A retomada do setor de serviços será determinante no resultado do PIB (Produto Interno Bruto) do primeiro trimestre, a ser divulgado nesta quinta-feira (2), mas esse impulso não deverá sobreviver nos trimestres seguintes e a atividade econômica vai perder força em meio a um cenário de juros elevados.
Essa contribuição mais forte dos serviços decorre da retomada mais disseminada das atividades que foram suspensas em diversos momentos durante a pandemia de Covid-19.
“A maior mobilidade aumenta a demanda por serviços, que favorece a recuperação, mas isso não deve perdurar”, diz Flávio Serrano, economista-chefe da Greenbay Investimentos.
Com o avanço da vacinação, as famílias voltaram a frequentar restaurantes ou viajar, ir a salões de beleza ou se matricular em cursos presenciais.
Toda essa movimentação fez o setor de serviços acumular alta de 1,8% no primeiro trimestre em relação aos últimos três meses de 2021 e de 9,4% em relação ao primeiro trimestre do ano passado, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
“Mas a trajetória é de desaceleração. As medidas recentes do governo para estimular a economia terão efeito no segundo trimestre, mas também vão perder a força”, diz Serrano.
A Greenbay projeta um crescimento de 1,2% no PIB do primeiro trimestre, que desacelera para apenas 0,2% no segundo trimestre. De julho para frente, o desempenho é negativo: terceiro trimestre com retração de 0,5% e no quarto, queda de 0,3%.
Olhando para o ano como um tudo, a projeção é de crescimento de 1,4%, sustentada pelo desempenho dos primeiros meses de 2022.
Já prevendo essa desaceleração, o governo federal promoveu algumas medidas de estímulo, como a liberação do saque emergencial do FGTS e a antecipação do pagamento do 13º salário aos beneficiários do INSS.
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Essas ações, no entanto, não devem ser suficientes para superar os efeitos da política monetária. A taxa Selic está em 12,75% e ainda deve subir. Os juros mais altos restringem consumo e investimento, mas o efeito não é imediato, demorando alguns meses após o aumento para ser sentido de fato.
Essa desaceleração também está presente nas projeções do Banco Original para o ano de 2022.
A expectativa é que o PIB apresente um crescimento de 1,5% no primeiro trimestre e de 0,4% no segundo. Os números positivos param por aí. Para o terceiro trimestre a projeção é de recuo de 0,3% e para o período entre outubro e dezembro, queda de 0,5% – para o ano de 2022, é esperado um PIB de 1,8%.
“A taxa de juros vai agir com mais força sobre o crédito. Já vemos algumas linhas desacelerando”, conta Eduardo Vilarim, economista da instituição.
Dinheiro a menos no segundo semestre
Mesmo o efeito das medidas do governo para estimular a economia podem fazer falta na segunda etapa do ano.
“Era um dinheiro que seria acessado só no futuro. Esses recursos vão virar consumo já. É uma medida que salva o consumo presente, mas pode faltar um pouco no futuro”, avalia.
Para Julio Hegedus Netto, economista-chefe da Mirae Asset, a incerteza também contribui para que a atividade econômica perca força ao longo do ano.
Como exemplo, cita o contexto geopolítico. De um lado, existe a guerra entre Ucrânia e Rússia, que elevou o preço das commodities e beneficia as exportações brasileiras, mas há as restrições de mobilidade na China e, com o gigante asiático crescendo menos, a demanda por matérias-primas em nível global também deve ser menor.
“Para 2022, a economia no agregado vai crescer entre 1,2% e 1,6%, mas para o ano seguinte, tudo vai depender do presidente que será eleito em outubro”, diz.
O UBS-BB também vê uma influência forte da desaceleração da China na economia brasileira. A instituição espera um crescimento do PIB de 1% no primeiro trimestre e de apenas 0,1% no segundo trimestre, mas o tombo mesmo vem no segundo, com recuo de 1,3% e depois crescimento de 1%. Com isso, o PIB de 2022 ficaria em 1,1%.
Frustração com agro
O resultado do primeiro trimestre só não será ainda mais forte devido à agropecuária.
Esse setor tem sido um dos destaques do PIB pelo lado da demanda. No entanto, as secas na região Sul afetaram a safra de grãos, em especial milho e soja, o que deve impedir uma nova safra recorde.
Já a indústria de transformação só deve mostrar maior ímpeto a partir de 2023.
A desaceleração do PIB é um dos efeitos esperados da política monetária. O Banco Central passou a subir os juros para controlar a inflação, o que reduz a demanda por consumo e investimentos.
No entanto, alguns choques, incluindo o do petróleo, e o aquecimento do setor de serviços devem fazer com que a inflação demore mais para se dissipar. No caso do Original, por exemplo, a expectativa é que o IPCA termine o ano em 9,2%.
Uma inflação mais alta significa que o BC terá que demorar mais para iniciar o processo de redução dos juros, dificultando o aquecimento da economia.