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Mudanças em dividendos do Maxi Renda (MXRF11) podem se estender para indústria de FIIs; confira os setores mais pressionados

Fundos de tijolos e fundos de fundos estão no centro das atenções

A decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) envolvendo o pagamento de dividendos do fundo imobiliário Maxi Renda (MXRF11), o maior da indústria, com 489 mil cotistas em dezembro, despertou dúvidas para todo o mercado e pode levar algumas carteiras a interromper a distribuição do caixa para os investidores. Segundo especialistas, os fundos de tijolos e os fundos de fundos (FOFs), que investem em outros FIIs, poderiam ser os mais afetados.

Embora a decisão seja ainda pontual para essa carteira, a indústria já se mobiliza. Nesta quinta-feira (27), várias associações do setor se reuniram para discutir o assunto e buscar um entendimento com o órgão regulador para diminuir essa incerteza jurídica.

O BTG Pactual, administrador do Maxi Renda, já informou que deve recorrer da decisão da CVM. O gestor da carteira, André Masetti, da XP Asset, afirmou, em live ontem (26), que o próximo passo é fazer o pedido de reconsideração para a CVM, apontando o impacto da recente decisão em toda a indústria de fundos imobiliários.

“Os recursos ainda não acabaram, o BTG ainda pode recorrer ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), órgão administrativo ligado ao Ministério da Economia, da decisão do colegiado da CVM”, diz um gestor de fundo.

Desde 25 de janeiro, quando foi divulgado o fato relevante pelo BTG, até 17h desta quinta o fundo Maxi renda acumulava desvalorização de 5,96% das cotas na bolsa, enquanto o índice Ifix caía 1,19%.

“O mercado não está muito confiante de que essa decisão da CVM vá em frente, por isso, o impacto nos fundos imobiliários ainda não é significativo”, diz um gestor de FII. “Não sabemos se a decisão é só para o Maxi Renda ou para toda indústria, e isso é ruim porque traz uma insegurança jurídica grande.”

MXRF11 x CVM

A decisão do colegiado da CVM, publicada em 21 de dezembro de 2021, deu provimento parcial ao recurso apresentado pelo BTG Pactual, administrador do fundo, contra decisão da Superintendência de Supervisão de Securitização da CVM que vedou a distribuição de dividendos aos cotistas nos casos em que o fundo tivesse prejuízo contábil.

Essa era uma prática comum na indústria, que calculava a distribuição de dividendos com base no caixa, ou seja, nas receitas recebidas pelos fundos com pagamentos de aluguel ou rendimentos de papéis de dívida em carteira menos as despesas.

Se a decisão da CVM for levada ao pé da letra e se estender a outros fundos imobiliários, eles não poderão distribuir dividendos até reverter o prejuízo contábil. “Isso acabaria trazendo uma volatilidade grande para o pagamento de dividendos”, diz Luis Stacchini, sócio e Co-CIO de real estate da Navi Capital.

E há quem não a veja possibilidade de a decisão ser mantida.

“Isso não tem como passar, vai mudar drasticamente o principal atrativo do fundo imobiliário, que é a geração de renda mensal como complemento”, disse um gestor de FII.

A situação pode criar um problema para os fundos. No caso de um produto de tijolo, por exemplo, se o valor de mercado dos imóveis cair em função de momento como a pandemia, por exemplo, o portfólio pode registrar um prejuízo contábil. Nesse caso, ele não poderia distribuir os rendimentos obtidos com receita de aluguel aos cotistas. “Há várias carteiras nessa situação na indústria”, diz um analista do mercado.

Segundo a CVM, o fundo poderia distribuir esse caixa por meio de uma amortização de cotas. “O problema é que na amortizaçãoo cotista vai ter que pagar imposto sobre o ganho de capital”, diz Stacchini.

Os investidores pessoas físicas têm isenção no recebimento de dividendos desde que o fundo seja listado em Bolsa, possua no mínimo 50 cotistas e nenhum deles tenha mais de 10% das cotas do fundo. No entanto, investidores pagam Imposto de Renda de 20% sobre o ganho de capital com a venda ou a amortização da cota.

Entenda o caso

Pela Lei 8.668/93 dos fundos imobiliários, essas carteiras devem distribuir aos cotistas 95% do lucro auferidos no semestre segundo regime de caixa, com base em balanço. “A lei é confusa, porque não existe regime caixa contabilmente falando, e depois ela menciona que isso deve ser feito com base no balanço, que é regime de competência, ou seja, contábil”, diz o advogado tributarista Lucas Dollo, sócio do NFA Advogado.

Para reduzir essa incerteza, a CVM publicou em 2014 um Ofício Circular em que dizia que o cálculo para distribuição dos dividendos deveria considerar o lucro contábil no período e ajustado ao fluxo de receitas/despesas
contabilizadas, ou seja, pelo caixa. O objetivo da CVM era evitar que fundos que tivessem um lucro contábil distribuíssem dividendos sem de fato gerar receita, afirma Dollo.

No caso específico do Maxi Renda, a CVM costuma fazer uma ronda no mercado como parte da supervisão de risco, analisou as demonstrações financeiras do FII e concluiu que a carteira apresentava prejuízo acumulado em 2020. Pelo entendimento do órgão, um fundo imobiliário não pode pagar dividendos se apresentar prejuízo contábil, isto é, o valor do dividendo deve ser maior que o lucro contábil do FII.

O fundo Maxi Renda, gerido pela XP Asset, tem como mandato investir 80% do patrimônio em papéis de dívida do setor imobiliário (CRIs, sigla para Certificados de Recebíveis Imobiliários). O prejuízo do fundo em 2020 foi causado pela marcação a mercado desses papéis.

Isso porque a remuneração desses títulos é atrelada à variação do CDI ou da inflação mais uma taxa prefixada. Quando as taxas de juros no mercado sobem, os papéis emitidos com taxas menores se desvalorizam. O administrador do fundo tem, nesse caso, que ajustar o valor dos títulos em carteira, mas esse prejuízo só vai se concretizar se fato o papel for vendido.

Em 2021, o fundo, que tinha patrimônio líquido de R$ 2,3 bilhões em dezembro, distribuiu R$ 201, 8 milhões, o que representa um pagamento médio por cota de R$ 0,079.

Fundos de fundos e de tijolos também podem ser afetados

Se for de fato aplicada a toda à indústria, a decisão da CVM pode impactar os fundos de tijolos e fundos de fundos.

No primeiro caso, se houver um prejuízo contábil por conta de uma desvalorização do imóvel em função de um momento do mercado, o fundo não pode distribuir dividendos, mesmo recebendo os pagamentos de aluguel.

“Os fundos fazem uma avaliação anual do valor dos imóveis em carteira e teriam que passar a fazer periodicamente isso, talvez trimestralmente, para poder voltar a distribuir dividendos se houver variação do preço do imóvel no mercado”, diz um analista.

No caso de fundos de fundos, o impacto seria ainda maior, já que essas carteiras são afetadas pela variação do valor das cotas dos outros FIIs em que investem. “Alguns desses fundos tiveram prejuízo contábil na pandemia”, assinala o analista.

Maria Fernanda Violatti, analista de fundos imobiliários e fundos listados da XP, e Rodrigo Sgavioli, head de alocação e fundos, estão apreensivos principalmente com os segmentos de lajes e shoppings e, em menor proporção, com fundos de logística, que recentemente tiveram reavaliações positivas.

Decisão deve despertar mudanças para a indústria

A decisão do colegiado da CVM sobre o fundo Maxi Renda deve gerar mudanças para a indústria de fundos.

Para Dollo, apesar de a decisão do colegiado da CVM não ter sido unânime, não houve uma mudança de entendimento do que a autarquia já havia mencionado no Ofício de 2014. “Ele estabelece que se apure o resultado pelo regime de competência e analisa se [o fundo] tem caixa para distribuir”, assinala.

O ponto, segundo Dollo, é que a Instrução CVM 516, que dispõe sobre as demonstrações financeiras dos fundos imobiliários, estabelece que o ajuste de um lucro ou prejuízo contábil por conta da avaliação do valor justo de um ativo em carteira deve ser contabilizada no resultado, e não em uma conta do patrimônio líquido. “Se o prejuízo contábil fosse contabilizado no patrimônio líquido e não no resultado, não teria esse problema”, diz.

Por isso, uma solução para essa questão, segundo o advogado, seria a CVM revisar a Instrução 516.

Esse debate sobre a decisão da CVM, segundo Stacchini, da Navi, poderia ainda levantar a discussão sobre a falta uma padronização na indústria sobre o modelo de marcação a mercado do valor dos papéis em carteira dos FIIs. “Cada administrador tem um jeito de fazer as coisas e isso pode causar algum tipo de desconforto”, diz.

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