Acredito que saber a diferença entre risco e incerteza é o principal determinante de quanto dinheiro você irá ganhar no mercado financeiro.
Bom, se você sabe, recomendo que pule para o final desse texto, caso contrário continue lendo.
RISCO
Vamos começar pelo risco. Qual é a origem da palavra? Bom, ninguém tem certeza absoluta, mas entre todas as possíveis origens a que eu mais gosto é uma metáfora.
Ao navegar pelo estreito de Messina, Odisseu foi sugado pelo redemoinho do temível monstro marinho, Caríbdis, mas conseguiu se salvar ao agarrar-se às raízes de uma figueira selvagem que crescia em um penhasco, no qual ficava a entrada da gruta da besta.

Suponho que quando Homero escreveu a Odisséia, ele jamais imaginava que elementos das narrativas comuns na sua época dariam origem a palavras que hoje usamos em contextos completamente diferentes. Uma delas tem extrema importância para a economia, finanças e a ciência em geral: o risco.
A palavra raiz, em grego antigo ριζα (riza), passou a ser usada pelos romanos para designar precipício, pois as figueiras e suas raízes aéreas, como a descrita por Odisseu, frequentemente crescem em penhascos: riscus, em latim. O termo virou metáfora para “perigos de navegação”, provavelmente ainda por influência de Homero.
No século 13, o termo risco, com o sentido de usamos hoje, chance de perigo, passou a compor o vocabulário italiano.
Segundo o Dr. Rolf Skjong, diretor e cientista-chefe da DNV GL, um conglomerado norueguês que, entre outros serviços, presta consultoria de gestão de riscos, a palavra começou a ser amplamente utilizada nas línguas neolatinas a partir do século 16, como no francês risque.
Ainda segundo Skjong, a relação do termo com o espaço físico foi abstraída provavelmente nas línguas ancestrais do alemão moderno, quando passou a significar ter coragem ou ousadia nas ambições dos negócios.
Hoje, muito diferente da raiz da figueira, a palavra risco é mundialmente definida como a probabilidade de perigo, da ocorrência de algo desagradável ou de perdas financeiras. O termo é utilizado em uma imensa gama de áreas do conhecimento e atividades humanas.
E a incerteza?
INCERTEZA
Coloquialmente, em muitas das línguas, “risco” é perfeitamente intercambiável com “incerteza”, um sinônimo (até mesmo formalmente em alguns dicionários). De forma bem simples, o significado é dado pelo prefixo de negação “in-” mais “certeza”, ou seja, que não se pode ter certeza.
A origem da palavra não é tão interessante quanto a de “risco”. A palavra “certeza” também vem do grego antigo, κρίνω (crino), que significa escolher, selecionar, ordenar. Que, quando incorporada ao latim, “cerno” significa distinguir, discernir e ver. E mais tarde surgiu “certus”, com o mesmo significado que conhecemos hoje na língua portuguesa: certo, resolvido ou determinado.
Combinando o prefixo de negação “in-” com “certus”, temos “incertus”, que significa incerto, duvidoso, indecidido, desconhecido e obscuro. Atualmente, também com sentido universalmente similar, “incerteza” exprime as propriedades do que não é certo, que transmite dúvidas, é contingente ou aleatório.
RISCO X INCERTEZA
Então risco e incerteza significam a mesma coisa?
O grande divisor de águas entre “risco” e “incerteza” para o mundo das finanças veio em 1921, com a publicação do livro Risk, Uncertainty, and Profit, do economista Frank H. Knight, que traduzo livremente abaixo:
“Uma incerteza mensurável, ou “risco”, é tão diferente de uma imensurável que deixa de ser uma incerteza. Devemos, portanto, restringir o termo “incerteza” a casos do tipo não quantitativo (que não podemos medir)…”
Em outras palavras, risco é algo cujos cenários possíveis e suas probabilidades de materialização são conhecidas a priori.
De forma geral, só é possível determinar riscos quando os mecanismos que geram certos fenômenos são bem conhecidos (por exemplo, 50% de acerto em um jogo de cara ou coroa) ou quando são estimados a partir de evidências empíricas (por exemplo, podemos afirmar com certa confiança que apenas 5 entre 10 mil vacinados contra a Covid-19 no Brasil apresentam reações, mesmo sem saber exatamente o porquê).
Já a incerteza não é mensurável e, portanto, não podemos atribuir probabilidades. A incerteza não pode ser conhecida a priori, pois é indeterminada, obscura por definição. A influência de Knight foi tão grande que na economia existe até o termo “incerteza knightiana”, que significa um cenário futuro que não é e nem pode ser conhecido antecipadamente.
Em suma, risco é mensurável (ou estimável) e incerteza é desconhecida.
O IMPACTO DO RISCO E DA INCERTEZA NO SEU BOLSO
O Dato Netto, nosso fundador e estrategista-chefe, tem uma frase que sintetiza muito bem o impacto do risco versus a incerteza nos mercados: “O mercado não tem medo de crise, ele tem medo do escuro.”
Ou seja, os movimentos mais violentos de mercado costumam ocorrer entre o momento em que as expectativas vão por água abaixo e o ponto em que novas são restabelecidas, o período de maior incerteza. Como na crise de 2008-2009, quando demorou meses até que tivéssemos a ideia do tamanho do rombo no sistema financeiro global ou da disposição dos governos e bancos centrais de salvar o sistema.
Por outro lado os riscos, aqueles cenários de certa forma mapeáveis, costumam “já estar no preço” e a materialização dos mesmos pode até mexer fortemente com os mercados, mas não tão dramaticamente quanto os choques advindos do que era desconhecido, totalmente inesperado.
O maior risco que o investidor brasileiro vai enfrentar 2021
O maior risco que você vai enfrentar em 2021 (e durante toda a sua trajetória com investimentos) é confundir risco com incerteza. Afinal, é muito mais fácil traçar planos e nos preparar para os pontos de perigo assinalados em um mapa (riscos) do que os desconhecidos (incerteza). Quase sempre, são aqueles que estão preparados para tudo que vencem no longo prazo.
O nosso querido Vitor Péricles (“O Relator”), Sócio-Gestor da LAIC, matou a charada de primeira quando fiz a seguinte pergunta no twitter:

No mercado, o que faz preço para valer são aquelas coisas que estão completamente fora do radar e você precisa ter uma estratégia que te prepare para elas: diversificação em ativos mais descorrelacionados possível, tail-risk hedging, etc…
3 riscos para 2021
Bom, agora que você já sabe a diferença entre risco e incerteza, vamos à última parte. Todo esse preâmbulo foi motivado quando me foi dado o desafio de elencar os “três maiores desafios para o investidor em 2021.” Eu pensei: ora, seu eu posso mapeá-los então são riscos (e não incertezas) e muito pouco provavelmente são as coisas que poderiam provocar movimentos radicais de preço. Disclaimer feito, segue o meu melhor pitaco sobre quais são os 3 maiores riscos para o investidor brasileiro em 2021:
- Será que o mercado global está operando em modo bolha ou estamos em uma recuperação saudável? Até quando os juros baixos e a injeção de liquidez podem sustentar os mercados globais?
- Entender que haverá enorme disparidade entre empresas e setores na fase da recuperação pós-pandemia. As empresas que se deram bem na crise, como muitas dos setor de tecnologia, continuarão sendo as vencedoras ou dominará a reversão à média, favorecendo a recuperação das que ficaram para trás? Seletividade é a palavra-chave, não adianta comprar qualquer coisa.
- Entender que o próprio cenário de recuperação econômica (local e global) não é uma certeza. E se alguma mutação do vírus afetar fortemente a eficácia das vacinas? E se a necessidade de maiores gastos públicos para enfrentar a pandemia coincidir com a falta de compromisso do congresso com soluções para a grave situação fiscal brasileira?
Como dizem, um barco no porto é seguro, mas não é para isso que os barcos foram feitos. Você pode interpretar a frase como um chamado para correr riscos ou entender que o barco só aguenta o mar aberto pois foi projetado para também suportar condições além daquelas que você pode prever.
Até a próxima semana!