A ata da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central), que veio menos dura com a inflação do que o comunicado, e o IPCA de julho, que além da esperada deflação mostrou perda de ritmo dos preços de bens industriais, reforçam a chance de o BC interromper o atual ciclo de política monetária com a Selic nos atuais 13,75% ao ano.
No documento que detalha as discussões do último encontro, quando a taxa básica foi elevada em 0,50 ponto percentual, o colegiado reforçou que as ações de agora miram na inflação esperada para o início de 2024, que deve ser mais moderada que a atual.
“A ata do Copom divulgada hoje indica que a elevação mais recente da taxa Selic foi provavelmente a última do ciclo de aperto, ao mencionar que as projeções de inflação para o início de 2024 (horizonte que o comitê optou por enfatizar, para evitar as distorções de mudanças tributárias) estão ao redor da meta”, afirmou o Itaú Unibanco em relatório.
Para analistas de mercado, isso corrobora a intenção do Copom de encerrar a série de aumentos nos juros, iniciada em março de 2021.
“A ata foi ligeiramente mais dove [menos inclinada ao aumento de juros] do que o comunicado”, avaliou Luis Menon, economista da Garde Asset Management, que reduziu a projeção para a Selic de 14% no final de 2022 para 13,75%. “O Copom deixou claro que nesse horizonte, do primeiro trimestre de 2024, a inflação está próxima à meta.”
Para o especialista, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de julho, que mostrou a maior deflação da série histórica ao recuar 0,68% no mês passado, pode ajudar o comitê a ficar mais confortável para interromper o ciclo – intenção que vem demonstrando nas últimas decisões.
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Não por causa da deflação em si, que era amplamente esperada pelo mercado, mas porque o índice de difusão do IPCA mostra que 62,9% dos preços medidos aumentaram em julho – menos que os 66,6% observados em em junho -, e pela desaceleração da alta de preços dos bens industriais.
“Quando se considera a inflação subjacente dos bens industriais [ou seja, a alta de preços que desconsidera os itens mais voláteis ou de maior peso no índice], é possível ver que houve uma desaceleração forte. A alta de preços de 0,97% em junho se reduziu para 0,42% em julho”, diz. “Se a barra do Copom já está alta para continuar subindo juros, toda notícia boa deve ajudar a interromper o ciclo”, avalia.
Economia global em xeque
Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe Banco Mizuho, o IPCA de julho não terá impacto na decisão do BC na próxima reunião, em setembro. Na avaliação do economista, o que deve reforçar o cenário de Selic a 13,75% no final deste ano é a desaceleração da economia global prevista para os próximos meses, com aumento de juros nos EUA e Europa.
Na avaliação do especialista, o freio na atividade econômica mundial deve se refletir na desvalorização das commodities, um dos principais estímulos à inflação brasileira, sobretudo o petróleo, cujo barril já é negociado abaixo de US$ 100.
“O risco de recessão mundial está favorecendo a mudança de estratégia do Banco Central”, diz. “A ata reforça a mensagem de que provavelmente o ciclo de alta dos juros se encerrou. O Banco Central indicou que, a menos que seja surpreendido, não pretende mais subir.”
Para o economista, o debate se volta agora para o período pelo qual a autoridade monetária vai deixar os juros pressionados. A previsão do banco Mizuho é que a Selic não seja alterada até o segundo trimestre de 2023.
Um possível agravamento do cenário global, pondera Rostagno, abre margem para o arrefecimento dos juros antes disso.
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Para os especialistas, a avaliação é que o IPCA mostrará uma nova deflação em agosto, mais modesta. “Acreditamos que em agosto a inflação vai recuar 0,2%, já que ainda haverá o efeito da redução do ICMS de telecomunicações, que ainda não apareceu nos dados de julho, e as reduções nos preços de combustíveis pela Petrobras”, diz Menon.
Inflação de serviços preocupa
Há uma pedra no caminho desse cenário um pouco mais benigno para a inflação, entretanto, que é a alta de preços em serviços.
“A leitura [do IPCA de julho] reforça a visão de que o pior já passou para a inflação”, disse Daniel Karp, economista do Santander especializado em inflação. “Estamos vendo os primeiros sinais de uma melhoria nas medidas gerais, como núcleos [medidas do IPCA que excluem os itens mais voláteis] e difusão, mas a inflação de serviços, a mais persistente, ainda é uma preocupação no médio prazo.”
É a mesma avaliação de Rostagno, do Mizuho. “Ainda tem média dos núcleos com inflação acima de dois dígitos. Embora haja a desaceleração, a verdade é que precisa dar tempo ao tempo para os dados apresentarem uma abertura mais benigna”, destacou.
Para Eduardo Vilarim, economista do Banco Original, os juros devem estacionar no atual patamar, e a estratégia do BC será derrubar a inflação “jogando parado”, ou seja, sem a necessidade de novos apertos na taxa. “O Banco Central faz esse combate de forma passiva, através de juros real. Não precisa avançar no ciclo, mas optar por um gradualismo de deixar a taxa estável em um patamar mais alto”, explicou.