Quando o assunto é investimento, temos vários mitos, aqueles relacionados à segurança, como renda fixa, ou mesmo aquele denominado como investimento de “risco”, a renda variável. O fato é que, como forma de alavancar seus ganhos, cada vez mais CPFs estão procurando ativos que unem os dois, segurança e ganho.
E, por incrível que isso possa parecer, é possível encontrar ativos “defensivos” em tempos de juros e inflação altos.
Um levantamento exclusivo feito pela Agência TradeMap mostra que o grande fator que atraiu investidores PF (pessoa física) para o mercado de renda variável nos últimos anos é o pagamento de proventos, de acordo com os formulários de referência de todas as empresas listadas no Ibovespa nos anos de 2019, 2020 e 2021*.
Na comparação com o período pré-pandemia, ou seja, em 2019, e o ano de início de retomada integral das atividades, que foi 2021, as empresas que mais ganharam investidores PFs foram a Iguatemi (IGTI11), Sulamérica (SULA11) e Magazine Luiza (MGLU), com avanços de 10.239,74%, 2.450,27% e 1.751,72%, respectivamente.
A empresa do setor de incorporação anunciou neste ano, por exemplo, que pagará R$ 90 milhões em dividendos relativos a 2022, sendo um total de R$ 0,04 por ação ordinária, R$ 0,14 por ação preferencial e R$ 0,34 por unit
Em número de investidores, a Iguatemi passou de 531 acionistas em 2019 para cerca de 55 mil em 2021, enquanto a SulAmérica foi de 3,752 mil CPFs para 95,6 mil na mesma base comparativa. Já a Magazine Luiza tinha 31,3 mil investidores PF em 2019 e encerrou 2021 com 579,6 mil.
Na outra ponta, apenas três empresas perderam investidores pessoa física no período, no caso Telefônica Brasil (VIVT3), dona da Vivo, que, ainda assim, lidera o ranking de mais investidores nos três anos, seguida por Localiza (RENT3) e TIM Brasil (TIMS3), com baixa de 21,6%, 11,51% e 0,14%, nesta ordem.
A dona da Vivo tinha 1,8 milhão de investidores em 2019 e encerrou 2021 com 1,4 milhão. Já a Localiza passou de 41,8 mil para 37 mil no comparativo, e a TIM Brasil saiu de 1,26 milhão para 1,25 milhão no período.
Veja no quadro quais companhias mais ganharam investidores PF entre 2019 e 2021:

Segundo Pedro Galdi, analista da Mirae Asset, a ação do Magazine Luiza surfou com o isolamento social imposto para combater à pandemia de Covid-19 em 2020, o que acabou fortalecendo o comércio eletrônico.
Essa onda pode ser vista no preço das ações. Após encerrar o ano de 2019 com o papel cotado a R$ 11,88, a empresa atingiu sua máxima histórica em novembro de 2020, de R$ 27,28, uma valorização de 129,63%. Contudo, de lá para cá, o papel despencou, e hoje é negociado na faixa dos R$ 2,60.
“Esse movimento de alta se reverteu no ano passado com a volta da população às ruas, causada pelo fim das medidas restritivas de mobilidade”, diz Galdi.
Em números absolutos, ou seja, levando em consideração quem mais ganhou em número de pessoas e não em comparação percentual, a ação da Itaú S.A. foi a que mais teve novos investidores no comparativo — cerca de 738 mil. Na sequência, Magalu ganhou 548 mil, Via (VIIA3) 354 mil, Taesa (TAEE11) 352 mil e Petrobras 346 mil novas pessoas física.
O boom de investidores em 2020
Mesmo com o início da pandemia, em março de 2020 no Brasil, nos cinco primeiros meses do ano houve um aumento de 800 mil novos CPFs na B3, a dona da Bolsa brasileira.
Contudo, o movimento pouco tem a ver com a Covid-19. O analista da Mirae explica que a grande parcela de investidores no Brasil sempre foi focada em renda fixa, já que o investimento sempre trouxe um “retorno satisfatório”, diante do histórico de juros altos por aqui.
Apesar disso, em 2020, o mercado viu a taxa básica de juros, a Selic, atingindo o patamar de 2% ao ano.
“Nesse momento surgiu um ‘desespero’ daqueles que buscavam alternativas para remunerar suas poupanças. Uma saída era buscar ações, fundos, clubes e fundos Imobiliários, por exemplo. Foi justamente neste período que explodiu o número de entrantes na B3”, comenta Galdi.
De 2020 para 2021, os investidores continuaram a buscar bons proventos, porém não foi só isso. Analisando as empresas que mais viram seus investidores PF aumentarem no comparativo, a aposta em alguns setores e a busca por ações “protetivas” deram o tom da evolução.

Nesse comparativo, as líderes são empresas do setor elétrico – como Copel (CPLE6) e Taesa (TAEE11). Para João Daronco, analista da Suno Research, essa evolução está ligada principalmente à questão dos dividendos.
“São empresas com uma elevada capacidade de geração de caixa e com um fluxo de caixa previsível, além de contratos de longo prazo. Isso faz com que elas consigam distribuir bons dividendos, o que é interessante para o investidor PF”, avalia. Além delas, Energisa (ENGI11) também consta no top 10.
Daronco acredita que empresas do setor elétrico, especificamente as de transmissão, são consideradas “defensivas” para proteger a carteira em momentos de inflação alta e instabilidade. Empresas defensivas são aquelas que normalmente não trazem grandes surpresas ao investidor mesmo em épocas difíceis da Bolsa e da economia.
Na prática, empresas de setores que, mesmo em uma recessão, não apresentam uma queda forte no consumo dos serviços. Dessa lista, outras empresas podem se enquadrar nessa categoria — GPA (PCAR3), Minerva (BEEF3) e Marfrig (MRFG3), todas do ramo alimentício.
No caso de Iguatemi, que teve um forte avanço no número de acionistas, o analista da Suno Research afirma que a alta está relacionada a uma expectativa de uma reabertura econômica, o que valorizaria o preço dos papéis de ações ligadas à shoppings centers.
As empresas com mais acionistas PF
Ao analisar quais companhias encerraram os anos de 2019, 2020 e 2021, novamente a explicação é simples — são consideradas boas pagadoras de proventos. Veja o top 10 dos três anos analisados.

As duas empresas com mais investidores nestes anos são a Telefônica Brasil e a TIM Brasil. O restante do ranking é composto por bancos tradicionais e pela Petrobras (PETR4).
“Há muito tempo investidores pessoas físicas buscam montar posições em carteiras com empresas que pagam bons dividendos, visando complementação de renda, principalmente para sua aposentadoria”, analisa Galdi.
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Além das boas pagadoras, Magazine Luiza e Via entram no ranking de 2021 exatamente pelo advento do e-commerce ao longo da pandemia.
De acordo com Daronco, as empresas conseguiram se beneficiar da “demanda reprimida” recente, o que fez muita gente trocar eletrodomésticos, por exemplo. “Isso impulsionou o resultado dessas empresas e elas se tornaram companhias da moda”.
Sobre o levantamento*
O levantamento foi realizado entre junho e julho deste ano utilizando dados dos formulários de referência de todas as empresas do Ibovespa relativos aos anos de 2019, 2020 e 2021. |
Das 90 empresas do Ibovespa, 3R Petroleum (RRRP3), Assaí (ASAI3), CSN Mineração (CMIN3), Grupo Soma (SOMA3), Méliuz (CASH3), Petz (PETZ3) e Rede D’Or (RDOR3) não possuíam capital aberto em 2019, portanto, não foram levadas em consideração. |