Em um dia de nervosismo no mercado, após o novo governo apresentar a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) com os programas sociais fora do teto de gastos, as ações que mais caem no Ibovespa são aquelas relacionadas à economia doméstica e sensíveis aos juros.
Por volta de 12h, Qualicorp (QUAL3) recuava 11,21%, Cyrela (CYRE3) desabava 10,13%, Eztec (EZTC3) caía 7,88%, Pão de Açúcar (PCAR3) perdia 6,37%, Petz (PETZ3) apontava em 7,55% para baixo e CVC (CVCB3) se desvalorizava 7%. O movimento é inverso à curva de juros brasileira, que apresenta uma nova alta.
De acordo com dados disponíveis na plataforma do TradeMap, os contratos de juros para 2024, 2026 e 2028 avançavam 0,27 p.p (ponto percentual), 0,42 p.p. e 0,37 p.p, respectivamente.
Na visão de Alexandre Brito, sócio da Finacap Investimentos, “existe uma preocupação do mercado sobre como será conduzida a parte fiscal do novo governo”.
Isso porque, o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, apresentou na noite de quarta-feira (16) à proposta para a PEC da Transição, que vai acomodar no Orçamento de 2023 o Auxílio Brasil, ou outro programa que vier a substitui-lo.
Pelo texto, a intenção é permitir a continuidade do pagamento do valor de R$ 600, mais uma parcela extra de R$ 150 para cada criança abaixo de 6 anos. A minuta da equipe de transição prevê que o programa seja excluído do teto de gastos de forma permanente.
Na visão de Brito, a PEC foi uma “materialização do que o mercado não queria”, tendo seus reflexos na Bolsa, com alta na curva de juros e no dólar.
No caso das varejistas e construtoras, a possibilidade de manutenção dos juros em patamar elevado por mais tempo bate direto nas ações.
Para Vitorio Galindo, analista e head de análise fundamentalista da Quantzed, ninguém quer emprestar dinheiro para um devedor que pode ter problemas para pagar essa dívida lá na frente, então o mercado acaba cobrando mais taxa por essa dívida.
“Isso reflete diretamente no varejo e na construção civil, dois setores muito atrelados à inflação e juros. O mercado está ajustando o valor desses ativos para um novo patamar”, explica Galindo.
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O que o mercado acha de tudo isso
Em comentário enviado ao mercado nesta manhã, a Terra Investimentos destacou que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a criticar o cumprimento do teto de gastos em detrimento de uma destinação de recursos para a área social.
“Se não resolvermos problemas sociais, não vale a pena recuperar esse país. Não adianta só pensar em responsabilidade fiscal, temos de pensar em responsabilidade social”, afirmou o presidente eleito.
Lula declarou ainda que para cumprir o teto, é preciso desmontar políticas sociais e que movimentações de mercado são ocasionadas por especuladores e não por “pessoas sérias”.
“O mercado tem dois principais focos de atenção: o texto final da PEC e a equipe econômica do novo governo. Em relação à PEC, o mercado não vê problema do Auxílio Brasil ficar acima do teto em 2023. Contudo, se o prazo se postergar, o risco fiscal aumenta”, comenta Alexandre Brito, da Finacap.
Vale ressaltar que esse movimento de baixa nas empresas ligadas aos juros não é de hoje. No pregão da véspera, quando o Ibovespa recuou 2,58% com incertezas fiscais e à espera da PEC da Transição, Hapvida (HAPV3) recuou 10,94% e Americanas (AMER3) perdeu 9,81%.
“As taxas futuras de juros brasileiras fecharam a quarta-feira em alta, prejudicando papéis correlacionados com o nível de juros”, destacou a Genial Investimentos, em comentário enviado ao mercado.