Brasil tem mercado para IPOs, mas janela de 2022 deve abrir no 2º semestre

Redução na incerteza no decorrer do ano deve destravar operações de abertura de capital

Foto: B3 / Divulgação

A perspectiva pouco promissora para a economia brasileira em 2022, o nível elevado de juros e o alto teor de incerteza embutido nas previsões para indicadores e eventos relevantes – entre eles as eleições presidenciais – afastaram do mercado empresas interessadas em abrir capital. Especialistas, porém, apontam que a janela para as ofertas de ações pode reabrir na segunda metade do ano, quando haverá um pouco mais de clareza sobre o cenário político-econômico do país.

Em 2021, 46 empresas fizeram suas ofertas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) e estrearam na B3, movimentando quase R$ 66 bilhões – um recorde em termos de valor. O mercado estava aquecido pela perspectiva de retomada do crescimento econômico após a vacinação da população contra a Covid-19, e os juros marcavam sua mínima histórica, embora tenham começado a subir gradativamente já no fim do primeiro trimestre.

Desde o início de 2022, porém, várias empresas abandonaram os planos de abrir capital. Só em janeiro deste ano 13 empresas desistiram de fazer IPOs – entre elas Madero, Cencosud Brasil e Coty Brasil. No início de fevereiro, a Cerradinho Bioenergia também jogou a toalha. A inversão de tendência está relacionada ao cenário econômico.

“São muitas as razões que fazem desse momento não propício para abertura de capital de uma empresa aqui no Brasil”, afirma Rosângela Santos, líder da comissão técnica de mercado financeiro de capitais do IBEF-SP (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo).

Segundo ela, há um cenário desfavorável ao crescimento da economia desde o segundo semestre do ano passado, composto por uma série de fatores, entre eles “as incertezas macroeconômicas, o aumento das taxas de juros no Brasil, fora do Brasil, a expectativa de aumento de juros nos Estados Unidos e a retração da liquidez”.

A edição mais recente do Boletim Focus, do Banco Central, mostrou que o mercado financeiro espera crescimento de 0,3% na economia brasileira neste ano, acompanhado por uma inflação de 5,44% – superior ao limite estipulado pelo governo para este ano, de 5,00%.

A taxa básica de juros no Brasil, chamada Selic, está subindo sem parar desde março do ano passado. Atualmente em 10,75% ao ano, a expectativa é que avance um pouco mais, alcançando 11,75% ao ano. Para fins de comparação, em fevereiro de 2020 ela estava em 2% ao ano.

Isso, na prática, aumenta o retorno oferecido ao investidor pela renda fixa – como Tesouro Direto e debêntures, por exemplo -, porque estes papéis passam a oferecer taxas maiores. Isto tende a atrair investidores para a renda fixa em detrimento da renda variável – como ações -, onde a taxa de retorno oscila.

A demanda reduzida por ações pode prejudicar empresas que queiram abrir capital, porque pode resultar em menor adesão à oferta e, consequentemente, em um preço menor para os papéis que estrearão na Bolsa.

Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimento, aponta que num momento como o atual, em que além dos juros mais altos há dúvidas sobre o cenário econômico e político, os investidores ficam mais criteriosos com o destino do próprio dinheiro. 

“Estamos com inflação alta, juros elevados, a questão fiscal sempre iminente em um ano de eleição. As pessoas tendem a não fazer grandes movimentos ou grandes apostas. Então, quando uma empresa vem ao mercado e precisa do dinheiro dos investidores, encontra um momento ruim e escasso, um cenário que não é bom para abertura de capital”, afirmou.

“Hoje as pessoas vão fazer mais conta na hora de colocar dinheiro. Elas pensam assim: você está abrindo capital e quer que eu aporte na sua empresa? Eu quero um prêmio para colocar meu dinheiro na sua empresa. Agora o jogo inverteu.”

Janela para IPOs deve melhorar no 2º semestre

Apesar das dificuldades mencionadas, os especialistas acreditam que ainda há espaço para empresas abrirem capital no Brasil, em particular na segunda metade do ano, quando a disputa eleitoral estará a pleno vapor.

Santos, do IBEF-SP, ressalta que a turbulência no mercado pode diminuir a partir do momento em que ficar mais claro se a briga pela Presidência da República se dará dentro dos cenários esperados pelos investidores.

“O mercado já precifica potencialmente um vencedor das eleições, mas quanto mais próximo, mais claro fica. Pode ser que a volatilidade do mercado reduza, e aí vai ser um cenário mais propício para abertura de capital”.

Existe também a possibilidade de empresas seguras de seu potencial buscarem estrear no mercado a despeito do atual contexto, caso estejam seguras de que conseguirão captar os valores pretendidos, como ressalta Moliterno, da Veedha Investimento.

Em 2021, apesar do volume recorde de captações em IPOs, poucas foram as companhias cujas ações de fato se valorizaram após a estreia na Bolsa. Das 46 empresas que abriram capital em 2021, apenas 11 fecharam o ano no positivo – ou cerca de 23,9%.

Atualmente, há 17 ofertas de abertura de capital em análise na CVM. É possível analisar todos elas por meio da plataforma do TradeMap. No aplicativo ou no portal, clique na aba Mercado e, em seguida, selecione “IPOs”, na barra superior da tela.

Veja a lista:

EMPRESA DATA DO PEDIDO
ALPHAVILLE S.A. 14/08/2020
INVEST TECH PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS S.A. 17/05/2021
CSN CIMENTOS S.A. 17/05/2021
TROCAFONE S.A. 02/06/2021
VIX LOGÍSTICA S.A. 27/07/2021
ALTHAIA S.A. INDÚSTRIA FARMACÊUTICA 30/07/2021
BMRV PARTICIPAÇÕES S.A. 01/09/2021
JFL HOLDING S.A. 02/09/2021
DATORA PARTICIPAÇÕES E SERVIÇOS S/A 03/09/2021
CAPTALYS COMPANHIA DE CRÉDITO 10/09/2021
INTERPLAYERS SOLUÇÕES INTEGRADAS SA 17/09/2021
SBPAR PARTICIPAÇÕES S.A. 18/10/2021
CIA RIOGRANDENSE DE SANEAMENTO 09/12/2021
TECIDOS E ARMARINHOS MIGUEL BARTOLOMEU S.A. 10/12/2021
SELF IT ACADEMIAS HOLDING S.A. 13/12/2021
LIVETECH DA BAHIA INDÚSTRIA E COMÉRCIO S.A. 15/12/2021
SENIOR SISTEMAS S.A. 01/02/2022

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