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Sergio Vale

Economista-chefe da MB Associados. É pós-doutorando pelo IEA-USP, doutor em Relações Internacionais pela USP, mestre em Economia pela Universidade de Wisconsin-Madison e membro do Grupo de Pesquisa de Economia Política Internacional do IEA-USP.

Qual o tamanho do cheque em branco a ser dado ao próximo governo?

Em cima de uma mesa preta e com um fundo preto, dados com numerais formam o ano de 2022, e o último deles virando para o 3, ao ser manipulado por um homem.

Foto: Shutterstock

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A decisão do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) em manter a Selic em 13,75% ao ano, em reunião realizada nos dias 20 e 21 de setembro, mesmo que esperada, não encerrou o ciclo de discussão sobre juros nos próximos meses.

Como a própria instituição ressalta na ata, divulgada nesta terça-feira (27), há incertezas que impedem que se veja uma queda ou mesmo alta da taxa em um espaço curto de tempo.

A cada reunião do BC a partir de agora, o foco de interesse do mercado será ver como os juros repercutem nas expectativas de inflação de 2024 especialmente, mas também como o próximo governo lidará com a questão fiscal.

A grande janela de tempo em que a autoridade monetária sinalizou como necessário para manter a Selic nesse patamar indica a preocupação essencialmente fiscal para o ano que vem. Mesmo que a indefinição sobre o próximo presidente diminua a cada dia, a incerteza permanece elevada sobre a condução da política econômica em um eventual governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), atualmente líder das pesquisas rumo ao Planalto.

De fato, será importante saber quem ocupará o cargo de ministro da Economia, ou mais provavelmente da Fazenda, já que Lula sinaliza que desmembrará o ministério em pelo menos duas ou três áreas.

Esse ministro, de toda maneira, terá muita força para propor a agenda fiscal. Se Lula mantiver seu histórico de gostar de arbitrar, prenuncia-se embates entre Fazenda e Planejamento como já ocorria no passado, na época de Antonio Palocci (ministro da Fazenda no primeiro mandato de Lula, entre 2003 e 2006).

Entretanto, naquele momento, a economia estava mais blindada dos riscos fiscais não apenas internos, mas externos, com a elevada dívida externa que tínhamos. De certa forma, havia uma percepção por parte dos economistas do PT de então que essa dívida precisava ser diminuída e valia o esforço fiscal para o alcance desse objetivo.

Quando a dívida externa deixou de ser uma questão relevante, a crise de 2008 surgiu, abriu-se a caixa de pandora fiscal e, hoje, a visão do PT é bem diferente da que o partido tinha em 2003. Dará trabalho para qualquer ministro mais de centro que poderá vir pela frente. Ainda mais porque o mundo também é mais pró-gasto, especialmente depois da crise da primeira década deste século e da pandemia de Covid-19.

A população assinará um cheque em branco?

Com gastos reprimidos nos últimos dois anos, como o salário do funcionalismo, precatórios e gastos sociais, o cheque em branco que o próximo governo pedirá não será pequeno.

Haverá uma janela fiscal em que o próximo governo provavelmente pedirá créditos extraordinários alegando a crise internacional para justificar isso enquanto se tenta aprovar uma outra regra fiscal.

Espera-se que esse controle seja crível e ao mesmo tempo mais flexível, para que seja duradouro. O grande risco, porém, é a licença para gastar que poderemos ter no ano que vem.

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Com a ideia de estimular a economia em um mundo recessivo, precisamos ter o cuidado para não repetir 2008 quando se usou da mesma justificativa para começar os gastos crescentes que levaram à crise de 2015 e 2016.

Será um enorme desafio de governança para o próximo ministro da Fazenda, que poderá ser um misto de Palocci e Joaquim Levy, o ministro de Dilma que sofria fogo amigo permanentemente.

Além da economia: o prestígio externo

Ao mesmo tempo, será essencial a costura política de Lula com o Congresso. Esta Casa provavelmente, que virá mais a centro-direita, terá que negociar com um Lula centro-esquerda e precisará haver muita lábia para conseguir aprovar o que for necessário.

Em tempos de inflamada polarização, o desafio do novo presidente vai além da economia e passará por restaurar algo do prestígio externo que o país perdeu. A grande chance, nesse caso, é construir um recado do ponto de vista ambiental de responsabilidade que poderá fazer com que investimentos e negociações comerciais possam ser destravadas com certa rapidez.

Importante lembrar que o BC trabalha hoje com uma economia mais aquecida do que se imaginava e pressões inflacionárias ainda relevantes em serviços.

Aceleração inicial

Uma boa trajetória do governo Lula desde o começo pode ajudar na manutenção de um crescimento relevante no ano que vem. Isso colocaria certo peso no BC em relação à atividade econômica, como a instituição já discutiu na ata em termos de um hiato do produto que está caminhando para o terreno positivo.

Mas se, por outro lado, as escolhas econômicas forem equivocadas, a pressão poderá vir por taxa de câmbio e colocará o BC em situação complicada da mesma forma.

Ou seja, sob as duas óticas, o BC terá dificuldade. De um lado, com atividade que poderá dar alguma pressão em cima de uma economia que já cresce acima do seu potencial, mas, de outro, por um choque cambial advindo de má condução da política fiscal.

A vida da autoridade monetária em 2023 não será fácil, e provavelmente o BC vai esperar pelo menos seis meses para saber se haverá alguma consolidação fiscal relevante e entender os descaminhos que poderemos ter.

Por isso, depois da eleição, o nome central a se observar – como não poderia deixar de ser – é o novo ministro da Economia. Nele estará a chave para onde caminharemos ano que vem e com que tipo de pressão que o BC terá que lidar, se mais atividade ou se mais câmbio. Até lá, assim como nós, a instituição terá apenas que observar.

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