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Sustentável? Índice de empresas ESG cai quase três vezes mais que o Ibovespa em 2022

ISE recua 13,5% no ano com fuga de investidores com busca de investidores por proteção em meio às pressões internas e globais.

Foto: Shutterstock

O Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da B3, que inclui empresas comprometidas com práticas mais sustentáveis, compromisso com ações sociais a políticas de governança mais transparentes – a chamada agenda ESG – amarga perdas mais intensas que o Ibovespa em 2022 – tendência diferente da observada nos últimos anos.

Enquanto o principal índice da Bolsa brasileira acumulou perdas de 4,3% em 2022 até a última sexta-feira (8), o ISE caiu 13,5%. A variação destoa dos resultados observados em anos anteriores, quando os índices percorreram trajetórias mais parecidas.

PERÍODO VARIAÇÃO IBOVESPA VARIAÇÃO ISE
2018 +15,03% +9,9%
2019 +31,6% +33,2%
2020 +2,9% +0,3%
2021 -11,9% -11,6%
2022 -4,3% -13,5%

A queda dos dois índices em 2022 ano reflete principalmente a disparada da inflação, que levou as principais economias do mundo a retirarem estímulos à atividade e a aumentarem os juros para conter a alta dos preços.

Este movimento, no entanto, gerou um receio crescente com a possibilidade de uma recessão, o que levou à fuga dos investidores de ativos mais arriscados, como bolsas, para a segurança da renda fixa.

Os que mantiveram posições no mercado acionário se voltaram a setores e empresas com um modelo de negócios mais consolidado e a companhias que ofereciam mais chance de lucro rápido.

“Os investidores visam o lucro e empresas que pagam bons dividendos, estruturadas e com bom potencial de valorização”, explica Kaue Franklin, especialista em renda variável da Aplix Capital. “O Ibovespa possui empresas grandes e consolidadas, que tiveram um bom momento neste semestre, enquanto o ISE possui empresas menores e que sofreram mais com este cenário.”

As ações vinculadas às commodities se saíram melhor, com destaque para papéis de petrolíferas, que viram os lucros disparar com a valorização do barril de petróleo em consequência da guerra na Ucrânia.

Isso ajuda a explicar, em parte o desempenho menos negativo do Ibovespa – quase um quarto do índice é composto por duas gigantes do setor de matérias-primas: a Vale (VALE3) e a Petrobras (PETR4).

“O Ibovespa possui muitas empresas de commodities, um dos setores que não teve uma queda expressiva nesse começo do ano”, afirma Laura Vélez, head de ESG na Fama Investimentos. 

Diferentemente de Franklin, ela acredita que a queda do ISE não passa pelo tamanho das empresas, já que o índice possui participação de grandes nomes do mercado, como Eletrobras (ELET3) e Braskem (BRKM5). 

Para a especialista, o tombo maior reflete a mudança da percepção de retorno de investidores que não são comprometidos com a causa ESG. “Quem vê sustentabilidade como estratégia não vai vender as suas posições pelo fato de estar caindo [agora].” 

Carteiras distintas 

 O Ibovespa possui 90 empresas listadas, mas um quarto do peso está concentrada na Vale (VALE3), com 15% de relevância, e nas ações da Petrobras. As preferenciais (PETR4) somam 7% do índice, enquanto as ordinárias (PETR3) detêm 4,5%.

Já o ISE conta com 48 companhias que se voluntariaram para passar pelo crivo da B3 em questões como melhores práticas de sustentabilidade corporativa, social e ambiental.

Os papéis das Lojas Renner (LREN3) possuem a maior fatia no índice, de 3,3%, seguidos pelas ações da BRF (BRFS3), com 3,1% do total.

Porém, enquanto as ações da VALE3 e PETR4  apresentaram saldo positivo nesta primeira metade do ano, com destaque para a alta de 22,4% de valorização da petrolífera, as ações da Renner, líder do ISE, tiveram alta de 2,5%, enquanto as da BRF, segunda maior influência no índice, caíram 30,3%.

“O Ibovespa possui um movimento mais cíclico, com as empresas que concentram maior participação se saindo muito bem neste momento”, diz Kristian Lee, analista sênior de research na Warren.

Longo prazo

Apesar da disparidade no primeiro semestre, analistas acreditam que a diferença diminuirá ao longo dos próximos anos. Uma das forças deve vir da desaceleração das commodities com os riscos de recessão econômica na maior parte do globo, o que deve frear a demanda.

Lee diz que investimentos em ações de empresas com agenda ESG são avaliados para o longo prazo. Apesar da queda do ISE, ele destaca que a pauta de sustentabilidade – em todos os campos -, tende a ser cada vez mais incorporada pelo mercado nos próximos anos, como já ocorre nos Estados Unidos e na Europa.

“Empresas de commodities a longo prazo também vão se juntar ao ESG, já que não é apenas uma questão ambiental”, afirma. “No fim das contas, o lucro é importante, mas para ter lucro, a empresa precisa de estrutura, muitas vezes de governança. Esta visão já está acontecendo.”

Na mesma linha, Vélez cita que o momento atual está trazendo muitas perdas para as companhias, mas que, ao mirar um horizonte mais longo, a tendência é de reversão deste cenário. 

“Os papéis estão desvalorizados, mas são empresas que temos certeza que vão valorizar em algum momento de novo e elas terão o valor de mercado que merecem”, afirma. 

Por outro lado, as análises apontam que os papéis das empresas que caíram já estão “muito baratos” e não devem encontrar novas brechas para novos tombos.

“As empresas menores já sofreram muito, então mesmo que haja uma movimentação perigosa com possível recessão americana, não tem espaço para as ações caírem”, afirma Franklin.

Cautela com empresas

Apesar de reconhecerem a importância do ISE como referência para empresas que se pautam na cartilha ESG, analistas afirmam que é preciso enxergar o índice com uma pitada de cautela.

O motivo é que, dentro da carteira, há companhias com históricos negativos em pontos de governança, como casos de corrupção, e ambientais.

A Vale, empresa que está ligada a dois dos maiores desastres ambientais do Brasil nos últimos anos, fazia parte do índice em 2019, ano em que um deles ocorreu – o desmoronamento de uma barragem de rejeitos em Brumadinho (MG).

“Muitas empresas que o ISE pontua são por questões de compromisso, e não necessariamente por desempenhos e resultados”, diz Vélez, ponderando, no entanto, que a avaliação “tem melhorado bastante”.

Franklin chama a atenção pela falta de transparência de algumas empresas como um fator que leva à descrença dos investidores com a eficácia do ISE.

“Alguns gestores e analistas começaram a perder a credibilidade no índice por não concordar com empresas que estão lá, sobretudo com envolvimento em corrupção, o que foge um pouco da linha do índice”, afirmou.

Mudança de apetite

Se em momentos de maior liquidez os investidores estavam dispostos a pagar uma espécie de cupom por empresas menores, o atual cenário negativo e forte incerteza aumentou a seletividade.

Com menos propensão a aventuras, explica Bernard Faust, sócio e operador da mesa de renda variável da One Investimentos, as empresas com porte reduzido, como as que fazem parte do índice de sustentabilidade, tendem a ser penalizadas.

“Assim como o apetite ao risco em um ambiente expansionista era maior para o ISE, o investidor reduziu o apetite para a sustentabilidade agora que o cenário ficou menos estimulativo”, explica.

A perda de força é a mesma que trouxe o Ibovespa e as principais bolsas globais para baixo no primeiro semestre de 2022, assim como outros mercados ainda mais arriscados, como as criptomoedas.

A “tempestade perfeita” é formada pela disparada da inflação em nível global somada aos entraves na produção de commodities, sobretudo energéticas, metálicas e grãos, com a guerra na Ucrânia.

O cenário também é composto pela quebra da oferta de bens com o desarranjo das cadeias de produção na China, um problema que vem desde a eclosão da pandemia e se manteve nos últimos meses com o fechamento de cidades inteiras com base na lei de “Covid Zero” imposta por Pequim.

Diante da disparada dos preços, bancos centrais em todo o mundo correram para subir juros. O movimento gerou tensão nos mercados pelo risco de recessão, visto que a alta das taxas básicas incide diretamente sobre o desempenho das economias.

No Brasil, o que é ruim fica ainda pior com os avanços do governo federal contra o compromisso fiscal, o que aumenta a expectativa de inflação e demanda mais aumento de juros pelo Banco Central, aliado a um quadro de turbulência política com a aproximação do período eleitoral.

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