferentes, o que pode limitar o uso dos bancos públicos como um indutores do consumo e crescimento.
Limitar, porém, não significa que eles serão deixados de lado na definição de políticas com este objetivo.
O vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), afirmou, ao assumir o Ministério do Desenvolvimento, que esperava o fortalecimento do BNDES e uma redução dos juros.
Até 2017, o BNDES trabalhava com a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), que era estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e embutia um subsídio ao tomador.
No entanto, a partir de setembro de 2017, entrou em vigor a lei que criou a TLP (Taxa de Longo Prazo), que é mais próxima às taxas de mercado e atualmente está em IPCA + 5,93% ao ano.
Isso contribuiu para que as empresas reduzissem a dependência do BNDES e fossem buscar mais financiamentos no mercado.
Levantamento do Cemec (Centro de Estudo de Mercado de Capitais) da Fipe mostra que, em setembro de 2022, as fontes de mercado respondiam por 80% dos recursos das dívidas das empresas (crédito bancário e mercado de capitais). Em 2016, esse percentual era de 61%.
Já os desembolsos do BNDES para grandes empresas caíram, nesse período, de 69,1% para 54,2% do total, mostrando que o banco de fomento está atendendo mais as pequenas e médias empresas.
Bancos e o cenário pior para os juros
Mas o recorte temporal também mostra que quando a TLP foi criada, a taxa de juros no país estava em queda, o que ajudou a baratear as captações de mercado. Agora, a taxa Selic está em 13,75% ao ano e não há muita clareza sobre quando irá começar a cair.
Na avaliação de Fabricio Winter, consultor especializado em setor financeiro na Boanerges & Cia, o BNDES pode ampliar o papel de fomento a esse segmento de empresas, o que implica em algumas mudanças.
“É possível que se crie novas linhas para atender as empresas de menor porte. Isso pode trazer um maior risco (de inadimplência) ao banco, mas há o benefício do lado econômico”, diz.
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Winter lembra que o modelo de concessão do BNDES é baseado em um sistema de garantias que nem sempre é compatível com a realidade das empresas de menor porte, e por isso a mudança poderia ser flexibilizada.
“É possível absorver esse risco para atender alguns nichos. Mas isso não é possível no curto prazo. É preciso testar e corrigir a rota aos poucos”, avalia, justamente para afastar os problemas do passado.
Para Winter, o fomento pelo BNDES permitiria ainda uma pressão inflacionária menor por lidar com estímulos à produção, diferente dos demais bancos públicos, que possuem uma presença maior no crédito ao consumo.
Caixa e BB
Para Julio Hegedus Neto, economista-chefe da Mirae Asset, induzir Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil a uma redução de juros levaria, neste momento, à piora nas expectativas, dificultando ainda mais a condução da política monetária.
“Não acredito que fariam isso. No atual contexto, isso levaria a uma inadimplência ainda maior lá na frente. O cenário precisa desanuviar para uma medida de tentativa de elevar a oferta de crédito”, diz.
Por desanuviar, entende-se uma política gastos públicos que dê margem para o início da redução da taxa Selic.
E enquanto não há uma definição do que os bancos públicos vão de fato fazer para atender aos projetos do novo governo, o BB é o que mais reflete a avaliação dos agentes do mercado financeiro – por ser o único de capital aberto.
Nos primeiros quatro pregões do ano, as ações do BB têm queda de 0,46%, mas só na terça-feira chegaram a cair quase 2%.
“A performance negativa do BB reflete uma expectativa de intervenção nas estatais. O mercado sente isso mesmo sem saber de fato os reais fatos, já que a história recente é ruim, com deterioração do valor da companhia”, avalia Enrico Cozzolino, head de análise e sócio da Levante Investimentos.