O desmatamento e as mudanças climáticas no Brasil têm implicações diretas para o balanço geral de gás carbônico na atmosfera, o que impacta negativamente a reputação do país e afeta o crédito de empresas locais, afirma a Moody’s. A agência de risco destaca em relatório a conversão de florestas para a agricultura como principal causa do desmatamento no país.
Como um dos maiores exportadores mundiais de produtos agrícolas, a economia brasileira é amplamente dependente de commodities, com florestas naturais e plantadas cobrindo cerca de 59% do território nacional, ressalta a Moody’s. O grupo de agricultura e proteína, cujo crescimento tem sido o principal vilão do desmatamento nos biomas Amazônia e Cerrado nos últimos 20 anos, representou 26,6% do Produto Interno Bruto (PIB) do país e metade das exportações em 2020, aponta o relatório.
“O desmatamento e os riscos relacionados ao clima podem rapidamente se tornar significativos para a qualidade de crédito se o escrutínio regulatório e da sociedade se intensificar”, afirma Barbara Mattos, vice-presidente da Moody’s.
Mattos diz que, embora nem sempre sejam imediatamente relevantes para a qualidade do crédito corporativo, os perigos incluem riscos reputacionais e redução de receita devido a boicotes e embargos.
Quais são os setores mais afetados?
No relatório, a agência ressalta o fato de o Brasil ser o segundo maior produtor e exportador de carne bovina do mundo e que cerca de 45% do rebanho está no bioma Cerrado e aproximadamente 32%, na Amazônia. As empresas de proteína na América Latina enfrentam problemas ambientais e exposição social por causa das ligações da pecuária com o desmatamento, de acordo com a Moody’s.
A pecuária contribui para as mudanças climáticas em diferentes partes da cadeia produtiva, incluindo o desmatamento na alimentação do gado, o processo digestivo, processamento e transporte dos animais. Em todo o mundo, a pecuária é responsável por cerca de 15,5% das estufas antropogênicas de emissões de gases, dos quais o gado é responsável por cerca de 65% das emissões totais, destaca o relatório.
A Moody’s afirma também que, em decorrência da maior pressão pelos produtores de proteína no Brasil por partes interessadas sobre ligações da pecuária com o desmatamento na Amazônia e no Cerrado, as companhias deste setor têm adotado algumas medidas, como o monitoramento de fornecedores de gado criado em áreas ambientalmente ameaçadas.
Segundo a agência, a JBS (Baa3 estável) comunicou que planeja eliminar o desmatamento em sua cadeia de abastecimento da Amazônia e a Marfrig (Ba3 positivo), por sua vez, disse que planeja monitorar toda a oferta de gado nos biomas até 2030. A Moody’s destacou também que a Minerva (Ba3 estável) pretende bloquear fornecedores que não cumprem os créditos de sustentabilidade, enquanto a BRF (Ba2 positivo) afirma que mantém política de compra de grão-sustentável.
Mineração
O relatório aponta que o risco ambiental é muito alto para mineradoras. A categoria de risco mais significativa é o capital natural, com base na degradação das atividades de mineração dos sistemas naturais onde operam, destaca a Moody’s.
“Consideramos o risco de transição de carbono moderado, mas ele varia de acordo com o tipo de mineral. Produtores de níquel, cobalto e lítio usados em baterias para veículos elétricos estão posicionados para se beneficiar da transição do carbono. Nós consideramos risco físico climático alto para as operações de mineração, que têm exposições variáveis às mudanças climáticas, estresse por calor, estresse hídrico, inundações e outros perigos, dependendo da localização de suas operações principais”, afirma a vice-presidente da agência.
A Vale (Baa3 estável) fechou compromissos públicos para proteger os biomas, destaca. E cerca de 60% da produção de minério de ferro ocorre no Pará, parte legal da região Amazônia, enquanto ocupa apenas 3% da área de floresta, aponta o relatório.
Papel e produtos florestais
Outro setor na mira do mercado é o de papel e celulose, de acordo com a Moody’s. Embora dependa de recursos naturais, a maioria das empresas avaliadas pela agência de riscos obtém fibra de fontes sustentáveis e certificadas – ou até mesmo usando fibra reciclada.
“Contanto que eles cumpram as regulamentações ambientais, essas empresas não têm exposições materiais aos riscos de desmatamento, e a maioria das companhias que avaliamos cultivam florestas em áreas distantes dos biomas Amazônia e Cerrado”, destaca Mattos.
Açúcar e etanol
Apesar da dependência de recursos naturais, produtores de etanol no Brasil apresentam exposição moderada a riscos ambientais e sociais relacionados ao desmatamento. De acordo com a Moody’s, os emissores avaliados demonstraram boas práticas sustentáveis ao longo dos anos. Além disso, as empresas devem certificar-se de que suas plantações estão em áreas livres de desmatamento para ter acesso às receitas dos créditos de carbono.
O setor sucroalcooleiro do Brasil se beneficia da transição global do carbono, particularmente da crescente demanda mundial por substituição de combustíveis fósseis por renováveis. Como o maior produtor mundial de etanol de cana-de-açúcar, as exportações de açúcar do Brasil representam 50% do comércio global de açúcar, com 92% da produção de cana do Brasil na região Centro-Sul, distante do bioma amazônico, aponta o levantamento.
A agência de risco ainda destaca que a Raízen (Baa3 estável), uma das maiores produtoras de açúcar-etanol do mundo com cerca de cem milhões de toneladas de capacidade de moagem, tem uma política livre de desmatamento e acompanhamento da produção das fazendas fornecedoras de cana-de-açúcar por meio de informações georreferenciadas.