Logo-Agência-TradeMap
Logo-Agência-TradeMap

Categorias:

Copom desistiu de buscar meta de inflação a qualquer custo em 2022, diz Goldenstein, ex-BC

Juros de curto prazo devem subir após Copom sinalizar que vai manter ritmo de alta da Selic em fevereiro

A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar a taxa Selic para 9,25% pela sétima vez consecutiva, indicando uma nova alta da mesma magnitude em fevereiro, ficou em linha com o esperado pela maioria no mercado e não deve ter impacto relevante sobre o câmbio e a Bolsa.

As taxas de juros, contudo, principalmente as com prazos mais curtos, podem subir, uma vez que parte dos investidores esperava que o Banco Central (BC) indicasse uma desaceleração do ritmo de alta da Selic em função dos dados fracos da atividade, avalia o ex-chefe do Departamento de Operações do Mercado Aberto (Demab) do BC e atual estrategista-chefe da Renascença, Sérgio Goldenstein.

Apesar de o BC reforçar a preocupação com a ancoragem das expectativas de inflação — que estão acima do centro da meta para 2022 e 2023, de 3,50% e 3,25% respectivamente –, Goldenstein avalia que a autoridade monetária jogou a toalha em perseguir a meta para 2022, dado o custo significativo que isso pode ter para a atividade econômica, que já está fraca.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista ao TradeMap.

Qual a sinalização do comunicado do BC  para os próximos passos da política monetária?

O comunicado do BC veio em linha com o que eu esperava. O BC agiu de forma correta ao sinalizar a manutenção do ritmo de alta de juros em fevereiro. Se não fizesse isso, ele contribuiria para uma desancoragem ainda mais forte da inflação. Apesar de toda a preocupação com a atividade, dá para observar que o foco do BC é ancorar as expectativas de inflação.

Qual o impacto da decisão do Copom para os mercados?

Como alguns analistas esperavam que, em função dos dados frustrantes da atividade, o BC aliviasse o tom, a curva de juros pode ficar flat [achatada], com as taxas de juros com prazos mais curtos podendo subir um pouco, enquanto as taxas com prazos mais longos podem continuar caindo.

Já em relação ao câmbio, acho que o impacto é neutro. O diferencial de juros do Brasil [para os mercados desenvolvidos] já está relevante. Se a taxa básica de juros no Brasil agora vai ser 11%, 12% ou 13%, isso é menos relevante. Da mesma forma para a Bolsa, não vejo grandes mudanças no comunicado para ter grandes impactos. A curva de juros já reflete uma alta da Selic para 12,25% no fim do ciclo de aperto monetário, um patamar já elevado.

Qual a sua expectativa para a política monetária?

Mantive o cenário para a política monetária, que é de mais uma alta de 150 pontos-base em fevereiro e outra de 100 pontos em março, com a taxa Selic encerrando o atual ciclo de aperto monetário em 11,75%.

O risco para esse cenário é termos uma persistência maior do choque de oferta [redução da oferta de suprimentos verificada na pandemia por conta do fechamento de fábricas] e a continuidade da piora das expectativas de inflação. Mas nosso cenário indica que os choques de oferta devem se dissipar no começo do próximo ano, provocando a queda da inflação corrente, o que contribui para reduzir as expectativas de inflação.

A incerteza fiscal tem contribuído para a piora das expectativas de inflação. Com o avanço da aprovação da PEC dos Precatórios, esse risco diminuiu?

O BC reconhece que a preocupação com o arcabouço fiscal elevou os prêmios de riscos e isso impacta a política monetária via o canal de expectativas da inflação. Mas isso não alterou o balanço de riscos do BC.

O BC continua vendo um risco altista [de aumento] para a inflação do lado fiscal, e menor pressão de aumento de preços do lado das commodities. Ele não incluiu a atividade econômica fraca no balanço de risco, o que poderia ser um sinal mais ‘dovish’ (menos inclinado ao aperto monetário].

Apesar de as expectativas de inflação estarem acima do centro da meta, a atividade econômica tem desacelerado, com queda do PIB de 0,1% no 3º trimestre. Como o BC avalia esse balanço de riscos?

O BC não deu um peso relevante para a atividade. Ele reconheceu que o PIB veio abaixo do esperado, mas manteve o tom duro no trecho que reforça que é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista. Contudo, deu um sinal mais “dovish” ao destacar que irá perseverar em sua estratégia até que se consolide a ancoragem “em torno de suas metas”.

No comunicado anterior ele mencionava o ajuste da política monetária para assegurar o ‘cumprimento da meta de inflação’. Isso sinaliza que o BC não vai mais buscar a meta de 2022 a ferro e fogo. O BC abandonou o foco anterior de buscar a meta em 2022 a ferro e fogo dado o custo que isso teria e a preocupação passou ser em ancorar as expectativas de inflação para 2023.

A projeção da inflação no cenário básico do BC estava em 3,2% para 2023, apenas um pequeno desvio do centro da meta [de 3,25% para aquele ano], mas ela vem subindo.

O BC destacou no comunicado uma piora do cenário externo para emergentes com os bancos centrais se preparando para subir a taxa de juros. Qual o impacto disso para o Brasil?

Os bancos centrais das economias desenvolvidas estão subindo o tom hawkish [mais inclinado ao aperto monetário] e isso é mais um fator de preocupação. Se o Fed [Federal Reserve, banco central dos EUA] for mais agressivo, pode levar a uma depreciação das moedas emergentes.

De outro lado, uma nova onda da Covid-19 poderia afetar a atividade. O mercado já colocou na conta que o Fed vai subir a taxa básica de juros em meados do ano que vem. Se vier algo mais agressivo do que está precificado no mercado, vai levar a uma valorização global do dólar. Pode ser que, dado o nível de depreciação já significativa do real, a moeda brasileira tenha uma performance menos ruim que outras moedas emergentes, mas não iria escapar.

Como a aproximação das eleições deve impactar os investimentos?

Já tem muito prêmio de risco embutido nos ativos com a incerteza eleitoral. Mas, se tiver um candidato da terceira via com chances de ganhar, os prêmios de risco vão derreter. Já se tivermos um ambiente político polarizado, com candidatos com propostas populistas e risco de ruptura, os prêmios de risco podem subir. Parte desse cenário negativo já está nos preços dos ativos, mas não significa que não pode piorar mais.

Compartilhe:

Leia também:

Mais lidas da semana

Uma newsletter quinzenal e gratuita que te atualiza em 5 minutos sobre as principais notícias do mercado financeiro.