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O “mais do mesmo” que dá certo: Por que a Cury (CURY3) é uma das queridinhas do mercado

Companhia aposta em imóveis acessíveis em bairros nobres de São Paulo e Rio de Janeiro

Foto: Shutterstock

Depois de um período difícil para o setor de construção civil, as ações da Cury (CURY3) somam valorização de 53% desde o início deste ano. O avanço na cotação está acima da média de 10% anotada, no mesmo período, por suas principais concorrentes no segmento de incorporação voltada à baixa renda: Direcional (DIRR3), MRV (MRVE3) e Plano & Plano (PLPL3).

E, mesmo com o rali recente, que poderia tornar as ações menos atrativas, a Cury segue ocupando a posição de queridinha do mercado. De acordo com dados da Refinitiv, disponíveis no TradeMap, todas as sete instituições financeiras consultadas recomendam a compra do papel.

Esse otimismo vem do histórico de resiliência da companhia, de acordo com analistas ouvidos pela Agência TradeMap. Desde seu IPO, ocorrido em setembro de 2020, quando a taxa básica de juros já tinha iniciado o ciclo de elevação atual – bastante prejudicial para o setor -, a Cury tem conseguido manter bons números de lançamentos, vendas, velocidade de vendas (VSO) e margem bruta.

Repasse de custos

Mas o que mais chamou a atenção do mercado, na visão de Ronaldo Cury, diretor de relações com investidores da construtora, foi justamente a margem bruta. “Todo mundo perguntou como conseguimos fazer isso. E o que ganhou o jogo, que fez com que conseguíssemos preservar as margens, foi aumento de preço”, afirma o executivo.

“A Cury passou pela alta de custos ilesa. Até aqui foi isso. Em um momento superdifícil, conseguiu bater recorde atrás de recorde”, diz Gabriel Guimarães, sócio e analista da HIX Capital.

Ronaldo Cury, da incorporadora, também destaca a velocidade de vendas, que seguiu elevada mesmo com o aumento no preço dos imóveis vendidos. Isso, na análise do executivo, é resultado da estratégia da companhia.

Em primeiro lugar, o diretor de RI aponta a aposta da Cury no desenvolvimento de imóveis de baixo padrão em terrenos considerados premium, localizados em bairros nobres como Barra Funda e Mooca, em São Paulo, e Porto Maravilha e Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro. A localização, de acordo com a empresa, permite elevação de preços sem que as vendas sejam comprometidas.

Por atuar no segmento de habitação popular, porém, os imóveis construídos pela Cury se enquadram na categoria de habitação de interesse social, e a companhia consegue condições especiais junto à Caixa Econômica Federal na compra desses terrenos.

Essa decisão estratégica, conta Cury, vem desde a criação da companhia, em 1963. “A empresa continua na mesma trilha, fazendo mais do mesmo”, afirma, em referência à aposta no crédito associativo, programa da Caixa Econômica Federal em que a construtora é responsável pela obra, enquanto a Caixa atua no financiamento. Ou seja, a Cury constrói os imóveis quase sem tirar dinheiro do bolso.

Esse modelo de negócios, segundo Guimarães, da HIX, foi um dos principais motivos que fez a gestora começar a investir na Cury há pouco mais de um ano. “O modelo de negócios que a companhia tem, de vender muito rápido e repassar rápido, faz com que consigam construir sem alocar capital. Tudo o que lucra vira caixa. Então , tem um ROE (retorno sobre patrimônio) muito alto e pagam muito dividendo”, afirma o analista.

Antecipando tendências

A resiliência da Cury durante o ciclo de elevação nas taxas de juros também vem de um movimento estratégico, adotado pela companhia quando a gestão identificou que a situação do Casa Verde e Amarela (CVA) poderia mudar.

Prevendo uma redução nos subsídios dentro do programa habitacional, a Cury decidiu ter foco de atuação nas faixas três e quatro, que compreendem público de renda mais alta. Antes, a companhia atuava principalmente nas faixas um e dois, as de mais baixo padrão.

“O CEO, Fabio Cury, percebeu que haveria uma retração nos subsídios do programa, o que acabou se provando verdade. Com a inflação e a necessidade de subir preços, ficou cada vez mais difícil construir nas faixas um e dois. E a Cury, vendo essa mudança, começou a ir para as faixas mais altas, o que permitiu repassar preços”, explica o analista.

Enquanto os clientes de renda mais baixa sofrem mais, com a inflação prejudicando seu poder de compra, os das faixas mais altas do programa, e também os que têm a possiblidade de obter recursos por meio da linha de crédito Pró-Cotista, um degrau acima do CVA, conseguem suportar eventuais aumentos de preço.

De novo, o “mais do mesmo”

Daqui para frente, a Cury aposta em sua estratégia de “mais do mesmo”, sem planos de expandir para além das regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro, e mantém seu foco no Pró-Cotista e nas faixas três e quatro do CVA.

Isso porque a companhia enxerga um forte déficit habitacional nas regiões em que atua. E, apesar de ser uma das maiores competidoras do setor no país, a participação da Cury no mercado imobiliário das duas cidades, de menos de 5% em São Paulo e inferior a 10% no Rio de Janeiro, ainda é pequena. “Ou seja, dá para dobrarmos de tamanho sem precisarmos ir para novas praças”, afirma Ronaldo Cury.

O diretor de RI diz também que a empresa não tem intenção, pelo menos até 2023, de voltar a atuar nas faixas de renda mais baixas do CVA – mas isso pode se alterar a depender das condições do programa. “Se, eventualmente, derem uma turbinada no programa, pode ser que mude”, afirma o executivo.

Recentemente o governo federal anunciou mudanças no CVA, principalmente em relação a tetos de renda e prazos de financiamento. Ainda que as mudanças sejam positivas, Cury acredita que a principal consequência será ajudar os clientes a suportarem os efeitos de preço que vêm sendo praticados.

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Guimarães concorda: “Ficou tão caro construir que os subsídios deixaram de ser suficientes. Tem sobrado orçamento. Então muito dos ajustes vieram para corrigir o poder de compra dos clientes, e não aumentar”, afirma.

Raul Grego, analista da Eleven Financial Research, enxerga as mudanças no CVA como benéficas e aposta na maior atratividade do setor. Nesse cenário, ele acredita que a Cury pode voltar a focar nas faixas mais baixas do programa. “Mas isso não seria uma preocupação. Deve ser viável e manter as margens elevadas”, afirma.

Mais do que as mudanças no CVA, o que mais deve beneficiar a companhia daqui para a frente é uma desaceleração nos custos de materiais de construção, na análise do diretor de RI. Como a empresa é conservadora em seus estudos de viabilidade de um projeto, os custos menores do que os previstos podem gerar margens melhores.

De uma maneira geral, a percepção da companhia é que a demanda por seus imóveis deve seguir resiliente. Cury destaca que a empresa passou por muitas provas de resiliência: impeachment de Dilma Rosseff (PT), em 2016, Joesley Day e, o que considera a maior de todas, o começo da pandemia de Covid-19, em 2020. E [a demanda] não parou”, diz o executivo.

Pedras no caminho

Há, no entanto, riscos no horizonte. No quarto trimestre, período que será marcado pelo provável segundo turno da eleição presidencial e da Copa do Mundo, a companhia pretende tirar o pé do acelerador em lançamentos, segundo Ronaldo Cury.

Apesar de as turbulências do período eleitoral poderem ser uma distração, fazendo com que as pessoas resolvam esperar um momento menos incerto para comprar imóveis, o executivo não acredita que o resultado da eleição possa ter grandes consequências nos negócios da companhia.

Raul Grego, da Eleven, concorda: “Acho que o pior momento já passou. Independentemente do governo, não terá alteração material no programa, porque é um programa muito popular”, afirma.

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Nessa frente, Guimarães, da HIX, faz uma ressalva, indicando que uma irresponsabilidade fiscal do novo presidente, independentemente de qual seja, pode criar um cenário econômico mais arriscado.

Outros riscos para a performance da companhia, de acordo com o analista são uma desaceleração na economia e uma demora no controle da inflação. Grego, por sua vez, cita o impasse em torno do teto do ICMS como uma fonte adicional de possível pressão inflacionária.

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