Há três meses, quando publicou os resultados referentes ao primeiro semestre de 2021, o Nubank provou que conseguia operar no azul. Foi um resultado tímido, é verdade, com R$ 76 milhões de lucro líquido para o período, mas que tinha um valor simbólico, ao deixar para trás uma sequência de sete anos no prejuízo — desde a fundação, em 2013 — e às vésperas do IPO da companhia, realizado em dezembro.
Ok, o Nubank sabe ganhar dinheiro. Mas será que um dia conseguirá lucrar tanto quanto algum dos grandes bancos brasileiros, que enfileiram resultados bilionários ano após ano?
A julgar pela precificação da empresa, a resposta teria de ser sim. Afinal de contas, o Nubank já vale mais que os dois maiores bancos privados do Brasil: Itaú Unibanco e Bradesco. Enquanto a fintech é avaliada em US$ 42,6 bilhões, o Itaú é estimado em US$ 37 bilhões, e o Bradesco, a US$ 33,2 bilhões.
Mas a maior parte da precificação dada pelo mercado é sustentada por expectativas de dias melhores. Se os investidores assumem que um dia o Nubank terá lucros bilionários, assim como os grandes bancos, a outra pergunta que surge é: quando isso acontecerá?
Na segunda-feira, 3, foi possível ter uma ideia dessa resposta, pois quatro dos principais bancos globais que acompanham a ação do Nubank publicaram relatórios com projeções para os próximos anos. Na visão de três deles, a fintech já terá lucro de “bancão” em 2026. São eles Morgan Stanley, UBS BB Investment Bank e Citi.
Pelo intervalo das estimativas do trio, o Nubank teria, em cinco anos, um lucro líquido ajustado de algo entre US$ 4 bilhões e US$ 4,5 bilhões. Pela cotação do dólar no fechamento de terça-feira, 4, seria um valor de R$ 22,7 bilhões a R$ 25,5 bilhões.
O outro banco global a começar a cobertura do Nubank na segunda-feira foi o Goldman Sachs, que chega no máximo a projetar números para 2025, mas também com estimativas bilionárias. Para o banco americano, que também recomenda compra, a fintech terá um lucro líquido de US$ 3,3 bilhões daqui a três anos, ou de R$ 18,7 bilhões.
São previsões que se aproximam — ou já superam — os resultados que Itaú e Bradesco registraram em 2020, o último ano completo com balanço já divulgado pelas duas instituições. Enquanto o Itaú teve lucro líquido de R$ 18,5 bilhões, o Bradesco encerrou 2020 com ganhos de R$ 19,4 bilhões.
Uma ponderação, contudo, precisa ser feita: todos as instituições citadas, que recomedam a compra do papel da Nubank, participaram da coordenação do IPO da fintech.
O Citi, por exemplo, estima que o lucro líquido ajustado da empresa terá uma expansão exponencial ao longo dos próximos anos, saindo de R$ 4 milhões, em 2022, para US$ 4,3 bilhões, em 2026. A receita total esperada, por sua vez, saltará de US$ 3,2 bilhões para US$ 14,2 bilhões.
Para chegar lá, o Nubank terá a seu favor o engajamento dos seus clientes, avalia o analista Jörg Friedemann, responsável pelo setor financeiro para a América Latina no Citi.
Base engajada
Para ele, a fintech tem números impressionantes: dos 48 milhões de usuários, 73% são ativos mensais (que realizam pelo menos uma transação no aplicativo a cada mês, como, por exemplo, pagar a fatura do cartão de crédito). Entre os ativos, 50% usam o Nubank como principal plataforma de serviços financeiros.
Como os clientes do Nubank, em geral, são mais jovens – cerca de 60% têm entre 18 e 34 anos –, Friedemann acredita que a fintech pode se beneficiar, no futuro, do amadurecimento dessa base. “São usuários que têm um potencial de aumentar a renda e, naturalmente, gerar mais transações no aplicativo”, afirmou, em entrevista à Agência TradeMap.
Além disso, ressalta o analista, o Nubank se diferencia por conseguir acessar com mais força pessoas de renda mais baixa e manter uma taxa de inadimplência menor que a média do sistema financeiro. “A taxa de inadimplência do Nubank vai ficando menor que a do sistema quanto mais você analisa as faixas de renda mais baixas”, compara.
Isso se deve, diz Friedemann, a uma robusta modelagem de crédito e de análise de dados, com uso de inteligência artificial. O desafio da fintech será conseguir replicar esse sistema, com sucesso, para outros países — como México e Colômbia, onde o Nubank já atua. “Cerca de 70% da receita do Nubank virá do crédito, tanto o pessoal quanto para pequenas e médias empresas.”
Um outro ponto importante, acrescenta o analista, é o desafio que o Nubank terá para manter esse diferencial de qualidade, que será colocado à prova na medida em que a empresa passa a ter um relacionamento maior com a base de usuários e também enfrenta cenários macroeconômicos mais desafiadores, no Brasil e em outros países. “Eles têm mostrado números muito bons, mas não se provaram totalmente ainda”, diz.
Crise à vista?
O fato de o Nubank ter uma penetração relevante no público de renda mais baixa — 56% dos clientes ganham até três salários mínimos — pode ser um risco, uma vez que o Brasil, o principal mercado da fintech, já tem passado por dificuldades econômicas e deve atravessar 2022 em cenário de inflação persistentemente alta e baixo crescimento.
O Itaú BBA, que não participou do IPO do Nubank, também começou a cobrir a fintech e publicou um relatório na terça-feira no qual recomenda a venda do papel. Os analistas da instituição reconhecem que a fintech “tem muitos méritos”, mas sugerem que, em tempos de crise, os usuários de renda mais alta são quem fazem o caixa engordar.
“A maior parte da receita do setor bancário está na crescente área de crédito para o varejo, onde 50% do volume, no Brasil, está concentrado nos clientes 10% mais ricos”, escrevem os analistas do banco. Apesar disso, a instituição também prevê um lucro digno de banco grande para o Nubank em 2026, a R$ 19 bilhões.
Para o Goldman Sachs, porém, o Nubank pode passar sem sustos pela crise. Na visão do banco americano, como a fintech ainda tem uma concessão baixa de crédito por cliente e uma participação ainda pequena no mercado, será possível experimentar uma expansão “anti-cíclica” nos próximos anos.
“A empresa aumentou as suas provisões [recursos destinados a cobrir possíveis calotes] de forma proativa e acreditamos que os níveis devem se manter suficientes para [cobrir] uma [eventual] taxa elevada de [inadimplência] de 9%”, afirma o Goldman Sachs, em relatório. A taxa de inadimplência do Nubank para cartão de crédito é de 3,3%.
Um outro banco que também não está tão otimista com o Nubank é o BTG Pactual, que tem uma posição neutra em relação à ação. Assim como o Itaú BBA, a instituição reconhece as qualidades da fintech, mas ressalta que, além de haver riscos relacionados ao cenário macroeconômico, o valor que o mercado dá à fintech pode ser exagerado, o que faria com que investir hoje na ação da empresa seja uma aposta “muito arriscada”.
“Para justificar um valor de mercado de US$ 46 bilhões [valor do Nubank à época da publicação do relatório, em dezembro], o Nubank teria de ter um retorno (ROE) superior a 30% em 2026, atingindo um lucro líquido de US$ 2,1 bilhões”, calculam os analistas do BTG.
Projeções para Nubank | Lucro em 2025 | Lucro em 2026 | Recomendação para a ação em Nova York | Preço-alvo |
Citi | R$ 15,9 bilhões | R$ 24,4 bilhões | Compra | US$ 12 |
UBS BB | R$ 15,9 bilhões | R$ 25,5 bilhões | Compra | US$ 12,5 |
Morgan Stanley | — | R$ 22,7 bilhões | Compra | US$ 16 |
Goldman Sachs | R$ 18,7 bilhões | — | Compra | US$ 15 |
BTG Pactual | R$ 9 bilhões | R$ 13,6 bilhões | Neutro | US$ 10 |
Itaú BBA | R$ 15,3 bilhões | R$ 19 bilhões | Venda | US$ 8 |
O UBS BB, contudo, acha que o Nubank pode chegar a esse retorno, até mesmo antes de 2026. Para o banco suíço, a fintech deve ter um retorno de 39% em 2025. No ano seguinte, em 2026, a companhia teria 100 milhões de usuários, dos quais 80 milhões só no Brasil – algo próximo do que têm, hoje, os três maiores bancos do país (Itaú Unibanco, Bradesco e Banco do Brasil), segundo o Banco Central (BC).
UBS BB, Morgan Stanley e Citi recomendam a compra do papel do Nubank em Nova York. Os preços-alvo são, respectivamente, US$ 12,5, US$ 16 e US$ 12. Já o Itaú BBA estima um preço-alvo de US$ 8, enquanto o BTG Pactual vê uma cotação potencial de US$ 10.
Nesta quarta, por volta das 17h15, a ação negociada em Nova York era cotada a US$ 9,04, em queda de 7,14%. A BDR emitida no Brasil, por sua vez, era cotada a R$8,60, com recuo de 6,32%.