Logo-Agência-TradeMap
Logo-Agência-TradeMap

Categorias:

Inadimplência dá as caras em bancos, varejistas e até concessionárias de serviços

Com menor renda disponível, inadimplência da pessoa física deve continuar em crescimento

Foto: Shutterstock

A inadimplência está chegando devagarzinho, mas já pode ser sentida por todos. Bancos, varejistas e até empresas de concessão de serviços públicos começam a sentir em seus resultados o efeito dos atrasos no pagamento de contas – e essa situação deve persistir no segundo semestre.

Uma combinação de inflação, juros em alta e renda em queda tem tornado mais difícil para o consumidor manter as contas em dia e isso já está aparecendo no balanço das empresas.

“Acredito que com o aperto monetário em curso, este cenário deve perdurar. Vai ter uma piora mesmo com o adicional do pagamento dos auxílios. Só vamos ver melhora a partir do ano que vem”, diz Julio Hegedus Netto, economista-chefe da Mirae Asset, lembrando que entre agosto e dezembro o valor do Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família) irá subir de R$ 400 para R$ 600.

Dados da CNC (Confederação Nacional do Comércio) revelam que aumentou o percentual de famílias endividadas e também daquelas com contas em atraso.

A pesquisa de inadimplência da confederação mostra que 78% das famílias estavam endividadas em julho, ante 71,4% no mesmo mês de 2021. Já aquelas que estão com contas e outras dívidas em atraso passaram de 25,6% do total para 29% – sendo que mais de um terço desse grupo declarou que não tem condições de pagar essas contas em atraso.

Na avaliação da CNC, essa piora mostra que as medidas extraordinárias de suporte à renda, como os saques extras do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e a antecipação do 13º salário aos beneficiários do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), tiveram efeito restrito sobre o bolso do consumidor. Ou seja, acabou esse dinheiro e mais contas entraram em atraso.

Bancos e varejistas

Essa piora da capacidade de pagamento é vista tanto entre redes de varejo, que financiam o cliente com cartões ou carnês, como nos bancos.

Nas Lojas Renner (LREN3), o resultado financeiro foi afetado pelo atraso nos carnês e cartão de crédito da varejista. As perdas somaram R$ 281,5 milhões entre abril e junho, uma alta de 246,6% na comparação com o segundo trimestre de 2022.

Também aumentou a proporção das operações vencidas em relação ao total da carteira da varejista de roupas. No segundo trimestre do ano passado, 17,5% das operações estavam em atraso. Entre abril e junho de 2022, passou para 24,3%.

Leia mais: 
Lojas Renner (LREN3): Após crescimento de 57%, vendas devem desacelerar no 3º trimestre, diz CEO

Situação similar tem o Magazine Luiza (MGLU3), que atua no setor de eletrodomésticos – setor mais dependente do crédito ao consumidor. Em junho, o índice de inadimplência era de 7,7%, um aumento de três pontos percentuais em 12 meses.

Nos bancos, mais experientes e mais cautelosos na concessão de crédito, a situação também não é diferente. No Bradesco (BBDC3, BBDC4), a inadimplência das pessoas físicas passou de 3,4% para 4,8% e no Itaú (ITUB3, ITUB4), de 3,6% para 4,4%.

Saiba mais:
Bradesco (BBDC4) prevê novo aumento da inadimplência e expansão menor do crédito no 2º semestre

Hegedus, da Mirae, lembra que a inadimplência só não está mais acentuada nos bancos no segmento da pessoa física porque em geral eles são mais criteriosos na concessão de crédito para o público de menor renda – seja na aprovação ou na concessão de limites maiores.

“Os bancos são muito refratários em dar crédito para a baixa renda. A inadimplência está subindo mais justo nessa faixa”, diz.

O Banco do Brasil (BBAS3) também mostrou uma piora nos indicadores de qualidade de crédito, com o índice de atrasos acima de 90 dias passando de 2,96% em junho do ano passado para 4,31% em junho de 2022.

E é a abertura de dados do BB que mostra o que os consumidores estão deixando de pagar. A modalidade de crédito que apresentou a maior inadimplência foi o cartão de crédito – embora consignado e financiamento imobiliário também tenham registrado uma leve piora.

Durante a divulgação dos resultados do segundo trimestre, na semana passada, o presidente do BB, Fausto Ribeiro, afirmou que a inadimplência vai subir, mas que não há motivo de preocupação.

“A gente não acha que a inadimplência vai alcançar os níveis anteriores à pandemia, mas vai ter um aumento. A inadimplência está aumentando no mercado, mas também aumenta porque o nosso mix [de crédito] está mais arriscado”, disse.

O banco tem aumentado a concessão em linhas mais caras, como crédito pessoal, cartão de crédito e cheque especial. Embora garantam uma rentabilidade maior, normalmente possuem um maior índice de atrasos.

Inadimplência também em contas de consumo

Quando o consumidor vê a renda apertada ou assume mais contas do que deveria, começa a escolher o que vai pagar primeiro.

Em geral, a prioridade é dada às contas essenciais, como luz, aluguel e água, e aos financiamentos de bens que podem ser retomados em caso de inadimplência, como imóveis e veículos.

É por isso que a inadimplência costuma ser maior nas operações ligadas ao consumo, como cartão de crédito e carnês de loja. No entanto, essa dificuldade de pagamento começa a chegar nas contas de consumo.

Na Sabesp (SBSP3), concessionária de água e esgoto que atua no Estado de São Paulo, a inadimplência nas contas fez com que as perdas com créditos passassem de R$ 144,1 milhões entre abril e junho de 2021 para R$ 252,9 milhões em igual período de 2022.

Cenário não ajuda

São uma série de fatores que contribuem para a alta da inadimplência, e poucos aspectos do lado contrário, ou seja, que ajudem a melhorar a capacidade de pagamento.

Um dos motivos é o aumento da inflação. O IPCA nos 12 meses encerrados em julho está em 10,07%. Até o final do ano, a expectativa é que fique em 7%, ou seja, desacelere.

No entanto, essa desaceleração não significa necessariamente um alívio. Ele está atrelado à redução no preço dos combustíveis e energia após redução dos impostos sobre esses itens. Outros produtos relevantes para o dia a dia, como alimentos e itens para manutenção da casa, não têm perspectiva de redução dos preços.

Pagando mais caro em itens como alimentação e transportes, sobra menos dinheiro para o pagamento das demais contas, e por isso a expectativa de aumento da inadimplência.

Outro é a elevação da taxa de juros. A Selic está em 13,75% a ano. Um ano antes, a taxa básica era de 5,25%. Quem precisa tomar crédito está comprometendo uma fatia maior da renda. Esse aumento de custo também afeta quem tem dívida pós-fixada – embora pouco comum, há contratos de financiamento imobiliário atrelados ao CDI.

O que em tese pode ajudar esse cenário é o mercado de trabalho. A taxa de desemprego recuou no trimestre encerrado em julho para 9,3%, a menor desde 2015. Esse indicador era de 14,2% em igual período do ano passado.

No entanto, apesar do menor desemprego, os salários estão mais baixos em um momento de aumento do custo de vida. O rendimento médio real mensal ficou no período em R$ 2.652, uma queda de 5,1% ante o mesmo trimestre de 2021.

O aumento do Auxílio Brasil que vai até dezembro também é um fator que pode ajudar no pagamento das contas, mas esse ganho pode ser anulado se a inflação de itens básicos continuar em níveis elevados.

Compartilhe:

Leia também:

Mais lidas da semana

Uma newsletter quinzenal e gratuita que te atualiza em 5 minutos sobre as principais notícias do mercado financeiro.