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BDRs: dois anos após liberação para pessoas físicas, índice despenca 31% em 2022

BDRX, benchmark dos recibos de ações de empresas internacionais, caiu 28% em 12 meses, em meio à baixa das bolsas globais

Foto: Shutterstock

Depois de serem liberados para todos os investidores da B3 e passarem por uma onda de valorização, os BDRs (sigla de Brazilian Depositary Receipts) praticamente voltaram ao mesmo patamar de quando eram restritos a investidores qualificados.

Desde outubro de 2020, os recibos que permitem a negociação de ativos internacionais na Bolsa brasileira passaram por uma montanha-russa.

Num primeiro momento, o movimento foi de alta. De outubro de 2020 até dezembro de 2021, quando a valorização atingiu o pico, o BDRX, índice que reúne os principais papéis deste tipo, acumulou avanço de 37%.

A entrada em 2022, porém, não trouxe bons ventos. Acompanhando a deterioração da economia global, os BDRs passaram para o campo negativo. Desde o início do ano, o BDRX já caiu 31,1%. Com isso, 2022 marca o primeiro ano negativo para o índice desde 2016.  

Ainda vale a pena investir em BDRs?

Além do mercado pouco favorável, a recente expansão de plataformas que oferecem acesso direto às ações nas Bolsas internacionais afetou os investimentos em BDRs. Mas mesmo com esses desafios, analistas afirmam que os papéis ainda são uma opção interessante, principalmente para investidores menos experientes.

Bruno Mori, planejador financeiro e sócio fundador da Sarfin, ressalta que a recente queda nos preços abre oportunidade para quem investe visando no longo prazo.

A escalada dos juros americanos – um dos motivos pelos quais os BDRs despencaram neste ano – deve se prolongar até meados de 2023, quando é esperado um movimento inverso na política monetária.

“A relação de preços das ações com taxa de juros é inversa: quando as taxas caem, a tendência é que as ações ganhem valor. Focando o longo prazo, é uma oportunidade boa de compra para se manter em carteira”, destaca.

O principal meio de começar a investir em BDRs é inserir gradualmente os papéis na carteira para se habituar ao ritmo do mercado internacional. Também é fundamental buscar diferentes segmentos e não deixar mais do que 20% do portfólio em empresas estrangeiras.

Romero de Oliveira, head de renda variável da Valor Investimentos, destaca que os trâmites burocráticos exigidos para investir diretamente no mercado internacional, como a remessa de valores e declarações tributárias, tendem a fortalecer os recibos de ações.

“O BDR é muito mais cômodo em centralizar esses investimentos em um lugar só, e muitos investidores buscam essa facilidade”, pontua.

Celso Pereira, diretor de investimentos da Nomad, também pontua que os BDRs podem ser explorados por segmento de investidores institucionais, como fundos de pensão, que, por questões regulatórias, não podem acessar diretamente o mercado internacional.

“O brasileiro ainda investe muito pouco no exterior. Há muita gente para ser educada, principalmente quando o mercado se recuperar”, afirma. “Ainda há toda uma cadeia de valor que pode ajudar os BDRs”.

Valor de mercado cai, mas volume diário sobe

Em novembro de 2020, primeiro mês em que todos os investidores puderam investir em BDRs, o valor de mercado destes papéis medido pelo BDRX era de R$ 9,4 bilhões. Em dezembro de 2021, a cifra alcançou um recorde de R$ 24,1 bilhões.

Desde então, o valor de mercado dos BDRs caiu e chegou a R$ 14,2 bilhões em junho, último mês com dados disponíveis pela Bolsa de Valores.

O volume de negócios, porém, seguiu aumentando sem parar, praticamente dobrando a cada ano. Em 2020, o giro financeiro das operações com BDRs foi de R$ 96,5 milhões, e no ano seguinte passou para R$ 230 milhões. Em 2022, está em R$ 401,2 milhões.

O movimento é resultado da maior entrada de investidores do mercado e num consequente aumento nos negócios de compra e venda de BDRs. Dados de setembro mostram que o número de investidores em BDRs não patrocinados atingiu 363 mil cadastros, alta de 18,6% acima do registrado em dezembro do ano passado.

Como se comportaram os BDRs

Atualmente, há 134 componentes no BDRX. Das dez opções com maior volume médio diário negociado, todas são do segmento de tecnologia e nenhuma teve valorização neste ano, segundo dados atualizados até o fim da semana passada.

A Tesla (TSLA34), empresa com maior peso no índice e que registra o maior volume diário de negócios (R$ 64,4 milhões), registra queda de 45,4% nos preços de seus BDRs desde o início do ano. O pódio ainda é integrado por Mercado Livre (MELI34), com giro diário de R$ 64,3 milhões e desvalorização de 42,8%, e pela Apple (APPL34), que movimenta R$ 20,7 milhões diariamente e registra queda de 24,2% nos preços.

Entre as dez opções com maior volume de negócios, a desvalorização mais expressiva é da Meta (M1TA34) – antigo Facebook -, cujo preço do BDR caiu 63,8% desde o início deste ano.

Os especialistas ressaltam que as opções de tecnologia devem se manter em evidência no próximo ciclo de valorização. O espaço, porém, deve ser dividido com outros setores, principalmente os chamados da “economia tradicional”.

“Estamos vivendo uma rotação setorial, saindo de uma economia nova, como a tecnologia, e indo para empresas mais tradicionais, como petróleo, indústria e infraestrutura”, pontua Pereira.

Para Mori, outros setores tradicionais, como varejo e commodities, devem estar na carteira do investidores que focam no horizonte mais longo.

“A tecnologia foi a grande tendência nos últimos tempos. É difícil afirmar que vão continuar sendo, ao mesmo tempo em que é difícil não imaginar como algo relevante no período. A principal dica é não concentrar em um único setor”, afirma o planejador financeiro.  

Antiga demanda dos investidores brasileiros

O movimento de euforia e queda dos BDRs se correlaciona ao desempenho dos principais índices de ações dos Estados Unidos. Em 2020 e 2021, o S&P 500 subiu cerca de 16% e 26%, respectivamente. Já na parcial deste ano, o índice desvalorizou 21%.

O boom inicial foi deflagrado pelo aumento inédito de liquidez nos mercados após a injeção massiva de dinheiro ao redor do mundo. A política foi adotada para mitigar os efeitos da pandemia da Covid-19 nas economias.

Parte dos recursos disponíveis acabou direcionado ao mercado financeiro, em especial para as empresas de tecnologia, setor que mais lucrou com as mudanças de hábitos impostas pelas restrições da crise sanitária.

Além do acesso mais fácil ao dinheiro, Pereira cita a evolução da educação financeira dos brasileiros e os incentivos da B3 como fatores que impulsionaram a arrancada do mercado de BDRs.

“Houve uma reação positiva no mercado. O aumento de alternativas era uma antiga demanda dos investidores do varejo. Essa mudança criou um mecanismo seguro para se investir no exterior”, afirma.

Em paralelo a demanda reprimida por novos meios de investimento, Oliveira, chama atenção pela melhor posição dos índices internacionais em relação aos brasileiros à época.

“O mercado americano vinha com uma performance muito boa, e por conta dessa novidade dos BDRs, os investidores pessoa física aumentaram a exposição nesses mercados, enquanto o cenário brasileiro estava mal”, explica.

Cenário global reverte onda positiva

A euforia dos investidores perdeu ímpeto na virada do ano, quando parte dos analistas passou a enxergar a necessidade de redução da liquidez para conter o crescente aumento dos preços em escala global.

A previsão se mostrou correta, e em março o Fed (o banco central americano) elevou os juros pela primeira vez em quatro anos. Aliado ao fator monetário, a invasão da Ucrânia por tropas da Rússia, no fim de fevereiro, aumentou ainda mais o sentimento de cautela entre os investidores.

O temor de a economia global entrar em processo de recessão levou à fuga dos investidores da renda variável. Ao mesmo tempo, a escalada dos juros refletiu na migração dos aportes para opções em renda fixa, que começaram a pagar mais com risco menor.

Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos, pontua que a saída dos investidores dos BDRs reflete um movimento visto em outras opções ligadas à renda variável.

“Como a renda fixa começou a chegar em patamares de [rendimento] mais de 1% ao mês no primeiro semestre, vimos o volume de ações sendo penalizado. Vimos captação negativa em fundos de ações, e isso não ia ser diferente com os BDRs”, afirma.

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Na mesma linha, Pereira destaca que gigantes do mercado de tecnologia, como Microsoft e Apple, registraram quedas significativas no período, o que acabou impactando no desempenho dos recibos destas ações.

“As opções mais populares e com maior volume de negociação são as de tecnologia. Com o mercado ruim de forma geral, principalmente neste setor, é normal a reavaliação e mudança de portfólio por parte dos investidores”, diz.

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