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Bancos encaram risco de inadimplência maior, mas iniciativas do governo podem servir de proteção

Segmento digital deverá sofrer mais com possível aumento de calotes, segundo analistas

Foto: Shutterstock

Depois de registrarem lucros recordes no quarto trimestre de 2021 e apresentarem projeções de mais crescimento para este ano, os bancos brasileiros se depararam com um desafio: a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que já mostra como efeito uma maior pressão inflacionária em todo o mundo. Esse cenário de aumento de preços e perda do poder aquisitivo da população leva ao risco de elevação da inadimplência dessas instituições na oferta de crédito.

A expansão das carteiras desse produto pode ficar mais lenta como forma de as instituições buscarem se proteger diante da piora desse quadro. Ao mesmo tempo, iniciativas do governo para estimular a economia tendem a ser uma barreira a um quadro de crescimento de calotes.

Os bancos digitais, em especial, têm a influência de outro fator nesse contexto. A alta de juros, remédio utilizado em grandes doses para o combate à inflação neste momento no Brasil, encarece o crédito para eles próprios. Como dependem de investimentos para crescer, essas instituições financeiras podem ter que reduzir o ritmo de avanço e ter as ações penalizadas na Bolsa de valores.

Inflação pode aumentar a inadimplência?

Os recursos oriundos dos estímulos econômicos implementados pelo governo ao longo de 2021, como forma de minimizar os efeitos da pandemia de coronavírus, foram utilizados, em parte, para quitar dívidas do passado em vez serem utilizados para o consumo de produtos e serviço.

“Em 2020, quando os auxílios estavam sendo disponibilizados para a população, todos os analistas de bancos eram reticentes em pensar que eles seriam utilizados para outra coisa que não fosse consumo. Mas o que vimos foi que os auxílios também serviram para pagar dívidas mais caras”, diz Bruno Gonçalves, analista de financials da Moat Capital.

Isso fez os índices de inadimplência dos grandes bancos brasileiros irem a patamares inferiores à média do setor, e a expectativa do mercado era que, com a redução do auxílio, esses níveis começassem a caminhar para uma normalização.

Na tabela abaixo, é possível ver a dinâmica desses indicadores dos maiores bancos brasileiros nos quartos trimestres de 2019, 2020 e 2021.

Banco Inadimplência em 2019 Inadimplência em 2020 Inadimplência em 2021
Itaú (ITUB4) 3,0% 2,3% 2,5%
Santander (SANB11) 2,9% 2,1% 2,7%
Bradesco (BBDC4) 3,3% 2,2% 2,8%
Banco do Brasil (BBAS3) 3,27% 1,90% 1,75%
Fonte: Dados dos balanços das companhias, elaborado pela Agência TradeMap

Na divulgação dos balanços, todos os grandes bancos afirmaram que o aumento da inadimplência já era esperado, como antecipado pelo mercado. Outro ponto que parece consenso entre as instituições financeiras é que esta alta vem sendo puxada pelo segmento de crédito para pessoa física.

De acordo com o relatório de balanço do Itaú, a redução da inadimplência no segmento corporativo ajudou a compensar os aumentos no braço de crédito para pessoas físicas, principalmente nas carteiras de veículos, cartão de crédito e crédito consignado. Em dezembro do ano passado, o segmento de pessoa física do banco correspondia a 40,5% da carteira de crédito, contra 29,4% em 2020.

O Santander também diz que o mix de produtos de crédito causou a alta de inadimplência – o segmento de pessoa física correspondia a 52,9% da carteira de crédito do banco no fim de 2021, ante 42,3% em 2020.

No caso do Bradesco, o braço de pessoa física passou a corresponder a 39,5% da carteira de crédito ao fim de 2021, contra 37,9% em 2020.

O Banco do Brasil também teve crescimento na carteira de pessoa física, passando de 30,9% em dezembro de 2020 para 33,7% no mesmo mês de 2021. Por outro lado, o índice de inadimplência da instituição foi o único entre os grandes bancos a apresentar redução no período. A gestão do BB credita esse movimento, entre outros fatores, ao sucesso de suas campanhas de renegociação de dívidas.

Mais dinheiro na carteira

Se por um lado, como mencionado, uma escalada na inflação cria riscos de aumento de inadimplência, novas medidas do governo federal para estimular a economia podem colocar mais recursos à disposição dos consumidores.

De acordo com relatório da equipe de analistas do banco de investimentos UBS-BB, iniciativas anunciadas pelo governo neste mês devem injetar mais de R$ 150 bilhões na economia.

O conjunto de medidas inclui aumento no percentual da renda que pode ser comprometido com o empréstimo consignado, saques extraordinários do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), antecipação do 13º salário e um novo programa de microcrédito.

“Em suma, vemos essas medidas como positivas para a dinâmica de qualidade dos ativos dos bancos brasileiros no curto prazo”, diz o UBS-BB. A expectativa é que essas ações adiem a alta esperada da inadimplência.

Também em relatório, os analistas do Itaú BBA acrescentam que os índices de cobertura em níveis recorde dos grandes bancos devem absorver parte do impacto do aumento dos níveis de inadimplência. Esse indicador no Banco do Brasil, por exemplo, encerrou 2021 a 325% – abaixo do pico de 348,3% registrado em 2020, mas 66% acima do nível pré-pandemia, em dezembro de 2019.

Além disso, diz Gonçalves, da Moat, a postura do Banco Central diante do aumento da inflação ameniza as preocupações. Nesse sentido, a elevação da taxa básica de juros (Selic) é positiva para os bancos. Assim, a percepção do analista é que essas instituições financeiras estão protegidas para passar por esse momento.

“Agora, um risco a mais é se o cenário de inflação ficar muito mais deteriorado do que estamos esperando. Mas o Banco Central está superagressivo em subir taxas de juros”, afirma o analista. “Obviamente, todos os setores podem ser afetados se a guerra perdurar por mais tempo, porque isso afeta atividade e percepção de risco. Começa uma dinâmica de ciclo econômico muito pior”, completa

Bancos digitais podem sofrer mais

Na análise de Gonçalves, o cenário não deve ter impactos diferentes sobre cada um dos grandes bancos. “Os bancos do Brasil já estão muito consolidados e muito grandes. Eles meio que caminham juntos”, destaca.

O cenário para bancos digitais e bancos menores, por outro lado, pode ser um pouco mais difícil, na visão dele.

Os bancos médios, tipicamente “de nicho”, enfrentam dificuldades com o aumento da taxa de juros, ao contrário dos grandes bancos, porque possuem custo de captação mais elevado. Já para os bancos de natureza digital, a Selic em alta significa que o custo de seus investimentos para crescer e entregar resultados positivos no futuro aumenta.

Além disso, por terem uma base de clientes relativamente recente e por, muitas vezes, terem um foco maior em clientes de baixa renda, estes bancos digitais estão mais expostos a riscos de aumento de inadimplência, segundo Gonçalves.

A equipe de analistas do Itaú BBA também aponta que a recuperação dos níveis de inadimplência deve ser mais alta nos segmentos de baixa renda e em linhas de crédito limpo, como cartões de crédito e empréstimos pessoais, o que impacta os bancos digitais com mais força.

Banco Inadimplência 2019 Inadimplência 2020 Inadimplência 2021
Banco Inter (BIDI11) 4,4% 2,8% 2,8%
Nubank (NUBR33) 4,3% 3,6% 3,5%
Banco Pan (BPAN4) 5,9% 5,5% 6,3%
Fonte: Dados dos balanços das companhias, elaborado pela Agência TradeMap

De acordo com os balanços dos principais bancos digitais, esse segmento está de fato mais exposto ao crédito para pessoa física do que os bancos tradicionais. , Ao fim de 2021, o segmento de pessoa física correspondia a 60,1% da carteira do Inter, 100% do portfólio do Nubank e 99% do total do Banco Pan.

Apesar disso, como demonstra a tabela, os níveis de inadimplência dos principais bancos digitais brasileiros têm se mantido estáveis depois da queda observada em 2020. A exceção é o Banco Pan, que afirma que o aumento do indicador deve-se à maior diversificação do portfólio de crédito, com a inclusão de novos produtos.

Na opinião de analistas do UBS-BB, as medidas anunciadas pelo governo federal são particularmente positivas para os bancos com maior exposição a empréstimos pessoais e indivíduos de baixa renda.

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