O Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos, ainda prefere ter cautela com a remoção dos estímulos à economia, mesmo diante da inflação historicamente alta no país. No entanto, se prepara para apertar a política monetária com mais rapidez se isto for necessário.
A ata da mais recente reunião do Fed, ocorrida no início de novembro, mostrou que o comitê de política monetária da instituição passou a reconhecer o risco de preços mais altos por mais tempo – em linha com as expectativas do mercado.
“Seria apropriado transmitir menos certeza sobre a trajetória de inflação”, diz um trecho do documento, que no entanto reiterou a perspectiva de que os fatores por trás da alta dos preços “devem ser transitórios”.
O comitê também reconheceu que tanto a inflação quanto o nível de emprego estavam dentro dos critérios que justificavam uma redução no estímulo que o Fed proporciona à economia, mas apenas uma ala minoritária – “alguns participantes” da reunião, segundo a ata – defenderam uma remoção mais intensa destes incentivos.
Além disso, “vários participantes notaram que o comitê deve estar preparado para ajustar o ritmo de compras de ativos e para elevar a taxa de juros mais cedo” do que o mercado prevê se a inflação continuar acima da meta de 2% ao ano.
Como as informações divulgadas ficaram dentro do que havia sido sinalizado pelo banco central no comunicado publicado em 3 de novembro, o mercado reagiu pouco à ata.
O S&P 500, principal índice acionário dos Estados Unidos, continuou apresentando leve alta após a divulgação do documento. As taxas de juros dos títulos da dívida do país com vencimento em dois anos, mais suscetíveis a mudanças na política monetária, também se moveram pouco, pairando perto de 0,637%.
Expectativa mudando
A ala do Fed favorável a uma política monetária mais restritiva ainda é minoritária, como destacou o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, em sua conta no Twitter.
“Inflação citada 80 vezes, um mea culpa um tanto tosco sobre a temporariedade da inflação, demonstração de um Fed se voltando à uma posição mais ‘realista’, porém o peso do pombal continua grande na instituição”, disse ele. “Pombal”, no caso, é uma referência ao termo “dove”, apelido dado aos membros do Fed mais inclinados à manutenção de estímulos monetários.
Ainda assim, as apostas de alta nos juros dos Estados Unidos aumentaram após a divulgação do documento. Segundo a Fedwatch Tool, ferramenta do CME Group que mede expectativas a este respeito, o mercado aumentou a aposta de que as taxas subam em meados do ano que vem.
Ontem, os investidores previam possibilidade de 38,0% de os juros subirem 0,25 ponto porcentual em maio de 2022. Hoje, após a divulgação da ata, este percentual era de 42,5%. A expectativa de alta de juros em março do ano que vem também aumentou, embora continue sendo uma aposta minoritária – a probabilidade passou de 22,4% para 28,2%.
Como os juros nos EUA afetam o Brasil
Quando os juros sobem em países desenvolvidos, em especial na maior economia do mundo, que é a americana, a tendência é que aconteça um fenômeno batizado de “flight-to-quality” (quando investidores deixam ativos de maior risco, como os de países emergentes como o Brasil, para buscarem papéis considerados mais seguros).
Como os títulos da dívida pública dos Estados Unidos, conhecidos como treasuries, são considerados o ativo mais seguro do mundo, o interesse por eles sobe consideravelmente quando passam a pagar mais ao investidor.
Nessas horas, os investidores comparam os juros e inflação dos Estados Unidos com esses mesmos indicadores para Brasil, calculando o chamado diferencial de juros. A partir dessas informações, avaliam o que vale mais a pena para alocação de recursos em termos de risco e retorno.
Os estímulos dados pelo Fed à economia, como compra mensal de títulos corporativos, também são observados de perto. Com mais estímulos, há mais liquidez (ou seja, mais dinheiro circulando no mercado). Isso aumenta o apetite a risco, e possibilita que mais recursos sejam aplicados em economias emergentes como a nossa.
Se os estímulos são reduzidos, a tendência é que “sobre” menos dinheiro para países como o Brasil. Na última reunião do Fomc, o colegiado decidiu dar início ao chamado tapering, que é o processo de redução gradual dessas compras de títulos.
Em momentos de elevação de juros ou retirada de estímulos, as decisões do Fed tendem a desvalorizar ativos nacionais, como ações negociadas em Bolsa. Além disso, ciclos de aperto monetário nos EUA tendem a elevar os juros futuros no mundo todo, incluindo o Brasil.
Fed pode elevar juros em 2022
Na última reunião do Fomc, em 3 de novembro, a taxa básica de juros dos Estados Unidos foi mantida no intervalo entre zero e 0,25% ao ano. Analistas acreditam que o Fed passará a subir os juros em meados do ano que vem, mas cada vez mais os investidores estão apostando que esse processo de aperto monetário comece antes disso.
A recondução do presidente do Fed, Jerome Powell, para um segundo mandato de quatro anos a partir do ano que vem reforçou essa possibilidade.