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Construtoras lançam mais, vendem menos e acumulam imóveis em estoque – por que isso importa?

Manutenção de imóveis prontos pode gerar custos e prejudicar preços de venda

Foto: Shutterstock

O ambiente de taxas de juros altas, que eleva as taxas de financiamento imobiliário, vem pesando sobre a demanda por imóveis. Isso, porém, não tem impedido que as construtoras continuem lançando empreendimentos – e uma das consequências deste descompasso entre oferta e demanda é o crescimento dos estoques de imóveis prontos.

“O cliente, principalmente de média renda, é muito sensível à questão dos juros. E as empresas não têm desacelerado os lançamentos. Então está havendo um descompasso entre lançamentos e vendas”, explica Daniel Namur, sócio e analista da AZ Quest.

A tendência foi amplamente percebida nos resultados das companhias no segundo trimestre, conforme demonstrado na tabela abaixo.

Esse movimento, de acordo com Giuliano Dedini, portfolio manager da 4Um Investimentos, não começou agora. Nos anos de 2020 e 2021, as companhias identificaram demanda forte e aceleraram seus lançamentos, tirando proveito do baixo custo de financiamento em um ambiente de juros menores.

Além disso, Namur acrescenta que as empresas vinham com estoques de terrenos elevados, e que não realizar lançamentos nessas áreas significa carregar despesas.

“As incorporadoras têm lançado mais, porque se capitalizaram nos últimos anos, compraram terrenos, e o carrego disso é ruim, porque cria uma estrutura de despesas que é carregada no balanço. Então faz mais sentido lançar”, afirma o analista.

Movimento natural?

Como os empreendimentos lançados levam certo tempo para ficarem prontos e maturarem, eles vêm sendo entregues nos últimos trimestres e, naturalmente, começam a ser reconhecidos como estoque agora, segundo Dedini.

Para o portfolio manager, então, a formação de estoques que vem ocorrendo agora é saudável e não preocupa. “São formações de estoque não por conta de distratos, mas sim por unidades que remanesceram de empreendimentos que praticamente já foram pagos”, explica Dedini. “As incorporadoras conseguem vender o suficiente para estar no lucro”, completa.

Giuliano Dedini aponta ainda que, na sua visão, o volume de vendas continua saudável, principalmente entre as construtoras voltadas para o público de baixo padrão, que ainda devem se beneficiar de mudanças recentes no programa Casa Verde e Amarela.

“As incorporadoras de baixa renda estão muito felizes e continuam com volumes de lançamento”, afirma o gestor da 4Um. “Apesar desse aumento de estoque, as vendas estão indo bem”, completa.

Possíveis impactos

Dedini ressalta, porém, que o indicador de vendas sobre oferta (VSO), que mede o percentual de unidades vendidas em relação ao total disponível, pode ser temporariamente impactado.

“Talvez tenhamos um lapso temporal nas vendas sobre oferta, porque há os empreendimentos concluídos e também novos lançamentos, que entram no denominador”, explica Dedini. “Haverá uma redução de VSO, mas temporária, porque as vendas estão indo bem o suficiente para manter o VSO saudável”, completa.

A avaliação de Dedini é compartilhada por Luiz Antonio França, presidente da Abrainc (Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias), de acordo com a XP Investimentos, que se reuniu com o executivo. Em relatório publicado em 22 de agosto, Ygor Altero, analista da corretora, aponta que o ciclo de vendas deve ser mais racional daqui para frente, com a VSO desacelerando, mas que a precificação deve ser mais assertiva.

Outro ponto de atenção, na avaliação de Daniel Namur, é a possibilidade de as companhias começarem a vender unidades em estoque com desconto, o que impactaria a margem bruta.

“Com os lançamentos em um patamar ainda alto, isso traria um excesso de estoque no mercado, o que se traduziria em descontos nesses imóveis, para que as incorporadoras não fiquem carregando esse estoque nos seus balanços”, explica.

Isso porque, quando a empresa fica com unidades em estoque, ela precisa arcar com custos como condomínio e IPTU, diz o analista, o que pode impactar a linha de despesas.

Essa preocupação, inclusive, foi identificada por Daniel Gasparete, André Dibe, Bruna Breunig e Alejandro Fuchs, analistas do Itaú BBA, em uma pesquisa com CEOs do setor publicada em 16 de agosto. “Em termos de estoque, parece haver preocupação crescente sobre os níveis em alta e o alto custo de carregamento associado em um ambiente de taxa de juros alta”, dizem.

Para Dedini, porém, esse ponto não é tão relevante. “Quando a empresa tem cerca de 30% de unidades não vendidas em um mesmo empreendimento, o custo de carrego não é tão alto. E é o que temos visto com mais frequência. Então esse custo de carrego não nos preocupa”, afirma.

Aceleração

Apesar de discordarem sobre os potenciais impactos dessa construção de estoques, ambos os analistas consultados pela Agência TradeMap concordam que a tendência é que os lançamentos continuem acelerados.

Isso porque, na visão de Namur, as empresas ainda estão com estoques de terrenos elevados, que foram comprados no passado.

De um lado, o analista da AZ Quest acredita que a demanda deverá seguir pressionada no curto prazo, diante das taxas de juros ainda elevadas. “Com juros mais altos os bancos têm subido as taxas de financiamento, então fica menos atrativo adquirir um imóvel”.

“Com esse cenário, elas vão acabar continuando a lançar um pouco mais, e o descompasso entre lançamento e vendas vai crescer, naturalmente trazendo aumento de estoque”, afirma Namur.

Para Dedini, por outro lado, ainda que os bancos privados possam estar cobrando taxas de financiamento mais altas, parte desse vazio vem sendo preenchido pela Caixa Econômica Federal, principalmente por meio do Casa Verde e Amarela, o que deve sustentar um bom volume de vendas para as incorporadoras de baixo padrão.

Namur concorda que, ainda que a tendência seja negativa para a média das empresas, as companhias voltadas para o baixo padrão tendem a se sair melhor. “A baixa renda tende a ter uma demanda um pouco mais resiliente do que média e alta renda, porque existe um limite de taxa de financiamento, e as mudanças no CVA acabam contribuindo”, afirma.

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