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Gafisa: Apesar de queda de 22% nesta 3ª, ações disparam 200% em um mês – o que explica o movimento?

Disputa por controle acionário e venda de imóvel por 150% do valor da própria empresa cercam forte volatilidade dos papéis em Bolsa

Foto: Shutterstock/Refat

As ações da Gafisa (GFSA3) viraram atração neste início de 2023, ao registrarem alta de mais de 200% em cinco dias (até 05/01) e acumularem valorização de nada menos que 317% em um mês até esta segunda-feira (9).

Na sexta-feira (6), contudo, investidores tomaram um susto ao verem os papéis derreterem 25% devido ao efeito de uma liminar judicial, que bloqueou a negociação de 13 milhões de ações da empresa.

Depois de expressarem recuperação na segunda, mas fecharem o pregão praticamente estáveis, as açõs voltam a desabar nesta terça. Por volta das 16h, os papéis caíam nada menos que 22,4%, cotados a R$ 17,91, reduzindo a valorização em 30 dias para 203%.

Essa forte pressão compradora do início de 2023 pode ter origem em dois principais motivos: a briga pelo controle acionário da Gafisa e a avaliação de preço subvalorizado das ações, diante da venda de um imóvel por 150% do valor da própria empresa.

Esses dois fatores podem ter desencadeado o chamado “short squeeze”, movimento que “expulsa” a força vendedora e aumenta a pressão compradora, causando um “boom” nos preços.

O curioso é que a forte demanda pelas ações da Gafisa não tem sido motivada por uma melhora operacional, já que os resultados e os fundamentos da empresa estão relativamente piores que os de outras companhias do setor de construção.

Portanto, os papéis podem estar passando por uma falsa impressão de correção e investidores estão vulneráveis a uma queda dos preços a qualquer momento.

Por que as ações da Gafisa estão subindo tanto

No dia 29 de dezembro de 2022, a Gafisa anunciou a venda de sua fatia de 80% do Fasano Itaim pelo valor de R$ 330 milhões. O montante era quase 150% do valor de mercado da própria empresa dois dias antes.

Diante disso, investidores enxergaram um valor oculto na companhia, isto é, a empresa poderia estar sendo precificada abaixo do valor justo na Bolsa, uma vez que ela inteira estava valendo 31% menos que o imóvel vendido.

Rumores do mercado chegaram a apontar que o acionista controlador da Gafisa, Nelson Tanure, poderia ter comprado o imóvel a partir de fundos de investimentos próprios (o que o empresário negou, segundo matéria do site Pipeline, do jornal Valor Econômico).

Além disso, há uma disputa por controle entre o sócio controlador e a Esh Capital, sócia minoritária.

A Gafisa anunciou um aumento de capital de R$ 150 milhões no fim de novembro de 2022, valor que foi reduzido para R$ 78 milhões posteriormente.

Acionista minoritária, a Esh Capital não concordou com a decisão do aumento de capital, uma vez que a emissão de ações seria prejudicial para o fundo, já que sua participação na companhia seria diluída.

A Esh convocou, então, uma assembleia para discutir o aumento de capital, a partir da votação de acionistas. E é nessa etapa que reside boa parte da explicação para a disparada de preço das ações.

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Para que os acionistas pudessem votar na assembleia, era necessário estar em posse das ações. Dessa forma, muitos contratos de aluguéis dos papéis foram encerrados. Além disso, para obter maior poder de voto, a Esh capital aumentou sua participação na Gafisa em 17 dias de 5,35% para 15,1%, até 29 de dezembro.

Diante disso, a pressão compradora foi ainda maior, o que impulsionou os preços dos papéis para cima e, a partir de então, estava montado o short squeeze.

Mas, afinal, o que é “short squeeze”?

O chamado short selling, ou venda a descoberto, é uma operação que aposta contra o preço de determinado ativo e o termo “squeeze”, também em inglês, pode ser traduzido por pressão.

Assim, esse movimento de short squeeze se dá por uma forte pressão compradora de um ativo, que faz com que os preços subam vertiginosamente, obrigando investidores que apostavam na desvalorização do papel a recomprá-lo para evitar prejuízos.

Para entender como funciona o short squeeze, no entanto, é necessário compreender antes como funciona o aluguel de ações.

No mercado financeiro, é possível apostar contra um ativo e, para isso, o investidor toma emprestadas as ações de uma determinada empresa e as vende para recomprá-las no futuro, por um preço mais barato. Com isso, embolsa a diferença de preço como lucro.

Para executar a estratégia, investidores contam com a ferramenta de aluguéis de ações, na qual o dono de um ativo (doador) pode emprestar o papel para outro investidor (tomador) em troca de uma taxa de aluguel, que funciona como uma renda extra.

A lógica por trás do “short squeeze”

A operação parece bem simples, no entanto, tenha em mente que o máximo que um investidor que aposta contra um papel pode ganhar é 100%, uma vez que o preço da ação pode praticamente chegar a zero. O ganho é, portanto, é limitado.

Já se o preço do papel subir, não há limite para a oscilação, o que pode gerar um prejuízo incalculável ao tomador (que aposta contra as ações).

Para controlar esse risco, muitos especuladores utilizam o chamado “stop loss”, ferramenta que encerra automaticamente uma operação, após o preço atingir determinado valor.

Voltando ao caso da Gafisa, a venda da fatia no Fasano, a convocação da assembleia geral e o aumento da participação dos acionistas levaram os preços das ações a decolarem, gerando grandes prejuízos para os que apostavam na desvalorização do papel.

Com a alta dos preços, muitas operações de venda a descoberto podem ter acionado o stop loss e, com isso, investidores foram obrigados a recomprar os papéis, antes que o prejuízo fosse ainda maior.

Diante disso, os vendedores passaram a ser compradores, elevando de forma brusca os preços dos papéis, formando, assim, o chamado “short squeeze“.

O que deve acontecer com as ações da Gafisa?

Em meio ao crescimento da aposta contra os papéis da Gafisa, as taxas de aluguel, que começaram dezembro em 5,4%, chegaram a superar os 130% neste ano. E ainda que as posições estejam sendo gradualmente desmontadas e as taxas, reduzidas, o aluguel ainda responde por quase 10% do total em circulação.

Portanto, é de se esperar que as ações da empresa permaneçam voláteis até que o imbróglio do aumento de capital seja dissipado.

Uma vez que a alta dos preços não é baseada em fundamentos sólidos, a tendência baixista poderá prevalecer sobre os papéis.

Fundamentos fracos apontam para um short squeeze

A aposta contra a empresa é explicada pelo cenário desafiador para o setor imobiliário, diante das expectativas de manutenção da taxa de juros em patamares elevados, o que afeta os lançamentos e os volumes de vendas das incorporadoras.

Ao comparar os resultados da Gafisa entre janeiro e setembro de 2022, é notada uma perda de eficiência na geração de caixa, com a margem Ebitda de 5,2%, ou 18,8 pontos percentuais inferior à registrada em igual período de 2021.

O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da Gafisa, de R$ 41,8 milhões, foi corroído por maiores despesas com juros, o que levou a empresa a reportar prejuízo no período.

Além disso, ao comparar os números da Gafisa com os de pares voltados para os públicos de média e alta renda, como Eztec (EZTC3) e Cyrela (CYRE3), a companhia apresenta o pior desempenho.

Ao avaliar o Retorno sobre o Patrimônio líquido (ROE), podemos identificar a rentabilidade de um negócio a partir da utilização dos recursos próprios da empresa. O resultado negativo pode indicar que a Gafisa tem consumido fortemente o caixa sem gerar lucro, o que estaria deteriorando o valor do negócio.

Já em relação à eficiência operacional, o indicador de margem bruta mostra maior eficiência das outras empresas do segmento, com uma rentabilidade superior. Na prática, a Gafisa pode ter um custo mais elevado e/ou uma dificuldade em repassá-los aos clientes.

Em relação ao endividamento, a Gafisa pode ser considerada a mais arriscada e a menos solvente. Pelo menos é o que aponta o indicador de Dívida líquida sobre Ebitda (DL/Ebitda), ao apresentar uma dívida 11,6 vezes maior que o Ebitda gerado nos últimos 12 meses pela empresa.

Por fim, o múltiplo de preço sobre valor patrimonial (P/VPA) é utilizado para verificar se uma empresa está cara ou barata. Apesar de a Gafisa aparentar estar sendo negociada com desconto em relação ao patrimônio, a Eztec pode ser uma opção mais atrativa, com desconto de 33%.

É uma boa hora para investir na Gafisa?

Ao considerar uma estratégia de longo prazo, na qual a montagem do portfólio é baseada em empresas com resultados sólidos, essa pode não ser a melhor hora para investir nas ações da Gafisa.

Isso porque os juros em patamares elevados reduzem a demanda por imóveis, o que leva a uma queda no volume de vendas das empresas e, consequentemente, a lucros menores.

Por outro lado, é em momentos de crise que as grandes oportunidades são criadas, e as empresas do segmento podem parecer baratas no momento. A Gafisa, contudo, não é a companhia mais bem posicionada do setor.

Além disso, a alta volatilidade das ações no momento poderia levar investidores mais avessos ao risco a passar noites sem dormir.

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