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Em meio a maré de problemas, Natura (NTCO3) perde 43,5% no ano – e sinais de melhora estão distantes

Companhia terá de focar em reestruturação a partir da escolha de prioridades

Foto: Divulgação

Após enfrentar uma sucessão de problemas, como a guerra na Ucrânia, a crise econômica na Europa e as dificuldades na integração da Avon, a ação da Natura (NTCO3) acumula desvalorização de 43,5% desde o início do ano – e os sinais de uma melhora de desempenho parecem distantes, na avaliação de especialistas consultados pela Agência TradeMap.

“Ainda enxergamos bastante volatilidade e desafios em termos de resultado ao longo deste ano”, afirma Danniela Eiger, head de varejo da XP Investimentos. Isso porque os problemas são vários, e as possíveis soluções levam tempo.

“Em termos operacionais, ainda devemos ver a empresa reportando resultados mais difíceis, a exemplo do que aconteceu no primeiro semestre deste ano” afirma João Mamede, analista sênior de renda variável da AZ Quest. “Não vejo uma virada de resultados muito grande, e isso, obviamente, se reflete na volatilidade que temos visto na ação”, completa.

Natura e a sucessão de problemas

Em primeiro lugar, relembra João Mamede, a empresa vem enfrentando dificuldades de integração desde a aquisição da marca Avon, em janeiro de 2020. “Isso hoje já é dito pelo próprio time da Natura, que as dificuldades que eles encontraram depois que compraram a Avon foram muito maiores do que eles imaginavam”, afirma.

A Avon foi adquirida pela Natura por cerca de US$ 2 bilhões e, no segundo trimestre deste ano, foi responsável por 18,9% da receita total do grupo.

Em segundo lugar, a pandemia de Covid-19 e a crise econômica ao redor do globo, impactando especialmente a Europa, que é um dos principais mercados da Natura, também teve forte peso sobre o desempenho operacional da empresa. “A exposição da Natura à Europa é muito grande. A Europa é um continente que está em recessão e a situação por lá não deve mudar no curto prazo”, explica o analista.

A Natura não divulga dados específicos sobre sua exposição à Europa mas, de acordo com o relatório de resultados da companhia no segundo trimestre, 24% da receita líquida do primeiro semestre veio do grupo de geografias EMEA, que compreende Europa, Oriente Médio e África.

Para que a companhia apresente melhora de desempenho significativa, uma coisa é consenso entre os analistas, e já foi sinalizada pela própria gestão: a Natura precisa passar por algum tipo de reorganização.

“Quando o Fábio [Barbosa] assumiu como CEO, ele comentou que a companhia estaria avaliando várias formas para torná-la mais leve na questão de estrutura corporativa da holding, e também quais são as oportunidades de otimização e ganho de eficiência em termos de exposição geográfica”, relembra Daniella Eiger.

Ainda que a Natura já venha dando alguns passos nesse sentido, a percepção do mercado é que uma reestruturação significativa pode levar algum tempo.

As principais medidas que já vêm sendo tomadas são no âmbito da estrutura de custos da holding, com diversas unidades de negócio operando em diferentes mercados.

“O aumento de complexidade ao longo do tempo, com várias unidades de negócios em vários países, trouxe uma estrutura de custos de escritório e de pessoas muito maior do que a Natura tinha no passado”, relembra Mamede, que acredita que o corte de despesas é um dos grandes focos da empresa neste momento. Na avaliação dele, esta estrutura pode ser reduzida pelo menos pela metade.

Atualmente, a Natura tem operações em mais de 100 países na América Latina, Europa, Oriente Médio, África, Ásia Pacífico e América do Norte e, de acordo com dados do segundo trimestre, 42% da receita líquida do grupo veio de fora da América Latina no acumulado do ano.

Em relação aos custos, as despesas com vendas, gerais e administrativas da companhia totalizaram R$ 5,35 bilhões no segundo trimestre deste ano. No mesmo período de 2019, antes da compra da Avon, essa mesma linha de custos somava R$ 2,17 bilhões.

Prioridades

Um segundo passo, na visão do analista da AZ Quest, seria a priorização de mercados em que a companhia gera bons resultados, diminuindo ou encerrando a operação em geografias menos rentáveis. “Acho que a gestão da empresa entendeu as dificuldades que eles iriam enfrentar na estratégia de globalização”, aponta.

Nesse sentido, a avaliação de Mamede é que a Natura será forçada a fechar sua operação em alguns países, principalmente com a marca Avon, que vem entregando resultados piores. Eiger concorda: “Na nossa opinião, este seria o principal movimento que poderia acontecer”.

A escolha de prioridades, porém, deve ir além das geografias, na visão de Mamede. O analista acredita também que a Natura deveria focar em suas operações que entregam bons resultados, como a marca Natura na América Latina e a Aesop, marca australiana adquirida pela companhia em 2018.

No Brasil e nos outros países da América Latina, a marca Natura ocupa um espaço aspiracional para parte da população e, apesar de também enfrentar desafios macroeconômicos e de concorrência, segue como uma unidade de negócios rentável. “Então acho que a Natura América Latina é algo em que eles irão focar”, diz João Mamede.

A Aesop, por sua vez, é uma marca voltada para o público de alto padrão e, desde que foi adquirida, vem entregando forte crescimento, segundo o analista. “Achamos que a Aesop é uma unidade de negócios que ainda consegue entregar bons níveis de crescimento, com boa rentabilidade, por um bom tempo”, afirma.

Nesse sentido, a expectativa de Mamede é que a Avon e a The Body Shop, que também vem entregando resultados negativos, passem a ter uma participação menor nas operações da companhia daqui para frente.

Possibilidades mais distantes

Outras possibilidades que vêm sendo levantadas pelo mercado, mas que os especialistas consideram menos prováveis neste momento, seriam a venda da The Body Shop e a cisão da Aesop.

Para a analista da XP, ainda que ambos os movimentos possam ser interessantes, este não seria o momento ideal para realizá-los. No caso da The Body Shop, a opinião da analista é que os resultados estão em seu pior momento, de modo que a venda não ocorreria nos melhores valores possíveis.

A cisão da Aesop, por sua vez, poderia não ser tão interessante neste momento. “Apesar de esperarmos que a Aesop continue crescendo, ela está em um momento de investimento”, afirma Eiger. “Então a Natura faria o spin-off de um ativo que precisa de investimentos, e abriria mão de margens, em um momento em que os mercados asiáticos não estão no melhor cenário”, completa.

Mamede concorda que a cisão da Aesop faria sentido – mas que esta não deve ser a prioridade da Natura neste momento. “Acredito que faria sentido, para dar visibilidade e monetizar um ativo que está ali dentro, mas que não consegue ser bem precificado. Mas é uma questão de foco e de prioridade”, afirma.

Próximos trimestres da Natura

Apesar de reconhecer que a situação deva seguir desafiadora, a expectativa de Daniella Eiger é de uma melhora gradual nos resultados ao longo dos próximos trimestres, refletindo uma normalização do cenário macroeconômico, com desaceleração da inflação e acomodação da taxa de juros.

Outro fator que pode ajudar a Natura nos próximos meses, na visão de Eiger, é o Auxílio Brasil de R$ 600, aprovado pelo presidente Jair Bolsonaro em julho, que pode impulsionar o consumo das famílias.

A analista ressalta ainda que o quarto trimestre tende a ser sazonalmente mais forte para as empresas do setor, devido às festas de final de ano. Ainda que a Copa do Mundo represente um risco, a volta das confraternizações, limitadas em 2021 devido à pandemia de Covid-19, é um fator positivo.

“Isso também traz uma dinâmica que deveria ajudar em termos de consumo, por exemplo, de cosméticos, seja para presentear, seja pela própria retomada dos eventos, que pode fazer as pessoas voltarem a usar maquiagem”, exemplifica.

A analista da XP cita ainda o fato de parte das operações já ter sido ajustada para o cenário de guerra, o que pode fazer com que os impactos sejam marginalmente menores.

Por fim, a nomeação de Helena Villares para o cargo de diretora de relações com investidores, em julho, pode ajudar a Natura a melhorar sua comunicação com o mercado, podendo melhorar a dinâmica das ações daqui para frente, na avaliação de Eiger.

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