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Varejistas concentram as maiores quedas dentro do Ibovespa no ano: oportunidade ou risco?

Analistas não veem fundamento na baixa e atribuem movimento ao cenário macroeconômico

Marcado por um contexto macroeconômico desafiador, de inflação elevada no Brasil e de aumento da taxa básica de juros, o ano de 2021 tem sido de pressão para empresas de varejo com ações listadas na B3.

Para se ter uma ideia, das dez maiores quedas do Ibovespa no ano (até o dia 21 de outubro), cinco eram de companhias do setor varejista, segundo levantamento feito pelo TradeMap. São elas:

  • Via (VIIA3): -57,8%
  • Americanas (AMER3): -54,99%
  • Grupo Pão de Açúcar (PCAR3): -54,01%
  • Magazine Luiza (MGLU3): -50,78%
  • Lojas Americanas (LAME4): -49,59%

 

No mesmo período, o principal índice da bolsa brasileira registrou queda de 9,47%.

Esse recuo, no entanto, não chega a ser uma surpresa, já que alguns indicadores têm apontado retração no setor. Um exemplo parte da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) de agosto, que apresentou queda mensal de 3,1% do volume de vendas no varejo, embora acumule alta de 5,1% no ano.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), seis das oito atividades pesquisadas em agosto reportaram taxas negativas, com destaque para o grupo de “outros artigos de uso pessoal e doméstico” – atividade composta, por exemplo, por grandes lojas de departamento, como Lojas Americanas.

Volume de vendas no varejo IBGE

Pedra no sapato?

Por se tratar de um setor cíclico, ou seja, diretamente vinculado aos ciclos da economia, o varejo é influenciado por variações na inflação, na taxa de juros, no câmbio e outros fatores macroeconômicos, como desemprego e nível de renda.

E em um cenário de inflação elevada, como o atual, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) busca aumentar a Selic como forma de controlar a alta nos preços – o que se reflete no poder de compra dos brasileiros e, consequentemente, sobre seu nível de consumo.

Inflacao acumulada nos ultimos 12 meses IBGE

Em suma, tanto a inflação elevada quanto a Selic mais alta levam o consumidor a gastar menos, seguindo a lógica de poupar mais dinheiro e comprar somente o essencial, como aponta Jessica Sprovieri, analista da casa de research Inside.

“O aumento da taxa de juros impacta na oferta de crédito e, consequentemente, no nível de consumo das famílias, principalmente em um momento sazonalmente forte para o varejo. Além disso, o aumento da Selic se reflete na taxa de desconto, que, por consequência, pressiona o valuation [valor de mercado] de empresas de crescimento”, ressalta.

Desde março deste ano, o Copom começou a elevar a taxa básica, que estava na mínima histórica de 2,00% ao ano. Desde então, a Selic acumula alta de 4,25 pontos percentuais, para 6,25%, %, e é esperado novo aumento de pelo menos um ponto percentual no próximo encontro, marcado para os dias 26 e 27 de outubro.

Mudanças de hábitos

Desde o início da pandemia, em março de 2020, as varejistas passaram por adaptações para enfrentar as dificuldades geradas pela crise financeira. A principal mudança foi a migração parcial para o e-commerce, uma vez que as lojas físicas ficaram de portas fechadas por um bom tempo por conta do isolamento social – sendo utilizadas, inclusive, como “minicentros de distribuição” dos produtos.

Segundo levantamento realizado pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), em conjunto com a Neotrust, em 2020, o crescimento nas vendas online foi de quase 70% em relação a 2019.

Empresas como o Magazine Luiza, por exemplo, são reconhecidas pelo alto investimento na expansão digital. Durante os três primeiros meses deste ano, as vendas online da companhia tiveram avanço anual de 115% e representaram cerca de 70% das vendas totais. Entre abril e junho de 2021, o e-commerce da varejista cresceu 46%, atingindo 72% das vendas totais.

Sua concorrente, a Via, dona das Casas Bahia e do antigo Ponto Frio, também tem focado em estratégias digitais para melhorar seu desempenho nas vendas. Durante o segundo trimestre, a companhia obteve expansão anual de 36% no volume de vendas digitais brutas, para R$ 7,4 bilhões.

“A exigência do público por entregas rápidas e atendimentos personalizados fez com que as empresas se movimentassem e investissem muito nessas operações [de e-commerce]. Vimos um cenário bastante aquecido para M&A [fusões e aquisições], parcerias e inovações, o que contribuiu para reforçarmos nossa percepção positiva quanto ao futuro do setor”, analisa Sprovieri.

Quando se trata de investimentos, de janeiro para cá, o Magalu adquiriu empresas como a plataforma KaBuM! ao seu catálogo, em uma operação que marcou sua entrada no mercado de games e eletrônicos. Um mês antes, a varejista havia lançado seu programa “Piscou Chegou”, que promete a entrega de mercadorias em uma hora após a efetivação da compra.

Um ponto levantado pelo analista Fernando Ferrer, da Empiricus, é que, com essas mudanças de hábitos, o e-commerce deu um verdadeiro “boom” para as varejistas, fazendo com que os resultados dessas companhias saltassem.

As vendas totais do Magazine, por exemplo, chegaram ao patamar de R$ 43,5 bilhões em 2020, crescimento de 59,6% frente a 2019.

A Via, por sua vez, superou a marca de R$ 37,3 bilhões de janeiro a dezembro do ano passado, expansão anual de quase 20%.

Já a Americanas encerrou 2020 com vendas de R$ 27,7 bilhões, alta de 47,6% em comparação ao ano cheio de 2019.

Em meio a esses resultados, o mercado passou a considerar que as varejistas teriam um crescimento muito mais forte em 2021. Contudo, Ferrer afirma que os investidores não contavam com fontes de pressão: uma reabertura da economia mais lenta que o previsto e discussões acaloradas sobre mudanças no auxílio emergencial.

Diante disso, o analista da Empiricus ressalta que o mercado passou a projetar menor expansão para essas companhias, principalmente para o Magalu, que teve um ajuste de 70% para 20% na expectativa de crescimento de vendas do terceiro trimestre deste ano, segundo levantamento feito pela consultoria americana YipitData.

Ações em queda na bolsa

De acordo com Ferrer, a menor projeção de crescimento no faturamento está vinculada à queda das ações na bolsa brasileira, além de problemas apresentados nas cadeias de suprimento e da alta do dólar.

“Outro fator que deve ser levado em consideração é o receio de alta de juros nos Estados Unidos. Investidores passaram a procurar empresas que tenham um fluxo de caixa mais no presente, ou seja, boas pagadoras de dividendos, empresas de commodities e bancos – que se beneficiam com a alta dos juros. Já as companhias de crescimento, como de e-commerce, são colocadas de lado”, diz.

No caso específico de Magalu, a analista da Inside chama atenção para os fortes resultados divulgados nos últimos trimestres e minimiza o movimento em bolsa, mais atrelado ao cenário macroeconômico do que a fundamentos.

“Devido ao seu ótimo histórico de entrega, os múltiplos da companhia sempre foram mais altos que os dos pares do setor, e qualquer correção acaba sendo mais acentuada em empresas com esses múltiplos. Essa queda dos papéis é uma resposta de curto prazo do mercado e, operacionalmente falando, não vemos como algo preocupante”, diz.

Com foco no GMV (volume bruto de mercadoria, em português), um dos principais indicadores para analisar o desempenho do setor de varejo, o Magazine Luiza, a Via e a Americanas reportaram crescimentos no segundo trimestre.

No caso do Magalu, o GMV total – que conta tanto com vendas em lojas físicas quanto com o e-commerce – cresceu 60,5% em comparação ao segundo trimestre de 2020. Já a Via apresentou alta de 51%, e a Americanas, de 33%.

GMV do segundo trimestre de 2021

 

MGLU3

VIIA3

AMER3

GMV lojas

R$ 3,9 bi

R$ 5 bi

R$ 2,7 bi

GMV online

R$ 9,8 bi

R$ 6,3 bi

R$ 9,8 bi

1P¹

R$ 6,8 bi

R$ 4,6 bi

R$ 4,8 bi

3P²

R$ 2,9 bi

R$ 1,6 bi

R$ 5,1 bi

GMV total

R$ 13,7 bi

R$ 11,4 bi

R$ 12,6 bi

Fonte: Empresas
¹ venda direta pela companhia
² venda pelo marketplace (parceiros)

Com a proximidade das festas de final de ano e da “Black Friday”, o setor pode ter as vendas alavancadas, mas não a ponto de ajudar na recuperação das perdas dos papéis na bolsa neste ano, aponta Sprovieri.

As gigantes do setor já começaram a preparação no marketing: a Americanas aposta em um show ao vivo de descontos por meio de lives, chamado de “Red Friday”, enquanto Via e Magalu prometem cupons e cashback.

Na metade deste ano, a Americanas passou ainda por uma reorganização societária que não agradou tanto o mercado, destaca o analista da Empiricus.

A antiga B2W e a Lojas Americanas uniram os negócios físicos e digitais, criando a “americanas s.a.” – tudo em minúsculo mesmo, como estratégia de marketing. Com isso, os papéis ordinários da B2W (BTOW3) passaram a ser negociados como “AMER3” na B3.

A união já era esperada pelo mercado, mas a estrutura escolhida foi um pouco confusa tanto para analistas quanto para o investidor pessoa física. Antes, a Lojas Americanas detinha aproximadamente 70% do capital da B2W; após a reestruturação, foi o braço digital que incorporou a Lojas Americanas.

Dessa forma, a parte operacional e digital do negócio passou a fazer parte da “nova” Americanas, ou seja, a antiga B2W, enquanto a Lojas Americanas se tornou uma holding, detendo apenas investimentos na nova estrutura.

Apesar de o analista Enrico Cozzolino, da Levante Investimentos, ressaltar que a companhia tem investido em um hub completo ao cliente, o que gera bastante valor à empresa ao longo prazo, o mercado não viu com bons olhos essa segmentação, que esperava por uma só empresa.

Como resposta à reação negativa dos investidores, a Americanas e a Lojas Americanas decidiram recentemente passar por uma nova estruturação: as companhias pretendem unir as bases acionárias no Novo Mercado da B3 e, posteriormente, listar as ações da Lojas Americanas nos Estados Unidos.

Perspectivas

Quando se trata do setor de varejo, a Empiricus tem duas preferidas: Magazine Luiza e Mercado Livre (MELI34).

A casa de análise recomenda uma operação conhecida como long & short, que consiste em comprar ações do Magalu e Mercado Livre e ficar “vendida” (com aposta na queda dos preços) nos papéis da Via e da Americanas, na mesma proporção.

“Com isso, não ficamos com posição direcional no setor neste momento de alta na taxa do Treasuries [títulos de dívida pública americana] de dez anos e, ao mesmo tempo, apostamos no desempenho relativo das líderes do e-commerce contra Via e Americanas, que têm apresentado maior dificuldade para crescer e melhorar sua logística e nível de serviço”, afirma Ferrer.

Já a Inside tem recomendação de compra para todas as companhias abordadas neste artigo. “Com o desconto atual, vemos com bons olhos o investimento nas companhias deste segmento”, afirma Sprovieri.

Para os papéis do Magalu, a casa tem preço-alvo de R$ 32,40 para dezembro deste ano; para as ações da Via, de R$ 20; para os ativos da Americanas, de R$ 86; e para a Lojas Americanas, de R$ 10.

Atualmente, as top picks da Inside são Lojas Renner (LREN3) e Mercado Livre. “As companhias do setor estão fazendo movimentos interessantes, investindo em logística e nos canais digitais, transformando suas plataformas em ecossistemas completos que atendem a grande parte das necessidades dos seus clientes. Em um momento de consolidação, achamos que esses devam ser nomes vencedores no longo prazo.”

No mesmo caminho da Inside, a Levante recomenda compra para os papéis MGLU3 e VIIA3, com preços-alvo de R$ 28 e R$ 18 também para dezembro, respectivamente. A casa de análise não cobre os ativos da Americanas e da Lojas Americanas.

Na tabela abaixo, você pode conferir o consenso da Refinitiv sobre os ativos analisados, além da mediana de preço-alvo para cada um deles.

Consenso da Refinitiv

Consenso Refinitiv

COMPRAR

MANTER

VENDER

Preço-alvo
mediana

MGLU3

8

7

R$ 26,00

VIIA3

8

8

1

R$ 17,26

AMER3

10

6

R$ 80,00

LAME4

13

2

R$ 14,06

Fonte: Refinitiv (em 21/10/2021)

Você pode analisar mais indicadores dessas companhias na Lâmina de Empresas do TradeMap Web

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