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Empresas aceleram anúncios de recompra de ações; por que os programas existem e como podem afetar seus investimentos

Ao menos 33 companhias anunciaram programas de recompra de ações na B3 nos últimos 3 meses; alta dos juros pode frear movimento

Nos últimos três meses (novembro de 2021 a janeiro de 2022), ao menos 33 empresas anunciaram programas de recompra de ações na B3, mecanismo ao qual as companhias recorrem quando consideram que o preço dos papéis está muito baixo. O número contrasta com o registrado em igual período do ano anterior (novembro de 2020 a janeiro de 2021), quando foram apenas nove anúncios.

Uma das explicações para o crescimento desses anúncios é o desempenho da Bolsa brasileira em 2021, ano em que o Ibovespa registrou queda de 11,9%, terminando aos 119.017 pontos — após ter superado os 130 mil em junho do ano passado. 

As empresas que anunciaram as recompras nesses últimos três meses tiveram quedas ainda mais intensas que o índice. No caso da Via (VIIA3), dona das marcas Casas Bahia e Ponto Frio, as ações recuaram 67,5% no ano passado. A companhia anunciou o programa de recompra no mês passado.

Até mesmo novatas na Bolsa seguiram esse caminho. A Raízen (RAIZ4), pertencente ao grupo Cosan e Shell, fez a sua oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) em agosto de 2021. Em 6 de janeiro, já anunciou a intenção de recomprar até 3,21% dos papéis da companhia em circulação no mercado.

Esses anúncios são mais comuns em momentos de Bolsa em baixa ou quando os papéis da empresa sofreram forte desvalorização por determinado motivo. É uma forma de a companhia sinalizar ao mercado que está confiante no negócio — e que, por isso, vai usar parte de seu caixa ou da reserva de lucro para esse fim.

No entanto, vale ressaltar que o anúncio é apenas uma intenção de compra, sem a obrigatoriedade de execução (parcial ou total) do programa.

Segundo regras da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), a recompra de ações precisa ser aprovada em assembleia geral ou do Conselho de Administração, que estabelece as condições e motivações do programa. Na sequência, a empresa precisa publicar um fato relevante tornando público o início da recompra.

O prazo máximo do programa é de 18 meses e o limite de recompra de ações é de 10% do total da circulação em mercado. No entanto, a empresa pode renovar o seu programa, mesmo que não tenha efetivado a compra de nenhum papel. E as ações devem ficar em tesouraria para posterior alienação ou cancelamento.

Efeito prático

Mas, afinal, qual o efeito prático da recompra de ações para o investidor?

“O programa de recompra facilita a situação do investidor que quer sair do papel e melhora potencialmente os retornos de quem se mantém como acionista”, explica Ricardo Almeida, professor de finanças do Insper.

Quando o programa é de fato efetivado, ou seja, as ações são recompradas pela empresa, pode ocorrer um primeiro efeito que é o de valorização dos papéis. Esse movimento se dá quando há a percepção por parte do mercado que a companhia está realizando a recompra em um momento adequado (com caixa e sem dívidas ou mesmo a possibilidade de uma aquisição futura e usar as ações como parte de pagamento), o que leva outros investidores a também adquirirem o papel – levando a cotação para cima.

Uma outra consequência se dá caso a companhia faça o cancelamento das ações recompradas. Isso significa que o investidor que manteve sua posição terá direito a um quinhão um pouco maior na hora da distribuição dos lucros (o montante a ser distribuído será dividido por um número menor de ações).

Dessa forma, se uma empresa tinha 100 mil ações e após a recompra e cancelamento passou a ter 99 mil papéis, um lucro de R$ 1 milhão deixa de ser de R$ 10 por ação e passa para R$ 10,10 por ação.

Fernando Araújo, gestor da FCL Capital, explica que essa é uma forma indireta de remuneração ao investidor.

“A companhia tem caixa e pode distribuir mais dividendos. Mas ela também pode optar pelo programa de recompra e vai propiciar ao investidor, na prática, uma fatia maior da mesma pizza”, explica, acrescentando que esse exemplo é válido quando há o cancelamento das ações.

Mas nem toda recompra de ações tem como objetivo o cancelamento dos papéis e o investidor também deve ficar atento a isso.

Esse é o caso da fabricante de pás eólicas Aeris (AERI3). A companhia anunciou em novembro um programa de recompra de ações equivalente a até 2% dos papéis em circulação. O objetivo, no entanto, é usar as ações para o plano de incentivo de funcionários e também como pagamento à Falconi Consultores, que dá suporte para que a empresa melhore a sua eficiência. Nesse caso, o programa pode ser positivo para a empresa, mas não terá necessariamente um efeito direto para o investidor.

Outros usos possíveis para as ações recompradas são a destinação para a remuneração de funcionários (stock option) ou mesmo deixar em caixa para vender em um outro momento com a cotação maior ou usar os papéis como moeda de troca em uma aquisição.

Selic x recompras de ações

Na avaliação de Michael Viriato, estrategista do escritório de agentes autônomos Casa do Investidor, ao tomarem a decisão de recompra, as companhias levam em conta também o custo do capital e do retorno do próprio negócio.

“Se a ação estiver sendo negociada abaixo do valor que o controlado acha justo, ele pode usar uma parte da reserva de lucros para recomprar as ações porque acredita que isso dará um retorno maior do que investir na ampliação da empresa ou compra de outro negócio”, diz.

O controlador também leva em conta o custo de capital. Por essa razão, a trajetória de alta dos juros — a taxa Selic deve subir para 10,75% nesta quarta-feira — pode inibir a concretização dos programas de recompra ou o anúncio de novos.

“O custo do capital fica mais alto e o empresário pode decidir que é melhor deixar esse dinheiro aplicado em CDI. Nesse sentido, a alta da Selic é um desestímulo à recompra. Por outro lado, se as ações continuarem a cair, os programas podem ser mantidos”, diz Araújo, da FCL.

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